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| Foto: Ricardo Moraes/ AFP

Na terça-feira (5), o presidente Jair Bolsonaro (PSL) publicou um post em sua conta oficial do Twitter com um vídeo em que dois homens praticam atos obscenos durante um bloco carnavalesco em São Paulo. O objetivo era fazer uma crítica sobre excessos comportamentais cometidos durante o carnaval e dialogar com seus seguidores.

Mas o compartilhamento do vídeo causou tanta polêmica que algumas pessoas se apressaram em cogitar o impeachment do presidente. Uma hashtag pedindo a cassação do mandato de Bolsonaro por causa do vídeo era a mais comentada do Twitter na manhã desta quarta-feira (6). Mas nem mesmo a oposição leva essa hipótese a sério.

Em entrevista ao jornal O Globo, o jurista Miguel Reale Júnior, uma das autoridades brasileiras no assunto, acredita que a publicação do vídeo configura quebra de decoro do cargo de presidente da República e encontra respaldo na Lei 1.079, de 1950, que define os crimes de responsabilidade do chefe do Executivo nacional e regula o respectivo processo de impedimento.

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O 9º artigo da referida lei, que trata dos crimes contra a probidade na administração, diz o seguinte no inciso número 7: “proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. O 2º artigo diz ainda que: “os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública (...)”

De acordo com a lei, qualquer cidadão pode apresentar denúncia formal contra o presidente da República por crime de responsabilidade, acrescido de provas documentais que justifiquem tal ato. O foro adequado nesse caso é a Câmara dos Deputados. Cabe ao presidente da Casa, no caso o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), receber ou não o pedido de impeachment e dar andamento ao rito processual legislativo.

Para Reale Júnior, na letra fria da lei, a postagem do presidente poderia até justificar um processo de impeachment com base na quebra de decoro. Mas o mais grave, explicou ao O Globo, é a “absoluta desnecessidade de enviar este vídeo abjeto ao povo brasileiro para denunciar algo que tinha sido visto, previamente, por algumas centenas de pessoas”, disse o jurista, um dos autores do pedido de impeachment que encerrou o governo de Dilma Roussef, em 2016. 

“Com a divulgação, ele deu exposição a um fato restrito, sem nenhuma necessidade: ou seja, ampliou o ato. Algo que seria visto por algumas pessoas foi visto pelo Brasil inteiro”, completou.

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Nisso, até aliados de Bolsonaro concordam. “Há muitas boas razões para criticar o Carnaval, não faltam problemas que poderiam ser evidenciados e evitados. Isso não justifica mostrar uma obscenidade para milhões de famílias por meio de uma rede social sob o pretexto de criticar a festa. Isso não é postura de conservador”, escreveu o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) no Twitter. 

Embora considere o tuíte de Bolsonaro “incompatível com a postura de um presidente”, Kataguiri não vê razão para falar em impeachment. “Dizer que é inadequado é uma coisa. Classificar como crime de responsabilidade é outra completamente diferente. Não é Direito, é ginástica olímpica. Um triplo carpado que passa bem longe da legalidade e do razoável”, afirmou em outra postagem no Twitter.

Sem clima político

Até mesmo membros da oposição consideram exagerada a interpretação de crime de responsabilidade e alegam não haver clima político para um processo de tamanha gravidade e repercussão política. Líder da minoria no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que, apesar da indecência das publicações, não acredita que isto seja suficiente para um processo de impeachment.

“Claramente ele infringiu a Lei 1.079. Mas, por mais indecente, de todos os pontos de vista da indecência, que seja o presidente da República, esta publicação ainda não é o bastante para afastar alguém que teve 56 milhões de votos. Mas ele passou de todos os limites do razoável”, afirmou o senador, que também disse não ser possível solicitar exame de sanidade mental de Bolsonaro.

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“Se fosse nos Estados Unidos, caberia ao Congresso pedir um exame de sanidade do presidente. Como não há este instituto no direito brasileiro, não cabe. Toda pessoa sabe que existem limites. A representação exige a postura para o exercício da função. Esse caso é de desrespeito à instituição Presidência da República. E também desrespeito ao país, à cultura nacional. O presidente da República, visivelmente, precisa de intervenção psíquica”, disse Randolfe.

O Partidos dos Trabalhadores afastou a hipótese de impeachment de Bolsonaro pela divulgação do vídeo obsceno, mas vai pedir que a Procuradoria-Geral da República investigue o presidente. “A lei 13.718, recentemente aprovada, tipifica o crime de divulgação, sem o consentimento da vítima, de cena de sexo, nudez ou pornografia”, escreveu o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) em sua conta no Twitter.

A mesma oposição que pede uma responsabilização do presidente , porém, não criticou o ato obsceno em si, como bem observou a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo Congresso. “A esquerda lacradora pirou com a divulgação do vídeo por@jairbolsonaro, mas NÃO deu um pio sobre a siotuação promíscua, sobre o ato libidinoso – portanto criminosos – feito a céu aberto. E aí?? Nada de novo. É só a esquerda sendo esquerda, cada vez mais hipócrita” 

Polêmica gerou audiência

Bolsonaro ainda não comentou a polêmica em si, mas pôs lenha na fogueira em novas postagens na rede social. Na manhã desta quarta, ele publicou uma pergunta: “O que é golden shower?”. A expressão em inglês ganhou as redes sociais após o compartilhamento do vídeo e se refere ao fetiche de urinar na frente de um parceiro ou sobre ele.

À tarde, outro tuíte, agora para comemorar o crescimento no número de seguidores no Twitter, que já são quase 3,5 milhões. Em tempo, a hashtag #BolsonaroTemRazão teve mais interações (323 mil tuítes) do que a concorrente #ImpeachmentBolsonaro (211 mil) até a publicação desta reportagem.

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