Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) divulgado na semana passada colocou a família do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) no centro de uma polêmica. O órgão ligado ao Ministério da Fazenda detectou movimentações consideradas atípicas na conta de um ex-assessor do deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL), senador eleito pelo Rio de Janeiro.
O levantamento do Coaf foi produzido a pedido do Ministério Público Federal (MPF) na Operação Furna da Onça, que investigava um esquema de corrupção na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Flávio Bolsonaro não é investigado, mas o órgão de controle encontrou movimentações atípicas nas contas de um ex-assessor dele chamado Fabrício José Carlos de Queiroz.
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Segundo o órgão, Queiroz movimentou R$ 1,2 milhão em sua conta no espaço de um ano, entre 1.º de janeiro de 2016 e 31 de janeiro de 2017, entre saques, depósitos e transferências suspeitas. O assessor, que atuava como segurança e motorista, foi exonerado do gabinete de Flávio Bolsonaro em 15 de outubro deste ano.
O caso provoca desgaste no futuro presidente da República e ainda há muitas pontas soltas no relatório que carecem de maiores explicações. Entenda por quê:
1) Há indícios de crimes?
A explicação mais urgente nesse momento é saber se há crimes cometidos por Queiroz ou por pessoas ligadas a ele. O Ministério Público afirmou que o fato de o Coaf ter identificado transações atípicas na conta não significa que houve o cometimento de algum crime. Exceto se a origem do dinheiro for ilícita.
O ex-juiz federal e futuro ministro da Justiça, Sergio Moro, defendeu nesta segunda-feira (10), uma apuração sobre o caso. “Sobre o relatório do Coaf sobre movimentação financeira atípica do sr. Queiroz, o sr. presidente eleito já esclareceu a parte que lhe cabe no episódio. O restante dos fatos deve ser esclarecido pelas demais pessoas envolvidas, especialmente o ex-assessor, ou por apuração”, disse Moro.
Em nota, o MPF informou nesta segunda-feira (10) que repassará as informações obtidas no relatório para o Ministério Público do Estado do Rio, a fim de que uma investigação seja iniciada.
2) Depósitos em espécie
Outro ponto do relatório que merece explicação é o volume de depósitos em espécie feitos na conta de Queiroz. O Coaf aponta que ele recebeu, entre 2016 e 2017, um total de R$ 216,4 mil em depósitos em espécie realizados em diversas agências no Rio de Janeiro.
Os valores variam de R$ 400 a R$ 12,7 mil. Em dezembro de 2016 estão concentrados os depósitos de maior valor – neste mês, Queiroz recebeu R$ 41 mil em sua conta através de depósitos não identificados.
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Há, ainda, valores que se repetem de um mês para o outro. A conta de Queiroz recebeu, por exemplo, o depósito de R$ 1.771 periodicamente, de janeiro a junho de 2016, e novamente em novembro. Esses valores foram sempre depositados entre os dias 11 e 17 de cada mês.
3) Transferências de servidores da Alerj
Queiroz também precisa explicar a transferência de valores de outros servidores da Alerj para sua conta. O fato chamou a atenção do Coaf, que destacou no relatório um valor total de R$ 277,2 mil.
As transferências foram realizadas por pelo menos oito pessoas identificadas pelo órgão como servidores da Alerj. Os valores transferidos para Queiroz variam de R$ 240 a R$ 86,4 mil.
O maior valor, de R$ 86,4 mil, foi repassado pela filha de Queiroz, Nathalia Melo de Queiroz – também servidora da Alerj. A renda de Nathalia, segundo o Coaf, é de R$ 10,5 mil. Pela renda declarada, ela transferiu pouco mais de 8 salários para o pai no período de um ano.
Outra servidora, Márcia de Aguiar, transferiu R$ 37,1 mil para Queiroz no período analisado. Ela enviou para a conta do colega o equivalente a quase três salários. Já Queiroz transferiu para Márcia o valor de R$ 5,2 mil no período de um ano.
Segundo o Coaf, Queiroz realizou transferências para contas de servidores da Alerj no total de R$ 30,4 mil entre 2016 e 2017.
4) O empréstimo de Bolsonaro
Queiroz também emitiu um cheque para Michele Bolsonaro, esposa do presidente eleito, no valor de R$ 24 mil. Bolsonaro chegou a se pronunciar sobre o assunto. Disse que fez um empréstimo para o ex-assessor do filho, no valor de R$ 40 mil, e o cheque identificado pelo Coaf é parte da devolução do valor. Bolsonaro afirmou que, se o Coaf retroagir mais na análise, vai chegar à soma de R$ 40 mil.
Bolsonaro disse que o cheque foi depositado na conta de Michele, e não na sua, por uma questão de “mobilidade”, já que ele não costuma ir ao banco. Mas admitiu que não declarou o empréstimo em seu Imposto de Renda.
O presidente eleito explicou que não declarou o empréstimo porque ele foi “se avolumando”. Pelas regras da Receita Federal, quem toma empréstimos ou empresta dinheiro acima do valor de R$ 5 mil precisa declarar no Imposto de Renda.
Bolsonaro explicou que os R$ 40 mil que teria emprestado a Queiroz foram devolvidos em dez cheques de R$ 4 mil. O Coaf fala em R$ 24 mil em cheques nominais para Michele, mas não especifica se o valor foi pago em uma única transação ou não.
5) Saques fracionados
Segundo o Coaf, também foi identificado na conta de Queiroz um débito de R$ 49 mil entre 23 de janeiro de 2017 e 15 de março de 2017. “Segundo informado, neste período, a conta apresentou 10 transações de forma fracionada, totalizando R$ 49 mil, configurando possível tentativa de burla aos controles”, diz o relatório.
Em todos os meses, Queiroz realizou saques no mesmo dia, em horários aproximados. Em janeiro, por exemplo, ele fez dois saques de R$ 5 mil no dia 23. O primeiro foi às 15h28. O segundo, às 15h48. No dia seguinte, ele realizou mais dois saques no mesmo valor: um às 15h50 e outro às 15h58.
Outro lado
Na semana passada, Flávio Bolsonaro defendeu o ex-auxiliar. “Fabricio de Queiroz trabalha há mais de dez anos como segurança e motorista do deputado Flávio Bolsonaro, com quem construiu uma relação de amizade e confiança. O deputado não possui informação de qualquer fato que desabone sua conduta”, disse o deputado, em nota.
O presidente eleito se limitou a dizer que Queiroz precisa explicar as movimentações identificadas pelo Coaf, mas afirmou que os valores são baixos. Ele explicou, ainda, que um cheque depositado por Queiroz na conta de sua mulher, Michele Bolsonaro, era o pagamento de um empréstimo.
Braço direito do presidente eleito, o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), reclamou que há uma tentativa de desgastar a imagem de Bolsonaro e classificou o caso como “estardalhaço”.
O assessor Fabrício Queiroz não comentou o caso até agora.
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