Esplanada dos Ministérios, em Brasília: aposentadoria prematura dos servidores ainda pesa no déficit da Previdência.| Foto: Jonas Pereira/ Agência Senado

Sônia é servidora federal aposentada. Ingressou no serviço público por uma seleção simples, em 1976. Em 1988, com a nova Constituição, foi integrada ao quadro de servidores, em regime estatutário. Chegou ao teto de sua carreira rapidamente, que em salários de hoje paga R$ 28 mil mensais.

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Sem exigência de idade mínima de aposentadoria, ela se aposentou em 1994, aos 50 anos, ganhando o teto da carreira, com direito à integralidade salarial e paridade com quem está na ativa. Já recebeu 23 anos de benefício. Hoje, está com 73 anos, ativa e com ótima saúde. Ainda deve receber aposentadoria por muitos anos e neste mês viaja a Londres para visitar o filho que mora lá.

Essa é uma personagem real e a situação dela é evidenciada com dados do Painel Estatístico de Pessoal do governo federal. A média de idade dos servidores do Poder Executivo civis aposentados é de 59 anos. O painel mostra que, desses aposentados, 14% começaram a receber o benefício com idade entre 50 e 55 anos, 30,2% se aposentaram com 55 a 60 anos, e 31,5% com idade entre 60 a 65 anos.

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Isso ajuda a explicar porque é preciso alterar, junto com uma grande reforma da Previdência do Regime Geral que atende a todos os brasileiros, também a aposentadoria dos servidores públicos (o Regime Próprio de Previdência). É um problema que precisa ser enfrentado e servirá também de exemplo por parte dos governantes, modificando não apenas as regras para quem está no andar de baixo, mas atingindo a casta do funcionalismo federal. 

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A partir de 2012, quando foi criado o regime de previdência complementar para os servidores, com a Lei nº 12.618, os recolhimentos do funcionalismo para a aposentadoria passaram a ser suficientes para arcar com seu benefício. Mas no passado, e principalmente antes de 1999 (quando a Emenda Constitucional nº 20 definiu a idade mínima de 55 anos para mulheres e 60 para aposentadoria do serviço público), as regras eram frouxas para pessoas como Sônia.

A contribuição previdenciária fixa e obrigatória só foi instituída pela Lei nº 8.213, de 1991. Antes disso, os servidores federais arcavam apenas com contribuições esporádicas, em porcentuais baixos, caso optassem por alguns seguros ou benefícios no futuro. Isso criou o rombo previdenciário no regime próprio da Previdência.

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Paridade e integralidade

As leis de 1991 e 1999 ajudaram a reduzir o problema, mas o total de aposentados que seriam carregados pelo sistema já era grande. A partir daí, servidores com salários altos passaram a contribuir de forma proporcional a seus ganhos, recolhendo sobre a fatia dos rendimentos que ultrapassasse o teto da previdência geral (que hoje é de R$ 5,3 mil). Mas ainda havia discrepâncias nessa matemática, como a paridade e a integralidade.

Os servidores que ingressaram no serviço público entre 1999 e 2012 mantêm seus salários integrais na aposentadoria e têm direito aos mesmos reajustes concedidos aos servidores da ativa, o que torna insuficiente o montante com que contribuíram. Além disso, não havia regra sobre a proporcionalidade dos seus recolhimentos e o benefício no futuro.

Com isso, uma pessoa que ingressou no serviço público após 20 anos de trabalho ganhando menos no setor privado poderia se aposentar ainda cedo como servidor, pelo teto, e ter direito a salário integral e proporcional com a ativa pelos 30 anos que permanecesse aposentado.

Esse também é um dos motivos do déficit da Previdência. Segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), tanto o Regime Próprio civil como o militar têm sido recorrentemente deficitários nos últimos 14 anos. Mas o maior problema está entre os servidores. A IFI conclui que a previdência dos funcionários públicos atende o equivalente a 3% dos beneficiários do Regime Geral, mas gera um déficit equivalente a mais da metade do registrado pelo INSS. 

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Os cerca de 30 milhões de beneficiários que não trabalharam para o governo geraram um déficit de R$ 149,7 bilhões em 2016. Enquanto isso, os pouco menos de 1 milhão de beneficiários do regime próprio, os servidores, geraram um déficit de R$ 77,2 bilhões, mais da metade do primeiro.

Quanto ganham os aposentados

O gasto mensal médio com servidor aposentado é de R$ 9,4 mil, sendo R$ 10,3 mil para militares e R$ 9 mil para civis. No regime geral, o gasto médio mensal é de R$ 1,2 mil. Como ambos são deficitários, o Tesouro Nacional tem de complementar esses valores. A cada mês, o contribuinte complementa com R$ 370 em média para cada aposentado do regime geral, enquanto arca com R$ 6,6 mil em média por servidor aposentado.

“A trajetória recente de déficits não revela, sozinha, toda a gravidade da questão: a tendência de longo prazo é piorar, e muito. Isso acontece por uma razão simples: a predominância dos regimes de repartição no segmento público da nossa Previdência Social, uma vez que RGPS e RPPS são basicamente regimes de repartição simples. Nesse tipo de sistemática, a conta da previdência é paga por meio de um pacto entre gerações. Isso implica necessariamente que a demografia é uma variável chave para a sustentabilidade do sistema”, afirma a IFI.