Depois de anunciar nas redes sociais a flexibilização da posse de armas, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) prepara um decreto sobre o tema, em conjunto com o ministro da Justiça, Sergio Moro. A informação foi confirmada pelo próprio presidente, em entrevista ao SBT, na quinta-feira (04). O decreto está entre as 50 prioridades que devem ser anunciadas pelo governo nos primeiros meses de gestão.
No Twitter, Bolsonaro prometeu “garantir a posse de arma de fogo para o cidadão sem antecedentes criminais, bem como tornar seu registro definitivo”.
Posse de arma já é permitida
A posse de armas já é permitida no Brasil e regulamentada pela Lei n.º 10.826/2003. Para obter o registro, é preciso preencher aos requisitos previstos no artigo 4.º: comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais; apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; e comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo.
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Em entrevista ao SBT, Bolsonaro falou sobre o assunto. “Na legislação tem um inciso que diz que você precisa comprovar a efetiva necessidade [para possuir uma arma]. E isso passou a ser algo subjetivo”, criticou o presidente.
Entre os pontos que ele pretende alterar por decreto está a permissão para possuir arma em estados em que o número de óbitos por arma de fogo a cada 100 mil habitantes for superior a 10. Nesses casos, quem quiser comprar a arma não precisa provar necessidade. “Isso já está superado [nesses casos]”, disse. Além disso, Bolsonaro pretende liberar a posse para quem vive no campo e aumentar o limite de armas permitidas por pessoa – hoje cada pessoa pode ter no máximo duas armas.
Especialista diz que Bolsonaro não pode mudar as regras por decreto
Mestre em direito penal e criminologia pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, o advogado Jovacy Peter Filho explica que Bolsonaro não pode alterar os requisitos previstos em lei para a posse de arma de fogo através de um decreto. “A essência de um decreto é regulamentar o exposto em uma lei. Se a lei coloca algum limite, ele não pode exceder esses limites”, explica.
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Segundo Peter, por meio de um decreto, Bolsonaro pode flexibilizar apenas o prazo para renovação do registro. Ele cita o exemplo de um decreto editado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB) sobre o tema. “O presidente Michel Temer alterou um dispositivo do decreto que dizia respeito ao prazo de renovação do registro”, explica o advogado. “Bolsonaro está propondo que esse registro seja ilimitado, que não haja mais prazo para renovação do registro; seria um direito que o cidadão adquiriria sem necessidade de renovar”, explica.
Mas, para o constitucionalista e professor de direito administrativo Francisco Zardo, o presidente não pode, através de um decreto, tornar o registro de posse de arma de fogo definitivo, por tempo ilimitado. “Pela lei, não pode ter um registro eterno. O que o legislador fez foi estabelecer que o período de renovação é não inferior a três anos. Ele deixa para o Poder Executivo uma margem de liberdade para estabelecer o período”, explica.
O período, de acordo com o constitucionalista, pode variar – levando em conta o bom-senso. “Saber qual o prazo vai depender das circunstâncias. Se for um prazo de 100 anos, talvez o Supremo Tribunal Federal entenda ser absurdo”, diz. Mas nada impede, segundo Zardo, que o presidente aumente o prazo para dez, vinte anos, ou mais.
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Prazo para renovação deve ser embasado em dados
Para Zardo, uma questão importante a ser levada em conta na discussão sobre a posse de armas é o prazo para renovação do registro. “Os pontos centrais desses requisitos [para obter a posse de armas] são a capacidade psicológica e a capacidade técnica. Acho que qualquer alteração deve vir necessariamente respaldada em dados técnicos, científicos”, diz o constitucionalista.
“De quanto em quanto tempo eu preciso avaliar a capacidade psicológica de uma pessoa? A mesma coisa vale para a capacidade técnica. Em quanto tempo eu desaprendo a atirar?”, exemplifica Zardo.
Flexibilização de requisitos depende de aprovação do Congresso
Em sua conta oficial no Twitter, Bolsonaro deu a entender que o único requisito para registro de posse de arma de fogo deve ser a inexistência de antecedentes criminais. Para que a proposta vire realidade, porém, o governo vai ter que apresentar um projeto de lei ao Congresso Nacional para alterar os requisitos previstos em lei.
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“Eu tenho convicção que ele não pode, por meio do decreto, reduzir os requisitos que estão dispostos na lei”, garante Peter. Caso o conteúdo da lei seja alterado por meio de decreto, o Supremo Tribunal Federal (STF) pode ser acionado para derrubar o decreto. “A gente pode ter questionamento sobre inconstitucionalidade do decreto, no sentido de desrespeitar o processo legislativo”, explica o advogado.
Na mesma sequência de postagens no Twitter, Bolsonaro ressaltou que espera a participação do Congresso na discussão. “A expansão temporal será de intermediação do Executivo, entretanto outras formas de aperfeiçoamento dependem também do Congresso Nacional, cabendo o envolvimento de todos os interessados”, disse o presidente.
Por decreto pretendemos garantir a POSSE de arma de fogo para o cidadão sem antecedentes criminais, bem como tornar seu registo definitivo.
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) 29 de dezembro de 2018
Posse x porte
O decreto de Bolsonaro sobre armas diz respeito apenas à posse de armas. Mas, em entrevista ao SBT, o presidente falou em também flexibilizar as regras para o porte. Ele ainda explicou a diferença entre os dois: a posse é ter a arma guardada em casa; o porte dá o direito para a pessoa carregá-la na rua.
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