É possível que você esteja pagando mais imposto hoje do que antigamente. Mas, no geral, a carga tributária do país diminuiu nos últimos anos, em especial a parte que cabe à União.
Poderia ser uma boa notícia. O problema é que o governo federal está à caça de recursos para cobrir essas perdas e reequilibrar as contas públicas. E é grande a chance de que a fatura seja empurrada para o contribuinte.
União, estados e municípios arrecadaram em 2016 o equivalente a 32,7% do Produto Interno Bruto (PIB), o menor índice em 13 anos, segundo cálculos do especialista em contas públicas José Roberto Afonso, professor de mestrado do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV).
Infográfico: Confira a evolução da carga tributária
Segundo o economista, a carga tributária cai sem parar desde 2012, e recuou em seis dos últimos oito anos. Desde 2008, quando chegou ao maior nível da história, o peso dos tributos em relação ao PIB encolheu 2,1 pontos porcentuais, estima Afonso. Uma perda, para os cofres públicos, de R$ 132 bilhões apenas em 2016.
Mudança estrutural
Parte desse recuo tem a ver com a recessão que o país enfrenta desde o início de 2014 e com as generosas desonerações concedidas pelos governos Lula e Dilma Rousseff, parcialmente revertidas de 2015 para cá.
Mas, para Afonso, o movimento resulta principalmente de uma mudança estrutural da economia brasileira. O setor industrial, que paga impostos mais altos, está perdendo espaço na geração de riquezas. E o setor de serviços, que em geral é menos taxado, está avançando.
Nos últimos cinco anos, segundo o levantamento, a arrecadação de tributos federais sobre a indústria de transformação despencou 22%, em termos reais. Por outro lado, a arrecadação com “outros serviços” teve um salto de 24%.
“Dez anos atrás, nós dizíamos que o nosso sistema tributário tem todos os defeitos do mundo; a única virtude é arrecadar, e arrecadar bem. Eu acho que isso foi perdido”, disse Afonso em apresentação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado no mês passado. “Nós temos a tendência expansionista, no pós-guerra, na carga tributária brasileira. Mas, quando eu olho o período pós-crise mundial, a nossa carga tributária está decrescente.”
“Pejotização”
A mudança estrutural não se limita à importância de cada setor na economia. Há um componente importante ligado ao mercado de trabalho: o fenômeno da “pejotização”, que reduz a arrecadação previdenciária. “Aqui, o empregador só quer contratar como pessoa jurídica, e não como pessoa física, porque custa caro”, disse Afonso aos senadores.
A queda de receitas tributárias está concentrada na União. De 2008 para 2016, o peso dos tributos federais baixou de 23,8% para 21,4% do PIB, refletindo principalmente o recuo na arrecadação de PIS, Cofins, IPI, Imposto de Renda, CSLL e royalties.
Técnicos do Ministério da Fazenda e analistas acreditam que o teto de gastos públicos pode não ser suficiente para reequilibrar as contas públicas nos próximos anos, mesmo que a reforma da Previdência seja aprovada. É aí que entra o contribuinte: provavelmente ele será convidado a contribuir mais de alguma forma – mesmo que, individualmente, já esteja pagando mais impostos que antes, mordido por reajustes nos estados e municípios.
A carga tributária das 27 unidades da federação, que era de 9% do PIB em 2008, chegou a cair para 8,7%, mas recentemente avançou para 8,9%, provavelmente sob o efeito de aumentos nas alíquotas do ICMS. Crescimento para valer, só nos municípios, onde a carga avançou de 2% para 2,5% do PIB nos últimos oito anos, graças ao incremento na arrecadação de tributos como IPTU, ITBI e ISS.
METODOLOGIA
Há vários métodos para se calcular a carga tributária, e diferentes instituições se dedicam a isso. Dessa forma, a contabilidade de José Roberto Afonso não é igual à da Receita Federal.
Diferentemente do economista, o Fisco não inclui os royalties e participações especiais – devidos por petroleiras e mineradoras, por exemplo – na conta da carga tributária. Além disso, a Receita desconta de seu cálculo os créditos tributários utilizados pelas empresas, ao passo que Afonso considera só o que entrou no caixa do Fisco.
Por isso, o peso dos impostos calculado pelo órgão federal é ligeiramente mais baixo. E a trajetória de seu indicador também é menos linear, apontando, inclusive, uma leve alta na carga tributária de 2014 para 2015 – a Receita ainda não consolidou os dados do ano passado. Mas, de modo geral, defende Afonso, o “viés de queda” na arrecadação é o mesmo, qualquer que seja a metodologia.
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