Vitrine para exibir o governo de Jair Bolsonaro (PSL) ao mundo, o Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), começou nesta terça-feira (22) com o presidente fazendo o discurso na abertura oficial do evento. Em cerca de 15 minutos, Bolsonaro passou diretrizes gerais do que os estrangeiros podem esperar de seu governo. Mas ele não foi o único integrante da comitiva brasileira a estar sob os holofotes.A agenda dos ministros que o acompanharam na viagem também foi movimentada. Sergio Moro, da Justiça, participou de um painel e teve um discurso afinado com o do presidente. Paulo Guedes, da economia, almoçou com investidores.
Veja 8 passos da comitiva brasileira em Davos que mostram os novos rumos do Brasil:
1. Discurso afinado de combate à corrupção
Sergio Moro participou de um painel no Fórum, sobre o restabelecimento da integridade e confiança nas lideranças, antes mesmo da abertura oficial do evento. Na ocasião, ele defendeu o combate à corrupção e propôs um pacto empresarial para tal, como forma de aumentar a credibilidade do governo.
Depois da apresentação, ao responder um jornalista do Valor Econômico, Moro ressaltou o discurso anticorrupção do governo. “O governo tem discurso forte contra a corrupção e vem adotando práticas sobre algo que não foi feito em 30 anos no Brasil, que é não vender posições ministeriais na barganha pelo poder. E nomeou pessoas técnicas. O compromisso do governo é forte contra a corrupção”, declarou.
A fala de Moro foi uma prévia do que viria no discurso de Bolsonaro horas depois: além de citar o ministro como o homem certo para o combate à corrupção no país, o presidente aproveitou o momento da entrevista com Klaus Schwab, fundador do Fórum, para destacar a escolha de nomes técnicos para compor seu ministério.
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2. O país que mais preserva
O meio ambiente é um tema caro aos estrangeiros e Bolsonaro não deixou o assunto passar batido. A formação de seu ministério teve a polêmica da possível junção das pastas da Agricultura e Meio Ambiente: cheia de idas e vindas, acabou com a manutenção das duas estruturas separadas.
O presidente defendeu que a preservação do meio ambiente deve estar casada com o desenvolvimento econômico. “Somos o país que mais preserva o meio ambiente. Nenhum outro país do mundo tem tantas florestas como nós. A agricultura se faz presente em apenas 9% do nosso território e cresce graças a sua tecnologia e à competência do produtor rural. Menos de 20% do nosso solo é dedicado à pecuária. Essas commodities, em grande parte, garantem superávit em nossa balança comercial e alimentam boa parte do mundo. Nossa missão agora é avançar na compatibilização entre a preservação do meio ambiente e da biodiversidade com o necessário desenvolvimento econômico, lembrando que são interdependentes e indissociáveis”, falou em seu discurso.
Após ter dado declarações controversas sobre a permanência do país no Acordo de Paris, o presidente disse que pretende estar “sintonizado com o mundo na busca da diminuição de CO² e na preservação do meio ambiente”. Bolsonaro se comprometeu a não tirar o Brasil do acordo do clima.
Na curta sessão de perguntas e respostas protagonizada por Klaus Schwab, Bolsonaro disse que a agricultura ocupa menos de 9% do território nacional e a pecuária, 20%. Por outro lado, 30% do território é composto por florestas. “Então, damos exemplo para o mundo. (Mas) O que pudermos aperfeiçoar, o faremos”, comentou.
3. Guedes almoça com investidores. Bolsonaro janta com eles
O ministro da Economia, Paulo Guedes, atraiu a atenção de investidores interessados no Brasil: ao menos 100 participaram de almoço organizado pelo banco Itaú. O ministro tratou de transmitir uma mensagem forte aos investidores, que estavam curiosos sobre as ações do novo governo: muitos queriam saber sobre os planos para a reforma da Previdência e projetos de privatização. Investidores que estiveram no almoço organizado pelo banco brasileiro comentaram que a palestra de Guedes “foi um show”. “Durante 90 minutos, ele narrou com maestria os planos para a economia. Foi animador”, disse um banqueiro, que também assistiu o discurso de Bolsonaro.
À noite, Bolsonaro jantou com ministros de economia de outros países e investidores internacionais de fundos que, segundo o presidente brasileiro, somam US$ 23 trilhões. “O Brasil só preciso de 10% disse”, brincou Bolsonaro, ao iniciar seu discurso, arrancando risos da plateia. O presidente reforçou que sua missão é resgatar a confiança dos investidores no Brasil, perdida após o país “estar flertando com a esquerda”, o populismo e o comunismo. Prometeu fazer as reformas que o Brasil precisa, especialmente a da Previdência, e a respeitar os contratos.
A expectativa agora se volta para a entrevista que o ministro as Economia dará nesta quarta-feira (23) no centro de mídia do Fórum. Até lá, segundo assessores, Guedes não dará entrevistas sobre reuniões bilaterais da sua agenda em Davos. A explicação do governo é que há uma recomendação do Fórum para que Guedes não fale antes da coletiva oficial. Em seu discurso, Bolsonaro disse que Guedes e a equipe econômica colocarão o Brasil no ranking dos 50 melhores países para se fazer negócios no mundo.
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4. A reforma da OMC
Um assunto que já vinha sendo aventado antes do Fórum era sobre o papel do Brasil na proposta de reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC): de mero espectador, o país pode virar um ator com mais protagonismo. Bolsonaro defendeu uma maior abertura comercial do Brasil e a reforma da OMC em seu discurso. “Buscaremos integrar o Brasil ao mundo também por meio de uma defesa ativa da reforma da OMC, com a finalidade de eliminar práticas desleais de comércio e garantir segurança jurídica das trocas comerciais internacionais”, afirmou.
Vivendo o pior momento de sua história, a OMC passou a ser alvo de um questionamento direto do governo americano, que a acusa de ser insuficiente para frear a expansão comercial da China. Donald Trump, em diferentes discursos e iniciativas, deixou claro: ou a entidade muda ou será abandonada.
Durante a cúpula do G-20, em Buenos Aires em dezembro, o mandato político foi dado para começar a rever a OMC. Agora, em Davos, ministros terão a primeira oportunidade de lançar os trabalhos. O governo brasileiro estava comprometido com o processo de reforma. Mas, até então, praticamente como um observador. Agora, uma proposta do governo está sendo desenhada para que circule entre os demais governos. Davos, portanto, seria o primeiro passo desse novo engajamento.
5. Integração regional, mas sem bolivarianismo
Jair Bolsonaro afirmou que o Mercosul precisa ser aperfeiçoado. Ele destacou que o Brasil está preocupado em fazer a América do Sul “grande”, mas sem viés de esquerda. Na curta sessão de perguntas e respostas protagonizada por Bolsonaro e o presidente do Fórum, Klaus Schwab, o brasileiro destacou que vários políticos alinhados à centro-direita foram eleitos na América do Sul. E disse que esse é um sinal de que não há espaço para a esquerda na região. “Estamos preocupados em fazer a América do Sul grande, com cada país mantendo sua soberania. Não queremos uma América do Sul bolivariana”, disse Bolsonaro. “Mais partidos de centro-direita têm sido eleitos na América do Sul. Isso é sinal de que a esquerda não prevalecerá na região.”
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6. Venezuela na mira
Uma pauta anterior a Davos acabou aparecendo no começo do Fórum: a postura do Brasil em relação à Venezuela. O ministro da Justiça, Sergio Moro, afirmou que o Brasil não descarta tomar medidas para investigar o fluxo financeiro venezuelano no país. Moro garantiu, no entanto, que o governo não atuará apenas por critério político ou sob consideração diplomática, mas com base na Justiça.
Na semana passada, o ex-juiz da Lava Jato recebeu representantes da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da oposição ao ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, para discutir um rastreamento de possíveis movimentações financeiras e negócios no Brasil de integrantes do governo venezuelano. Moro teria se comprometido a adotar medidas “imediatas” para investigar operações suspeitas. A reunião foi realizada no dia seguinte ao encontro dos venezuelanos com o presidente Jair Bolsonaro e com o chanceler Ernesto Araújo. Entre os opositores, a esperança é de que outros países se unam aos EUA no congelamento de recursos da cúpula chavista, asfixiando o regime de Maduro.
Moro explicou em Davos que a cooperação no que se refere à Venezuela se fará “com base em casos concretos e não está subordinada a questões diplomáticas ou questões relacionadas a posturas políticas do Brasil”. “Dependendo do caso, como na Venezuela, o Brasil vai tomar as providências cabíveis, encarando a questão como uma questão de Justiça”, disse.
Bolsonaro, em viagem a Davos, foi informado sobre a situação assim que desembarcou na cidade de Zurique. A decisão do governo, porém, foi a de agir nos próximos dias para evitar um vácuo político que possa representar um risco ainda maior de desestabilização na América do Sul. Em Davos, o assunto ainda será alvo de um debate entre seis presidentes latino-americanos, entre eles o brasileiro.
7. Livre de ideologia
Bolsonaro aproveitou a vitrine do Fórum Econômico para ressaltar a bandeira de um governo livre de amarras ideológicas. “Nossas relações internacionais serão dinamizadas pelo ministro Ernesto Araújo, implementando uma política na qual o viés ideológico deixará de existir”, declarou em seu breve discurso de abertura. “Para isso, buscaremos integrar o Brasil ao mundo, por meio da incorporação das melhores práticas internacionais, como aquelas que são adotadas e promovidas pela OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, grupo de 36 países comprometidos com a democracia e a economia de mercado].”
Depois, nas perguntas de Klaus Schwab, Bolsonaro voltou a mencionar o tema ao falar de educação. Ele reconheceu que o país precisa melhorar a qualidade da educação ofertada e que ela é a forma de diminuição de pobreza e desigualdade. Mas, desde que não tenha viés ideológico algum.
8. Agenda de Bolsonaro está cheia de encontros com políticos nacionalistas
Prometendo apresentar um Brasil “sem amarras ideológicas”, o presidente Jair Bolsonaro concentrará sua agenda bilateral em Davos em encontros exclusivamente com governos conservadores, nacionalistas e que fazem parte de um movimento que contesta o “globalismo”. A agenda do brasileiro inclui encontros com representantes da Polônia, República Tcheca, Japão, Itália e Suíça, todos comandados por governos com forte características de questionamento do atual sistema e pautado em assuntos que tocam em temas como soberania e rejeição às instituições internacionais.
Nesta quarta-feira (23), Bolsonaro vai se reunir com integrantes do governo da Itália, com um forte discurso anti-imigração. O caso de Cesare Battisti deve estar na pauta e os italianos querem abrir um “novo capítulo” na relação bilateral, como resposta ao gesto brasileiro de extraditar o terrorista.
O presidente brasileiro também tem um encontro fechado com o primeiro-ministro do Japão, Shiunzu Abe, eleito com uma plataforma nacionalista. Bolsonaro ainda se reunirá com o presidente da Polônia, Andrzej Duda, alvo de polêmicas por ser acusado de violar a constituição de seu país para escolher seus próprios juízes da Suprema Corte. Ele também manobrou para assinar uma lei em que passaria a ser ilegal acusar a “nação polonesa” por cumplicidade no Holocausto.
A agenda incluiu uma reunião com o primeiro-ministro da República Tcheca, Andrej Babis. Ele é um forte crítico da abertura de fronteiras para imigrantes e insiste que é contra o euro. Outro encontro bilateral de Bolsonaro nesta quarta será com o presidente da Suíça, Ueli Maurer, que lidera o partido de direita no país alpino. Maurer é do Partido do Povo Suíço que, há poucos anos, criou uma polêmica internacional ao fazer uma publicidade sugerindo que as ovelhas brancas chutassem para fora da Suíça as ovelhas negras. O encontro tem sido alvo de debates, já que partidos políticos de centro e esquerda querem garantias de que Maurer também tratará de temas como meio ambiente, democracia e direitos humanos com Bolsonaro.
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