O governo brasileiro informou oficialmente à Organização das Nações Unidas (ONU), nesta terça-feir (8), que o Brasil está se retirando do Pacto Global de Migração, assinado pelo país em dezembro, ainda pelo governo de Michel Temer (MDB). Diplomatas brasileiros confirmaram que a ONU já foi notificada da decisão do governo de Jair Bolsonaro de se retirar do acordo.
Negociando por quase dois anos, o Pacto era uma resposta internacional à crise que havia atingido diversos países por causa do recente crescimento do fluxo de migrantes e refugiados. O texto do acordo não suspendia a soberania de qualquer país e nem exigia o recebimento de uma certa quantidade de estrangeiros. O pacto foi aprovado por mais de 150 países na a conferência intergovernamental da ONU, em Marrakesh, no Marrocos.
Chanceler de Bolsonaro anunciou saída no mesmo dia que Brasil assinou o pacto
O anúncio de que o Brasil deixaria o Pacto de Migração foi feito pelo Twitter pelo atual chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, no mesmo dia em que o Itamaraty ainda sob a gestão Temer assinava o acordo, em uma reunião da ONU no Marrocos. “A imigração não deve ser tratada como questão global, mas sim de acordo com a realidade e a soberania de cada país”, disse Araújo, chamando o marco de “ferramenta inadequada para lidar com o problema”.
Leia também: Chanceler brasileiro diz que China é exemplo: ‘se defende sem pedir desculpa’
“O Brasil buscará um marco regulatório compatível com a realidade nacional e com o bem-estar de brasileiros e estrangeiros. No caso dos venezuelanos que fogem do regime Maduro, continuaremos a acolhê-los”, afirmou. Segundo ele, a imigração “é bem-vinda, mas não pode ser indiscriminada” e deve estar “a serviço dos interesses nacionais e da coesão de cada sociedade”.
Naquele momento, a ONU comentou a intenção brasileira. “É sempre lamentável quando um Estado se dissocia de um processo multilateral, em especial um [país] tão respeitável de especificidades nacionais”, declarou Joel Millman, porta-voz da Organização Internacional de Migrações, ao ser questionado sobre a informação relativa ao Brasil. Segundo ele, apesar da saída de alguns países, 164 governos assinaram o documento. “Esse é um quadro para cooperação”, disse.
Saiba mais: Duas vitórias e muitas dúvidas na gestão de Ernesto Araújo
Entidades alertam que brasileiros no exterior poderão perder direitos
Para entidades que tratam da questão dos refugiados e imigrantes, porém, a decisão do Brasil em se afastar do pacto terá um impacto para emigrantes nacionais espalhados pelo mundo. “Hoje há muito mais brasileiros vivendo no exterior do que migrantes aqui no Brasil”, alertou Camila Asano, coordenadora de programas da ONG Conectas.
“São compatriotas que muitas vezes passam por dificuldades seja na Europa, EUA, Japão ou outras partes do mundo. O Pacto Global de Migração consolida e reforça direitos das pessoas, inclusive os mais de 3 milhões de brasileiros vivendo fora, de não serem discriminadas por serem migrantes”, completou Camila Asano.
Fique por dentro: Ministro da Defesa não vê motivo para base militar americana no Brasil, cogitada por Bolsonaro
Paal Nesse, do Conselho Norueguês de Refugiados, também lamenta a decisão de governos de deixar o esforço e indicou que não existem indicações de que o pacto mine a soberania de um país. “O pacto prevê um espaço suficiente para que cada governo possa ter sua política”, disse Paal Nesse, representante de uma das maiores entidades que lidam com refugiados e migrantes. “Não há nada que indique a soberania seria abandonada ou perdida.”
Para ele, a decisão de governos de se distanciar do pacto “enfraquece o momento político e mina os esforços internacionais para ter a migração organizada de forma mais ordenada”. Como exemplo, ele cita os termos do pacto que incentivam a cooperação regional. “Vimos na América do Sul, com a crise na Venezuela, como tal medida é necessária”, indicou.
Ele ainda lembra que, no caso brasileiro, o interesse em fazer parte do pacto seria a defesa dos interesses de seus próprios migrantes, espalhados pelo mundo. “O Brasil é um exemplo de um país que recebe migrantes. Mas que é também fonte de emigração”, comentou. “Cada governo quer que o seu cidadão seja tratado sem discriminação no exterior e isso exige cooperação”, completou.
Deixe sua opinião