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| Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

O governo e o Congresso anunciaram nesta terça-feira (23) um acordo para zerar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), que compõe a carga tributária sobre o diesel. A medida visa conter a alta no preço do combustível e dar uma resposta ao movimento grevista dos caminhoneiros, que desde a manhã de segunda-feira (21) causa transtornos em estradas e desabastecimento de produtos.

Mas a informação de que a Cide pode ser baixada a zero não animou os motoristas de carga. Eles prometem manter a paralisação até que a Petrobras reveja a sua política de preços sobre os combustíveis. “A adesão tem aumentado e amanhã [quarta] vai piorar. Infelizmente. Tivemos a informação de que querem tirar a Cide, sem negociar com a gente. Não vai ajudar, tem de tirar tudo [impostos]”, disse José da Fonseca Lopes, presidente da Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), que convocou a greve na última sexta-feira (18).

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A insatisfação dos caminhoneiros já chegou a pelo menos 23 estados e no Distrito Federal. Eles têm protestado com interdições parciais ou totais de pistas e até queima de pneus. Na maior parte dos casos, apenas caminhões estão sendo proibidos de trafegar. A movimentação de cargas já começa a ser prejudicada, com dificuldades de acesso a portos e indústrias dos mais diversos segmentos – do agronegócio à indústria automotiva.

De acordo com Lopes, o fato de o movimento não ter sido chamado para sentar com o governo preocupa porque “nas pontas [nas rodovias] as coisas estão ficando difíceis”. “[Os manifestantes] estão achando que o governo está fazendo pouco caso e que o movimento não vai levar a nada. Se amanhã pegar no breu, vai parar tudo, vai parar os cinco dias. Não é isso que nós queremos. Mas é o que o governo está tentando. A não ser que queira fazer isso para justificar que ele não fez [algo], que nós os obrigamos a fazer”, explicou.

Segundo a Abcam, nesta terça-feira 300 mil caminhoneiros aderiram às manifestações, 100 mil a mais que no primeiro dia. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) contabilizava na noite desta terça interrupções em pelo menos seis rodovias federais. Os únicos estados que não contavam com manifestação eram Acre, Amapá e Rio Grande do Norte.

Governo se diz sensível à questão

Como o presidente Michel Temer decidiu que não haverá intervenção estatal sobre a política de preços da Petrobras, a única alternativa para a equipe econômica foi mexer na Cide e buscar formas de compensar a perda de receita para a União.

Em pronunciamento à imprensa, o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, disse que o governo está atento e sensível à questão do preço dos combustíveis. Ele relatou as diversas reuniões da cúpula do governo desde o fim de semana e manteve o canal de negociação aberto com o setor de transporte de cargas.

“Sabemos do impacto que o aumento do combustível tem na economia e continuaremos conversando com os caminhoneiros para debater alternativas para o problema, incluindo novas medidas”, completou.

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O ministro chegou a fazer um apelo, em vão, para que os caminhoneiros voltem às atividades normais. “Sabemos que a paralisação pode trazer inúmeros problemas não apenas para a economia, mas para a população como um todo”, acrescentou.

Ele enfatizou ainda que o aumento recente nos preços dos combustíveis reflete a alta do preço do barril de petróleo no mercado internacional. “O petróleo é uma commodity dolarizada, e por isso o preço no Brasil também reflete a taxa de câmbio. Ao longo dos últimos dois anos tivemos um aumento significativo do preço do petróleo no mercado internacional e nos últimos dias o real se desvalorizou em relação ao dólar”, explicou.

Guardia disse que ficou combinado com os presidentes da Câmara e do Senado que, assim que o projeto de reoneração da folha de pagamento for aprovado pelo Legislativo, será publicado um decreto zerando a cobrança da Cide sobre o diesel. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que pretende colocar o projeto em votação na próxima semana. A equipe econômica estima uma perda de R$ 2,5 bilhões com a Cide e um ganho de R$ 3 bilhões com a reoneração.

Apesar de o impacto para a União ser grande, para o consumidor será pequeno. Em São Paulo, vai gerar uma redução em torno de 1,6%, o equivalente a R$ 0,06 por litro. Nos outros estados, essa redução vai variar de acordo com a alíquota de ICMS.

Ao retirar a Cide do preço do combustível, haverá uma redução da base de cálculo de outros tributos, principalmente o ICMS, que sozinho responde por 14% do preço do diesel nas bombas. Em um mês, o preço médio do litro do diesel no país subiu 4,9%, passando de R$ 3,42 para R$ 3,59. No mesmo período, a gasolina teve aumento de 1,64% passando de R$ 4,21 para R$ 4,28.

Paralisação afeta indústrias e causa desabastecimento

O segundo dia de greve dos caminhoneiros autônomos afetou o abastecimento em alguns setores, como o automotivo, o de carnes e o de combustíveis. Foi registrada uma morte, no Paraná. Um homem foi atropelado acidentalmente na BR-376, em Paranavaí, durante um bloqueio. O nome da vítima não foi revelado.

Cinco plantas ligadas à avicultura e suinocultura em Minas Gerais, Santa Catarina, Goiás e Rio Grande do Sul tiveram de suspender operações. O cenário tende a piorar nesta quarta-feira (23), se a greve for mantida, diz a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). Ao menos 20 unidades não terão como operar, afetando o abastecimento no país e as exportações.

“O impacto até aqui é muito mais relevante do que das outras vezes [em que caminhoneiros pararam]”, afirmou Ricardo Santin, vice-presidente e diretor de mercados da ABPA, que representa mais de 140 agroindústrias e entidades vinculadas à avicultura e à suinocultura.

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Para o presidente-executivo da Abrafrigo (Associação Brasileira de Frigoríficos), Péricles Salazar, todo o setor de animais vivos, de leite e o abastecimento em geral estão sendo muito afetados: “Se isso perdurar por mais 24, 48 horas, a situação fica dramática.” Segundo Salazar, há relatos de caminhões com bovinos parados nas rodovias.

A Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) informou que o fluxo da commodity para os portos sofreu redução. A Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais) diz haver impacto no fluxo de caminhões e o recebimento das cargas em portos.

Já há dificuldade para a produção de veículos. Quatro fábricas já têm linhas suspensas: Gravataí (RS) e São Caetano do Sul (SP), da General Motors; Camaçari (BA) e Taubaté (SP), ambas da Ford. Nas três primeiras, faltam peças, enquanto Taubaté parou porque produz motores e transmissões para Camaçari.

Se a greve persistir, a Volkswagen, em Taubaté, também pode suspender operações. “Se essa situação não for resolvida até o fim desta semana, teremos um problema setorial grave”, disse Antonio Megale, presidente da Anfavea (associação das montadoras).

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A Inframerica, administradora do aeroporto de Brasília, informou que os caminhões com combustíveis para os aviões “enfrentam dificuldades para chegar ao aeroporto e que passageiros devem buscar as companhias aéreas para ter mais informações.

Os portos de Santos e Paranaguá (PR) informaram, via assessorias, que o fluxo de veículos está reduzido. No porto paranaense, só 300 caminhões deram entrada nesta segunda, ante os cerca de 2 mil desta época do ano.

Bloqueios nos estados

Neste segundo dia de paralisação, o movimento apresentou crescimento. No Paraná, por exemplo, o total de pontos de bloqueio passou de 20 para 36, de acordo com a PRF. Em outros nove pontos os protestos já tinham encerrado.

Em São Paulo, paralisações ocorreram em locais como as rodovias Régis Bittencourt, Anhanguera, Brigadeiro Faria Lima, Marechal Rondon e Dutra. Ao menos 20 municípios do interior tiveram manifestações, entre eles Piracicaba, Santos, Bauru e Bebedouro.

Já em Minas Gerais, os protestos ocorreram em pelo menos 20 pontos de rodovias, 5 a mais que no dia anterior. Entre os locais afetados estão a Fernão Dias, na região metropolitana de Belo Horizonte.

No Rio de Janeiro, um trecho da Dutra foi interditado no sentido São Paulo-Rio e caminhões pararam no acostamento no sentido inverso. Houve manifestação na BR-101.

Goiás teve ao menos sete pontos de manifestação, em cidades como Aparecida de Goiânia, Catalão e Rio Verde.

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