Greve dos caminhoneiros chegou ao quinto dia nesta sexta-feira.| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Locaute, do ingles lock out, é um termo empregado para explicar uma “paralisação das atividades por iniciativa do empregador, com objetivo de frustrar negociação ou dificultar atendimento de reivindicações dos respectivos empregados”, conforme o artigo 17 da Lei 7.783, de 1989, que veta a prática e assegura o direito à greve de trabalhadores assalariados. Trocado em miúdos, é quando empresários organizam uma paralisação com objetivo de obter algum tipo de benefício para o setor.

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A pedido do ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, a Polícia Federal abriu investigação nesta sexta-feira (25), quinto dia da greve, para apurar se há o envolvimento de proprietários de transportadoras, distribuidoras e empresas do segmento na articulação do movimento que para o país há cinco dias, com bloqueios de rodovias e desabastecimento.

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Em coletiva de imprensa, Jungmann afirmou que existem informações do envolvimento de pelo menos 20 empresários na greve dos caminhoneiros. “Temos uma relação com duas dezenas de empresários que foram chamados a depor”, informou. “Locaute é crime! A Polícia Federal investiga quem está tirando proveito com fins econômicos.”

“O nosso foco neste caso não está sobre o [caminhoneiro] autônomo, está exatamente naquelas empresas, distribuidoras e transportadoras que estão se negando a disponibilizar seus motoristas para que se faça o transporte de carga”, explicou o ministro.

“É isso que configurou o indício que nos levou a atribuir à Polícia Federal que abrisse um inquérito e fizesse uma investigação sobre patrões explorarem esse movimento social, que tem motivos justos e que foram atendidos pelo governo. [Os empresários] estão explorando interesses econômicos e criando problemas de abastecimento”.

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Na última quinta-feira (24), o presidente da Associação Brasileira de Caminhões (Abcam), José da Fonseca Lopes, citou em entrevista à Agência Reuters a adesão de empresas à paralisação, ocorrida tanto por conta do preço dos combustíveis quanto pela impossibilidade de circulação dos caminhões dessas empresas.

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No mesmo dia, Jungmann exemplificou o que o setor de inteligência do governo colheu como indicativo de locaute. “É um locaute porque tem participação clara, vou te dar um exemplo [de que] há uma participação, anuência, apoio [de empresários]. Quando foi pedida escolta da Polícia Rodoviária Federal para poder liberar caminhões-pipa, de abastecimento, etc, o que acontecia? Nós mandávamos a Polícia Rodoviária Federal, mas as distribuidoras e transportadoras se negavam a fazer com que os seus motoristas guiassem aquelas cargas e aqueles caminhões”, afirmou.

O ministro não detalhou, porém, em quais cidades isso teria acontecido; se limitou a dizer que episódios como esse teriam sido registrados “em vários lugares”, e que relatos chegaram até ele na quinta-feira.

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Segundo ele, entre as tipificações de crime relacionadas à prática estão a paralisação de trabalho por interesses econômicos, o atentado contra a liberdade do trabalho, associação criminosa e incitação ao crime. “Nesse sentido, determinei ao senhor diretor-geral da Polícia Federal a abertura de investigação e inquérito para apurar as responsabilidades de quem está tirando proveito para fins econômicos”, acrescentou Jungmann.

Durante a tarde, a Polícia Federal confirmou o início a investigações para apurar o envolvimento de patrões na greve, sem no entanto dar detalhes dos rumos do trabalho ou se já havia algum resultado efetivo.

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Mobilização nacional acendeu alerta

A agilidade com que a movimentação dos caminhoneiros tomou conta do país despertou no governo a suspeita de que transportadoras, que sofrem também com a alta no preço dos combustíveis, estejam envolvidas na mobilização.

Segundo apurou o jornal O Estado de S.Paulo, o governo avaliou que o potencial de mobilização dos caminhoneiros foi subestimado pelo Palácio do Planalto, o que seria um erro do sistema de inteligência, comandado pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

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Nos bastidores, o governo considera que há todo um contexto de locaute porque o movimento, que, no passado já ocorreu em proporções menores, agora veio com uma força desproporcional, após impasse entre patrões e empregados, caminhoneiros e donos de empresa. Portanto, a tese é de que, como não conseguiram chegar a um acordo, os motoristas de carga avisaram que iam parar porque não estavam concordando com preços recebidos, por causa da alta do combustível, e eles, empresários, teriam dado apoio.

A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) informa que atualmente são 1,76 milhão de veículos no Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC), sendo 480,96 mil autônomos cadastrados pela agência. A Abcam diz representar cerca de 700 mil condutores autônomos; já a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) calcula em 1 milhão o número de motoristas representados.

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Desconhecimento

Órgão representativo dos donos de transportadoras, a Confederação Nacional do Transporte (CNT) informou não ter conhecimento da participação de empresas no movimento dos caminhoneiros. “E se houver, o empresário responsável será punido”, salienta, em nota.

A CNT diz que não participa nem apoia a paralisação, e que participou das reuniões com o governo federal e caminhoneiros “a pedido do Palácio do Planalto”. Segundo o documento, publicado no site da entidade, “o representante [da CNT] atuou como integrante do grupo de interlocução com as entidades representativas dos motoristas autônomos de caminhão, em busca de uma solução que levasse ao fim das paralisações”.

A CNTA diz também que desconhece o envolvimento de empresários na mobilização, e reafirma que, de sua parte, a greve foi iniciada apenas pelos caminhoneiros autônomos que a instituição representa. “Quem está na beira das estradas é o caminhoneiro, passando frio, fome, para ter suas reivindicações atendidas.

Procurada, a Abcam não se manifestou especificamente sobre o assunto.