Após o fim do imposto sindical e a eleição de Jair Bolsonaro (PSL), a indústria quer uma reforma sindical para reduzir o número de entidades representativas de classe no país. Com a extinção do Ministério do Trabalho e a possível transferência de concessões de registros sindical para a pasta de Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública), o setor debate formas de conter e reverter a proliferação de entidades.
O país tem hoje 17 mil sindicatos ativos – 12 mil de trabalhadores e 5 mil de empregadores. Há casos como entidades com mais dirigentes que associados e redundâncias geográficas, com mais de um sindicato por cidade ou região representando o mesmo grupo.
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Entre as entidades de empresários da indústria, a meta é passar de 1.300 para 300. A proposta, defendida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), inclui fusões e incorporações, estabelecendo o limite de um sindicato por categoria econômica por estado.
Estipula mandatos de até três anos para dirigentes, o que poria fim a longos períodos de gestão, como as de Paulo Skaf na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), de 14 anos, e de Abram Szajman na Fecomercio-SP, de 33 anos.
A CNI acredita na necessidade de uma reforma sindical que dê aos sindicatos maior representatividade e participação no debate político”, disse Robson Braga de Andrade, presidente da entidade. “Os sindicatos de trabalhadores não têm hoje o poder de negociação que já tiveram, além dos problemas de recursos, de financiamento.”
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Se os chamados sindicatos laborais perderam legitimidade, os patronais tampouco mantiveram o status, disse Andrade. “É preciso buscar a modernização na relação das empresas e mesmo na representação do empresariado perante o poder público e a própria sociedade.”
Na última segunda-feira (3), o futuro ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, anunciou a transferência dos registros sindicais para o Ministério da Justiça. No dia seguinte, Moro afirmou que a mudança ainda está em estudo, mas que, se concretizada, terá como objetivo “eliminar qualquer vestígio de corrupção”.
Em agosto, ao concluir a Operação Registro Espúrio, a Polícia Federal afirmou que uma organização criminosa integrada pelos deputados federais Jovair Arantes (PTB-GO), Paulinho da Força (SD-SP), Cristiane Brasil (PTB-RJ), seu pai, o presidente do PTB, Roberto Jefferson, entre outros, atuou para fraudar registros sindicais no Ministério do Trabalho. Os citados negaram irregularidades.
De modo geral, Bolsonaro sinalizou apoio à mudança na estrutura sindical. “Propomos a permissão legal para a escolha entre sindicatos, viabilizando uma saudável competição. O sindicato precisa convencer o trabalhador a voluntariamente se filiar, por meio de bons serviços prestados à categoria”, disse, em seu programa de governo.
Sindicatos vivem à mingua
O agora eleito rechaçou a volta do imposto sindical, extinto há um ano com a reforma trabalhista. Se, em 2016, a contribuição, então compulsória, gerou R$ 3 bilhões para sindicatos, federações, confederações e centrais, neste 2018, até setembro, já voluntária, trouxe R$ 400 milhões aos mesmos cofres.
Com a página dedicada a esses números fora do ar na internet, o Ministério do Trabalho e Emprego não informou dados mais atualizados. No caso da CNI, contudo, o impacto é menor. As receitas advêm sobretudo do Sistema S (Sesi, Senai, Sesc etc.).
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Para o professor da USP (Universidade de São Paulo) Hélio Zylberstajn, será difícil para o novo governo aprovar uma reforma sindical profunda, uma vez que se espera que o capital político seja concentrado na Previdência. E as entidades, segundo o economista, já tentam ressuscitar a obrigatoriedade, não via legislação, mas por meio das negociações coletivas.
“O sindicato dos trabalhadores faz uma assembleia, define que todos vão pagar uma contribuição e leva isso para incluir na convenção coletiva”, disse Zylberstajn, coordenador do Salariômetro, da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas).
“As empresas ficam em situação delicada. Se atendem o sindicato, vão se prejudicar na relação ao empregado, que talvez não queira pagar e está sendo obrigado. Infelizmente, algumas empresas estão capitulando e concordando.”
Trabalhador tem até entidade de camisas para homens
A proliferação de sindicatos ao longo das décadas levou a uma sobreposição de entidades, enfraquecendo a sua representatividade. Em Minas Gerais, por exemplo, há 34 sindicatos de empregados em estabelecimentos de saúde, às vezes em cidades próximas.
Em um raio de 200 quilômetros, Poços de Caldas, Pouso Alegre e Itajubá têm entidades da categoria com 517, 212 e 167 sindicalizados cada uma, respectivamente.
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Em outros casos, a fragmentação é tamanha que dá espaço a organizações bastante específicas, como o Sindicato da Indústria de Camisas para Homem e Roupas Brancas de São Paulo, com 84 associados, e o Sindicato da Indústria de Confecção de Roupas e Chapéus de Senhora do Ceará, com 92 membros.
O professor da USP Hélio Zylberstajn afirmou que, paulatinamente, independentemente de uma eventual reforma, “muitos sindicatos vão desaparecer, porque são raríssimos os que estão enraizados na base, que têm associados e podem se sustentar sem a contribuição compulsória”. Outros tantos, disse, deverão se fundir.
Nesta semana, um caso reforçou o prognóstico. O estado do Rio de Janeiro tem sete sindicatos da indústria gráfica. Dois assinaram um termo de entendimento, que é o início de uma parceria para se fundirem. “O jeito de se viabilizarem é se transformarem em um único, talvez até mesmo um único no país”, afirmou Zylberstajn.
O fim do imposto obrigatório foi considerado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em junho.