Primeiro deputado federal preso e que exerce seu mandato, Celso Jacob (PMDB-RJ) aproveita o tempo que está no Congresso para convencer os colegas da inconfortável condição que enfrenta: de dia na Câmara e à noite na Papuda, penitenciária de Brasília onde dorme e cumpre pena. Ele é o primeiro a chegar na Câmara e um dos últimos a sair. Aproveita ao máximo o tempo fora do cárcere.
Jacob foi condenado a 7 anos e 2 meses de cadeia acusado, quando prefeito de Três Rios (RJ), em 2002, de dispensar licitação para a construção de uma creche. No início de junho, uma turma do STF determinou que cumprisse a pena em regime semiaberto. No final do mês, a Justiça do Distrito Federal concedeu a ele o regime semiaberto e o direito de frequentar o trabalho na Câmara.
O crime
O parlamentar foi condenado em 2009 pela primeira instância da Justiça do Rio, quando deixou seu segundo mandato de prefeito da cidade, e recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF ), já que tem foro privilegiado por ser deputado. O STF reduziu a pena original, de nove anos, que obrigaria cumprimento em regime fechado. A Primeira Turma do STF , por unanimidade, recusou o recurso de Jacob, no final de maio desse ano, e determinou sua prisão em regime semiaberto, com cumprimento imediato. A Justiça do Distrito Federal concedeu ao parlamentar o direito de frequentar o trabalho na Câmara durante o dia e enquanto houver sessão.
O relator do recurso no STF foi o ministro Edson Fachin, que também é relator da Lava Jato no tribunal. Para ele, o pedido de Jacob era “protelatório”. Fachin foi duro na sua decisão com Jacob e criticou, principalmente, o fato de ter falsificado uma legislação. O então prefeito, segundo a acusação, ainda forjou um “estado de emergência” para justificar a dispensa de licitação. Da pena total de 7 anos e dois meses, a falsificação tem mais peso - 4 anos e dois meses - que o crime de não realizar a concorrência, de três anos de cadeia.
“O fato é que, a ação de falsificar uma lei é gravíssima e revela um juízo de censurabilidade muito intenso, revelador de alto grau de consciência da ilicitude. A falsificação, por parte do Chefe do Poder Executivo, de uma lei emanada do Poder Legislativo, para nela incluir sua vontade em detrimento da vontade emanada da Câmara dos Vereadores, configura intensa ofensa ao princípio da separação dos poderes, verdadeira usurpação inconstitucional dos poderes constitucionalmente atribuídos a um Poder por outro”, afirmou Fachin em sua decisão.
Jacob chegou a realizar uma licitação, em 2002, mas a empresa vencedora abandonou a obra, inconclusa, em 2003. Jacob, então, decretou estado de emergência alegando deterioração do patrimônio público para justificar a contratação sem licitação da Construtora e Incorporadora Mil, desclassificada na licitação inicial. Para o Ministério Público, o estado de emergência foi falsamente declarado para justificar a dispensa de licitação. Na área cível, ainda foi condenado, com outros dois réus, a devolver o pouco mais de R$ 56 mil ao erário.
O deputado argumentou em sua defesa que em relação à dispensa de licitação houve um “erro material” pois era para ser declarado “situação de emergência” e não “estado de emergência”. E se defendeu ainda dizendo que a dispensa de licitação não acrescentou um centavo a mais pois o dinheiro já estava liberado desde o exercício anterior.
Fachin não acreditou na história e disse que, mesmo depois de revelada a falsificação, o prefeito manteve em cargo de confiança um dos assessores que, segundo Jacob,o teria induzido a assinar o documento falso. Para o relator, Jacob tinha ciência da alteração. O ministro resumiu assim os malfeitos de Jacob:
“O apelante (Jacob) expediu um decreto, entrou em conluio com outros corréus, contratou com empresa inabilitada, falsificou uma lei, determinou o pagamento de verba que só poderia ser paga com a lei falsificada, enfim, praticou uma série de atos, anteriores e posteriores, que revelam não se tratar de mero equívoco na compreensão da correta aplicação da lei. Ao contrário, tratou-se de persistente inclinação à afrontá-la diretamente.”
À noite na cadeia, à tarde no Congresso
A rotina de Jacob na Câmara, acompanhada pela Gazeta do Povo nos últimos dias, consiste em chegar bem cedo ao Congresso. Da Papuda para a Câmara, e também no seu retorno ao presídio, onde divide uma cela com dois condenados.
“E esse Uber ele faz questão de pagar do próprio bolso. Não usar recursos da cota a que tem direito na Câmara”, diz o advogado Tiago Machado, que atua na sua defesa.
Na cota de verba parlamentar que tem direito por ser deputado aparece o gasto de locação de carro, em junho, de R$ 2.170,00. E mais R$ 2,6 mil de combustível e lubrificante. Segundo sua defesa, trata-se de carro utilizado para serviços de seu gabinete. Esse tipo de despesa -aluguel de carro e combustível - aparece em todos os meses, um gasto comum entre os parlamentares e previsto pela Câmara. Em maio, dos R$ 30 mil que utilizou da cota, quase metade - R$ 14,3 mil - foi com a rubrica de divulgação do mandato parlamentar, dinheiro usado com empresas de comunicação.
Um dos primeiros a marcar presença na Câmara, Jacob segue direto para a liderança do PMDB. Depois, circula pelos corredores, vai à Comissão de Educação - da qual é segundo vice-presidente e fica boa parte do tempo no plenário relatando sua situação aos colegas.
“Escreva um diário”
Do colega Miro Teixeira (Rede-RJ), numa roda de conversa na última segunda-feira, Jacob ouviu um conselho. “Disse a ele para escrever um diário na cadeia, sobre o tudo o que está vivendo. Ele aceitou na hora e disse que iria começar a anotar essa experiência”, disse Miro.
Aos parlamentares, o deputado-presidiário reclama de não poder entrar nem com fruta nem biscoito na Papuda.
A outro colega, desabafou: “Permanecer para mim aqui durante o dia é um alívio.” Jacob pode ficar na Câmara até o encerramento da sessão, independentemente do horário de seu término.
Se houver recesso em julho, que geralmente dura duas semanas, ele terá que ficar preso dia e noite.
Solidariedade dos colegas
O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) é um dos parlamentares mais sensíveis à situação de Jacob. Eles conversaram durante um bom tempo no plenário durante a última quarta. Andrada ainda fez um discurso defendendo Jacob e acusando o STF de invadir as prerrogativas da Câmara ao decidir sua prisão.
“O Supremo cometeu um ato inconstitucional contra a Câmara no momento em que mandou prender, sem que tivéssemos qualquer conhecimento, o deputado Celso Jacob. É uma atitude antidemocrática e inconstitucional. Deputado que tenha sido condenado em ação criminal não pode ser preso pelo STF. É um assunto de alta gravidade. Hoje, é o deputado Jacob. Amanhã, pode ser qualquer um de nós”, disse Andrada.
Na comando da sessão no momento, o vice-presidente da Casa, Fábio Ramalho (PMDB-MG) concordou com o conterrâneo e pediu a atenção dos outros: “Deputados, eu queria que Vossas Excelências escutassem mais o deputado Bonifácio de Andrada, que está fazendo um brilhante discurso. Eu pediria aos senhores muita atenção para o que ele está falando”.
O advogado de Jacob busca junto ao juízo de Execução Penal que o parlamentar possa também circular fora do Congresso durante o dia e citou os ministérios como exemplo, onde buscam recursos e aprovação de emendas para seus redutos eleitorais.
Abordado pela reportagem num primeiro momento, Jacob disse que sua situação é bem ruim e que está recorrendo com todos recursos que pode. Depois, em outro momento, evitou ser filmado.
Quem é Celso Jacob
Jacob foi duas vezes prefeitos de Três Rios. Mesmo com a acusação de ter falsificado documentos e dispensado licitação no seu primeiro mandato, se reelegeu em 2004. Está no seu terceiro mandato, mas, até janeiro deste ano, sempre assumia na Câmara na condição de suplente. E deixava e voltava ao mandato. Tornou-se titular este ano em substituição a um colega que renunciou. Nas suas campanhas ao Congresso, seu jingle usa o seguinte refrão: “O nome é um só. Para deputado federal é Celso Jacob”. Já foi brizolista, filiado ao PDT, e passou pelo PSB antes de chegar ao PMDB.
O deputado é economista, consultor de empresas e professor universitário. É autor do livro “A educação venceu”. Ele é integrante da Comissão de Educação da Câmara, e um de seus vice-presidentes.
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