O presidente Jair Bolsonaro embarcou neste domingo (20) para Davos, na Suíça, onde participará da reunião anual do Fórum Econômico Mundial. É a primeira viagem internacional de Bolsonaro como presidente da República. Ele fará um discurso de 45 minutos na abertura dos debates do evento, na terça-feira (22), e a expectativa é de que se esforce para passar aos demais líderes mundiais que o Brasil voltou a ser um bom local para negócios.
Ao longo do Fórum, Bolsonaro e sua equipe destacarão temas como a agenda liberal na economia, a reforma da Previdência e os projetos anticorrupção que o governo federal tentará emplacar ao longo de 2019. A assinatura da medida provisória contra fraudes na Previdência, na sexta-feira (18), será apresentada como uma demonstração da austeridade fiscal que Bolsonaro pretende implantar no país. Ele também pretende defender a aprovação rápida da reforma das aposentadorias, em mais um sinal positivo para os investidores internacionais. As parcerias internacionais, que o presidente costuma definir como “o comércio sem viés ideológico”, também estarão na pauta.
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Bolsonaro tentará transmitir uma boa impressão pessoal
Além da temática econômica, o presidente buscará passar ao mundo uma boa imagem individual. Sua vitória nas eleições de outubro foi celebrada por políticos de direita e centro-direita, como o presidente da Argentina, Mauricio Macri, e o vice-primeiro-ministro da Itália, Matteo Salvini. No entanto, veículos de comunicação de diversos países relembraram declarações de Bolsonaro consideradas machistas, homofóbicas e autoritária. O presidente também atraiu holofotes negativos ao determinar que o país abandone o pacto de migração estabelecido pela Organização das Nações Unidas (ONU) e sinalizar que o Brasil poderia deixar o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas (o que, contudo, acabou não ocorrendo).
Davos é, portanto, uma chance para que Bolsonaro se mostre ao mundo como um gestor, não apenas como uma figura controversa. O presidente inclusive deverá buscar demonstrar ao mundo seu compromisso com a democracia, para afastar a imagem internacional de ser um político com inclinação autoritária.
A edição de 2019 da reunião do Fórum não contará com a presença de alguns dos mais importantes líderes mundiais – como os presidentes da China, Xi Jinping; da França, Emanuel Macron; e dos EUA, Donald Trump. O americano e o francês decidiram se ausentar para dar prioridade à gestão de crises internas – Trump enfrenta o “shutdown” (paralisação) da administração pública em seu país, e Macron tem passado dificuldades com a série de protestos dos “coletes amarelos” nas ruas francesas.
Davos pode servir para Bolsonaro criar agenda positiva e ‘desviar’ do caso Queiroz
Para Bolsonaro, Davos pode ter efeito oposto. O caso Queiroz tem afetado o presidente e se agravou após o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) pedir que ao Supremo Tribunal Federal (STF) a interrupção das investigações. No fim de semana, novas suspeitas foram levantadas contra o filho do presidente. Sair do país e se apresentar ao mundo pode criar agendas positivas para o presidente: como o encontro já agendado entre ele e o chefe do Executivo da Itália, Giuseppe Conte, em que ambos celebrarão a prisão do terrorista Cesare Battisti.
A viagem de Bolsonaro fará com que o Brasil seja administrado temporariamente pelo vice-presidente, General Mourão. O segundo na hierarquia da República tem dito que atuará de forma discreta no comando do país, mas suas declarações controversas costumam acender o sinal de alerta. Em entrevista à revista Época divulgada na sexta-feira (18), Mourão questionou a capacidade do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo: “Ele não falou o que pretende fazer”. Depois de Davos, Mourão terá ainda outra oportunidade de presidir o Brasil, em fevereiro, quando Bolsonaro se afastará para fazer uma cirurgia. Bolsonaro não tem outras viagens internacionais confirmadas para os próximos meses.
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Paulo Guedes e Sergio Moro terão papel-chave em Davos
Bolsonaro viajará acompanhado do chanceler Ernesto Araújo e dos ministros Paulo Guedes (Economia), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Sérgio Moro (Justiça) e Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral da Presidência). O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, também irá à Suíça – é o único parlamentar confirmado na comitiva.
Considerados os principais “fiadores” do governo Bolsonaro, Guedes e Moro terão papel-chave no objetivo de tentar passar uma boa imagem do Brasil aos líderes presentes em Davos.
O ministro da Economia terá como prioridade consolidar a imagem de que a gestão Bolsonaro é amigável ao mercado. Ele falará sobre privatizações, diminuição do tamanho do Estado, meta de impulsionar investimentos em tecnologia e, claro, a reforma da Previdência. O governo ainda não decidiu qual o modelo de reforma que apresentará ao Congresso, mas o objetivo de tapar o rombo será destacado. À imprensa, uma fonte do ministério da Economia disse que o Brasil vai procurar exibir que o governo Bolsonaro quer “tirar o estado do cangote do empreendedor” – expressão que o presidente costumava repetir durante a campanha eleitoral.
Moro vai procurar expor que o Brasil vive novo momento no combate à corrupção. O ministro, conhecido internacionalmente por causa da condenação que impôs ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, falará sobre sua agenda de ataque ao crime organizado, à violência no Brasil e à corrupção na política. Na quarta-feira (16), durante a visita do presidente argentino Macri a Brasília, Moro disse que o Brasil pretende assinar um tratado de extradição com o país vizinho, para dinamizar o processo.
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Já o deputado Eduardo Bolsonaro falará sobre a migração dos venezuelanos ao Brasil, que têm entrado no estado de Roraima para fugir da ditadura de Nicolás Maduro. “Dia 22 estarei em Davos no Fórum Mundial Econômico (WEF) a convite de Marisol Argueta, diretora do WEF para América Latina. Lá apresentaremos painel mostrando ao mundo o que se passa na fronteira Roraima-Venezuela esperando angariar apoio para pautas humanitárias”, escreveu o parlamentar em seu perfil no Twitter.
Qual a importância de Davos?
A reunião anual do Fórum Econômico Mundial é tradicionalmente realizada em janeiro e sempre na cidade suíça de Davos, um destino turístico sofisticado, com população pequena (cerca de 11 mil habitantes), que se transforma para receber os principais líderes do mundo.
Além dos governantes, o evento reúne empresários de grande porte, o que o transforma em uma das principais oportunidades globais para a concretização de negócios. Os debates também abordam temas sociais, como combate à pobreza e promoção da sustentabilidade. Nos últimos anos, a questão de gênero ocupou protagonismo – a edição do ano passado teve como um dos destaques o pronunciamento da jovem paquistanesa Malala Yousafzai, que defendeu programas que incentivem a educação de meninas.
Davos costuma também atrair celebridades internacionais. O cantor britânico Elton John e os atores americanos Brad Pitt e Angelina Jolie passaram pelo evento em ocasiões anteriores. Em 2019, o apresentador, empresário e “quase presidenciável” Luciano Huck participará do encontro.
A reunião dos principais líderes políticos do mundo também costuma estimular protestos – que são coibidos pelo pesado esquema de segurança montado na cidade suíça. No início da década passada, o Fórum Social Mundial surgiu como uma “alternativa” ao Fórum de Davos. O encontro, ainda realizado anualmente, promove o encontro de organizações sociais e militantes de esquerda.
Histórico brasileiro no Fórum Econômico Mundial
Assim como a edição de 2019 representará a estreia internacional de Bolsonaro, a de 2003 serviu para que Lula se tornasse conhecido em escala global. O então recém-empossado presidente fez um discurso em que falou sobre o combate à fome no Brasil e sugeriu a criação de um fundo internacional para a redução da pobreza. Poucos dias depois da participação na Suíça, Lula esteve em Porto Alegre para prestigiar o Fórum Social Mundial. A presença nos dois eventos, que se apresentam como antagônicos entre si, foi celebrada à época.
Já em 2014, no último ano de seu primeiro mandato, Dilma Rousseff precisou falar ao mundo sobre a onda de protestos que havia varrido o país no ano anterior. A ex-presidente adotou um discurso que acabaria embalando sua bem-sucedida campanha de reeleição: o de que as manifestações eram de uma população que buscava “mais cidadania”, e não retrocessos.
A presença de Dilma em 2014 acabaria sendo a última de um presidente do Brasil até 2018, quando Michel Temer foi a Davos pela única vez. Na ocasião, ele, assim como a equipe de Bolsonaro pretende fazer em 2019, falou sobre a reforma da Previdência.