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Mônica Moura admitiu que sua empresa recebeu dinheiro de caixa 2 nas campanhas de 2010 e 2014 | Henry Milleo/Gazeta do Povo
Mônica Moura admitiu que sua empresa recebeu dinheiro de caixa 2 nas campanhas de 2010 e 2014| Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo

O publicitário João Santana e a marqueteira Mônica Moura admitiram em depoimento ao juiz federal Sergio Moro, nesta terça-feira (18), que a empresa do casal recebeu dinheiro de caixa 2 pelas campanhas eleitorais que fez para o PT em 2010 e 2014.

“Em todas as campanhas que fizemos sempre trabalhamos com caixa 2, com recursos não contabilizados”, falou Mônica, a Moro. A Pólis Propaganda e Marketing, empresa do casal, lista em seu site as duas campanhas de Dilma Rousseff para a presidência e a de Fernando Haddad para a prefeitura de São Paulo. Mônica disse que “cuidava de toda a parte operacional e financeira da empresa”

Mônica Moura admitiu ter recebido – apesar de “não se lembrar do valor exato” – o que segundo a planilha “Posição Programa Especial Italiano”, do “departamento de propinas” da Odebrecht, seria um pagamento de R$ 18 milhões por campanhas eleitorais em 2008 em São Paulo – onde Marta Suplicy (hoje no PMDB) era candidata pelo PT – e Curitiba – onde Gleisi Hoffmann perdeu a eleição para o atual governador Beto Richa (PSDB).

O nome da planilha faz referência ao ex-ministro Antonio Palocci, réu no processo em que Mônica e Santana depuseram hoje, e que trata de pagamentos da Odebrecht a campanhas eleitorais do Partido dos Trabalhadores. O casal de marqueteiros – que firmou delação premiada no âmbito da operação Lava Jato, homologada no início de abril – também é réu na ação.

Palocci, justamente, é apontado por Mônica como “meu interlocutor para discutir valores e negociar campanhas” de 2006 a 2012 – em 2014, ela disse ter tratado com o também ex-ministro Guido Mantega. “[Também] Tinha muito relacionamento com [o ex-tesoureiro petista] João Vaccari Neto, mas não em 2006. A parte ‘por dentro’ era com o partido”.

“O primeiro acerto de valores era sempre com alguém do partido. No meu caso, com Palocci. Depois que se acertava o valor, se dizia o quanto era por fora e o quanto por dentro. Depois que ele acertava o valor, dizia que a Odebrecht ia colaborar com tanto. ‘Vá lá e acerte com eles como você quer’”, acrescenta Mônica. “Todos [os candidatos] tinham [conhecimento] dos valores exatos e de como era o pagamento.”

Mônica mentiu sobre caixa 2 em 2010 para ‘preservar Dilma’

Questionada pelo juiz federal Sergio Moro sobre o motivo que a levou a não confirmar a informação sobre o caixa 2 há um ano, em interrogatório, Mônica Moura alegou que “mentiu para preservar” a petista que ainda exercia o cargo de presidente.

Ela admitiu que naquele primeiro encontro com o juiz Moro omitiu o recebimento de caixa dois da Odebrecht com o uso de contas no exterior referente à campanha presidencial de 2010. Agiu assim, disse, para “preservar” Dilma. Ela confessou ter recebido pagamentos da empreiteira “dentro e fora do país”, relativos às campanhas de 2006, 2010, 2012 e 2014.

Questionada por Moro a respeito dos pagamentos por fora, Mônica teve um arroubo de sinceridade. “Marketing [político] é caro, sempre é caro. Pra ser bem feito, é caro. Não se faz campanha com pouquinho [dinheiro]. Ou até se faz, mas é mal feita. E o partido dizia que não podia pagar por dentro, por causa do teto [de gastos de campanha] que o TSE estipula. É porque o partido não podia receber toda aquela doação, que era mais que o dobro do recebido oficialmente”, falou.

Eu imaginava que algum acordo eles [partido e doadores de caixa dois] tinham, para que uma empresa pagasse tanto dinheiro por fora. Odebrecht tem obras no governo. Sempre achei que tinha uma contrapartida ali. Mas exatamente o que, nunca tive ideia. Imaginava que tinha alguma ilicitude entre eles. Imaginava que era superfaturamento de obras. Sabia que devia ter alguma negociata entre eles”, disse a delatora.

No depoimento, ela mencionou que chegou a se recusar a fazer campanhas com pagamentos em caixa dois após o escândalo do mensalão petista, época em que o marqueteiro Duda Mendonça admitiu -- em 2005 -- receber pagamentos não contabilizados no exterior. “João [Santana] disse que teria que ser tudo por dentro. Mas Palocci disse Palocci disse que tinha uma maneira muito segura de fazer [os pagamentos via caixa dois], mencionando inclusive [que os responsáveis] ‘são seus conterrâneos’.” Tanto a Odebrecht quando Santana e Mônica Moura são baianos.

“Recebemos pagamentos da Odebrecht em muitas das campanhas. Não eram contabilizados. Contatos na empresa, em 2006, foi [o ex-presidente] Pedro Novis. Depois disso, em 2008, [foram os responsáveis pelo “departamento de propinas”] Hilberto Silva e Fernando Migliaccio”, disse Mônica.

“Não acredito que exista um marqueteiro que trabalhe no Brasil fazendo campanha só com caixa um. [O caixa 2] Era uma exigência dos partidos”, disse Mônica. Segundo ela, a Pólis recebeu pagamentos em dinheiro vivo e via depósitos no exterior, em uma conta na Suíça de uma offshore – a Shell Bill Finance – que pertence a Santana.

“Assumo minhas responsabilidades”

João Santana, por sua vez, afirmou que boa parte do saldo final encontrada na conta da offshore era de pagamentos de campanhas e consultorias políticas realizadas no exterior. Ele explicou que as duas atividades não se separam e cita como exemplo o trabalho realizado em El Salvador, em 2009, na campanha e que seguiu no ano seguinte como consultoria para o presidente eleito. A empresa do casal fez campanhas no exterior – em El Salvador, República Dominicana e Venezuela.

O delator também afirmou que os valores de US$ 10 milhões recebidos por ele em 2011 e 2012 da Odebrecht, em conta secreta na Suíça, foram referentes à dívida da campanha presidencial de 2010. “Em 2011 há depósitos nesse período de um ano, depósitos feitos por offshore da Odebrecht relacionados, salvo engano, primeiro a um restante da campanha presidencial de Dilma de 2010”, afirmou Santana.

Sobre o caixa 2, Santana pediu para aprofundar uma resposta a um questionamento sobre como ele aceitava conviver com isso. O publicitário ponderou que é uma pergunta simples de ser formulada e complexa para ser respondida, mas admite que construiu um equívoco e que se tornou cúmplice de um sistema leitoral corrupto e negativo. “Eu assumo todas as minhas responsabilidades, não como vítima, mas fica difícil assumir uma culpa e virar um antiexemplo individualmente. Estou disposto a colaborar e acho que é importante para o Brasil que isso seja feito”, afirmou.

“Eu acho que nossas contradições constroem as nossas armadilhas. E o nosso cérebro ajuda a amenizar essas contradições. Eu, mesmo sendo pessoa organicamente a favor das coisas bem feitas, legais e honestas, criei um escudo em minha cabeça, duplo escudo, um social e externo que era doutrina do senso comum do caixa 2 e outro, interno, que é ‘receba pelo trabalho honesto que estou fazendo’.”

“Construí esse equívoco em mim mesmo, sem perceber que, ao fazer isso, estava sendo cúmplice de um sistema eleitoral corrupto e negativo”, seguiu o marqueteiro. “Não estou aqui demagogicamente dizendo que eu não tinha culpa, que só fui vítima disso, não, eu fui agente disso. Quanto mais transparência houver, principalmente de profissionais como eu, do marketing político, isso vai ajudar.”

João Santana enfatizou. “Não que os grandes responsáveis sejam marqueteiros, mas acho que é o momento de os próprios marqueteiros abrirem os olhos sobre isso, e da Justiça também.”

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