O governo Jair Bolsonaro vai acionar a Advocacia-Geral da União (AGU) para evitar o pagamento de indenizações concedidas pela Comissão de Anistia a ex-militares da Força Aérea Brasileira (FAB), que somam R$ 7,4 bilhões. Embora tenham sido militares, os contemplados alegam ter sofrido perseguição política dentro dos quartéis entre 1946 e 1988 – período que engloba a fase da ditadura (1964-1985). A medida é a primeira do governo para acabar com o que considera ser uma farra na concessão da “bolsa-anistia”.
A cifra de R$ 7,4 bilhões corresponde a valores retroativos de decisões ocorridas nos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. A decisão de acionar a AGU foi tomada em conjunto pelo Palácio do Planalto e pelo comando da Aeronáutica.
Até o ano passado, a conta total envolvendo anistiados políticos chegava a R$ 17,4 bilhões. Desse valor, R$ 9,9 bilhões já foram pagos – R$ 3,5 bilhões para ex-militares da Aeronáutica, do Exército e da Marinha e R$ 6,4 bilhões para civis.O valor, quando concedido, é vitalício.
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Não existe na legislação prazo final para que cidadãos requeiram a reparação – o que significa que a conta nunca fecha. Atualmente, 12.669 pessoas, entre civis e militares, aguardam uma decisão. Na fila, estão Dilma e Lula. Dilma inclusive pede R$ 10,7 mil por mês, mas já há parecer contrário.
A Comissão de Anistia é formada por, no mínimo, 20 pessoas indicadas pelo governo. Até o governo de Michel Temer, a prerrogativa era do Ministério da Justiça. Na gestão Bolsonaro, passou para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandada por Damares Alves. A orientação dela é “fechar a torneira” das indenizações.
Governo diz que pagamento é absurdo
A cúpula das Forças Armadas e o núcleo dos ministros militares do governo Bolsonaro consideram “absurdo” o pagamento de indenizações aos ex-integrantes da FAB. Um brigadeiro disse à reportagem que a maioria dos pedidos de indenização é “indevida” e que muitos praças aproveitaram a política de reparação em benefício próprio.
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Um ministro de origem militar afirmou que, para evitar o pagamento bilionário, o governo decidiu recorrer ao caminho “político”, além de tentar sensibilizar a opinião pública para o que ele considera uma “roubalheira” dos cofres públicos. Em conversas reservadas, o mesmo ministro avaliou que, no começo dos trabalhos da Comissão de Anistia, as indenizações foram justas, mas logo teria começado o pagamento de uma série de benefícios sem fundamento histórico. Virou uma “indústria”, de acordo com ele.
Procurada, a assessoria de imprensa da FAB informou que aguarda a chegada oficial da notificação dos pedidos de indenização para definir uma “linha de ação”.
No ano passado, foram 650 novos pedidos
Em 2018, a Comissão de Anistia recebeu 650 novos processos, de um total de quase 77.931 apresentados desde 2002. Apenas 48 requerimentos foram deferidos no ano passado – a menor quantidade da série histórica. O auge ocorreu na “era PT”, logo após a posse de Lula, que, como ex-líder sindical, recebe aposentadoria de anistiado pelo INSS de cerca de R$ 6 mil.
De 2003 a 2010, o governo Lula concedeu 33.915 anistias. A gestão Dilma deferiu 4.264 anistias para civis e militares. Já a administração Temer liberou 442 pedidos de indenização.
Ex-ministro da Justiça do governo Lula, Tarso Genro rechaçou haver uma “farra” nas indenizações. “O valor deve ter sido destinado a milhares de pessoas atingidas pelas decisões de ‘exceção’ dos governos de fato oriundos do regime militar. Até o momento que acompanhei, estavam sendo pagas a quem de direito”, disse.
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FAB teve revoltas às vésperas do golpe de 1964
Na lista de espera das indenizações da Comissão de Anistia estão cabos, soldados e sargentos da Força Aérea Brasileira (FAB) que protagonizaram revoltas às vésperas do golpe de abril de 1964 contra o presidente João Goulart. Em 12 de maio de 1963, cerca de mil militares da Aeronáutica realizaram um encontro no Rio que surpreendeu o governo. Eles ameaçavam um movimento armado caso o Supremo Tribunal Federal impedisse a elegibilidade dos militares, o que acabou ocorrendo.
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Em 12 de setembro daquele ano, 630 praças da FAB bloquearam as estradas de acesso a Brasília, fecharam o aeroporto e ocuparam prédios públicos. O “Levante de Brasília” foi liderado pelo sargento da FAB Antonio Prestes de Paula, ligado ao líder trabalhista Leonel Brizola. Os revoltosos prenderam o ministro do STF Vitor Nunes Leal e o presidente interino da Câmara, Clóvis Mota. O soldado do Exército Divino Dias dos Anjos e o motorista civil Francisco Moraes foram mortos.
Em outubro de 1964, sete meses após o golpe, o comando da Aeronáutica baixou a Portaria 1.104 para limitar a progressão na carreira, estipulando um desligamento após oito anos de serviço.
A partir da criação da Comissão de Anistia, os desligados da FAB ao longo do período militar começaram a pedir reparação. Num primeiro momento, a comissão indeferiu pedidos de quem foi desligado depois da portaria. O grupo passou a aceitar pedidos de quem tinha deixado a força antes da medida por entender que o ato da Aeronáutica teve caráter político e de exceção.