Os aumentos salariais concedidos a servidores públicos foram um dos culpados por reduzir a velocidade da queda da desigualdade no país no período recente. Outro efeito dos altos salários do funcionalismo, acima da média da população e até mesmo do que funcionários do setor privado com a mesma escolaridade, é que o Distrito Federal se tornou a unidade da federação com maior desigualdade de renda em todo o país.
O IBGE, em levantamento com dados da PNAD, aponta que está no Distrito Federal a maior discrepância entre a renda média dos 5% mais ricos (R$ 12.900) contra a renda dos 5% mais pobres (R$ 151). Os dados foram compilados por pesquisadores do Fundo Monetário Internacional (FMI) e mostram ainda que está no DF a maior renda média entre os mais ricos na comparação com esse mesmo grupo de outros estados. São Paulo tem o segundo maior salário médio entre os mais ricos (R$ 8.200), quase R$ 5 mil a menos que no DF.
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No estudo do FMI, publicado em setembro deste ano sob o título “Inequality in Brazil: A Regional Perspective”, os pesquisadores concluem que a desigualdade caiu no país de 2004 a 2014, mas que os aumentos salariais concedidos aos servidores públicos atrapalharam esse processo, afirmam os pesquisadores Carlos Góes e Izabela Karpowicz.
Os reajustes do funcionalismo foram “sistematicamente superiores” aos do setor privado e contribuíram para uma diferença maior na média salarial, avaliam os pesquisadores, que citam estudos que defendem que os salários no setor público devem ser menores que em posições similares nas empresas privadas, por oferecerem mais estabilidade e, no caso do Brasil, mais benefícios na aposentadoria.
À Gazeta do Povo, a autora do estudo afirmou que os aumentos concedidos aos servidores entre 2004 e 2014 reduziram os ganhos de igualdade obtidos por políticas públicas. “Não podemos afirmar o que aconteceu depois disso, pois usamos dados anuais do IBGE, mas não temos motivo para acreditar que isso tenha mudado substancialmente nesse curto período de tempo. Como exemplo, citamos no estudo que a diferença entre os ganhos anuais no setor privado e público tem se mantido constantes até o final de 2015”, afirma Izabela Karpowicz.
Como forma de continuar reduzindo a desigualdade, as políticas públicas devem focar em reduzir os reajustes do funcionalismo. “Restrições nos salários do setor público são necessárias não somente no que toca a desigualdade de renda, mas também porque a sustentabilidade fiscal e o respeito às regras fiscais em todos os níveis governamentais”, afirmou Izabela, em entrevista.
Dados do IBGE, na Pesquisa Nacional de Amostras de Domicílios 2016 apontam que o DF registrou em 2016 índice de Gini de 0,583, o mais alto, situando-se próximo dos estados do Nordeste. Na ponta da lista está Santa Catarina, com 0,429. O coeficiente de Gini aponta a desigualdade e números mais perto de 1 significam maior desigualdade. Em todo o Brasil, o índice foi de 0,549 em 2016, contra 0,554 em 2004.
Universidades públicas
Como razões para o aumento da igualdade de renda no país nos dez anos entre 2004 e 2014, os autores da pesquisa apontam o crescimento da renda das pessoas, maior nível educacional e maior formalização trabalhista. O Bolsa Família também contribuiu para uma convergência da renda entre os estados.
Mas as universidades públicas também dificultaram a maior redução da desigualdade. Segundo o estudo, esse tipo de gasto público beneficia mais os cidadãos mais ricos, que têm maior acesso às universidades federais e estaduais. A igualdade de oportunidades, para os autores, poderia ser aumentada ao se redistribuir esses recursos, retirando-os das universidades e melhorando as provisões para a primeira infância e escolas primárias e secundárias, avaliam os pesquisadores.
“Se o Brasil tem de fazer escolhas, e ele tem que fazê-las, essas duas áreas (o crescimento dos salários no setor público e o fato de a maioria dos estudantes nas universidades públicas serem de famílias ricas) devem ser superadas para reduzir a desigualdade. Custear um estudante na universidade é muito mais caro do que no ensino médio no Brasil. Como muitos brasileiros não terminam o ensino médio, ao alocar subsídios educacionais para os mais pobres abriria a possibilidade de economizar gastos e ao mesmo tempo melhorar a igualdade de oportunidades”, afirmou Izabela.