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| Foto: Marcelo Elias/Gazeta do Povo

O ministro da Economia, Paulo Guedes, já avisou que a proposta de reforma da Previdência que será enviada ao Congresso em fevereiro vai incluir a criação de um novo regime de aposentadoria, a capitalização, conforme prometido durante a campanha eleitoral. A discussão dentro do governo Bolsonaro, agora, diz respeito à renda necessária para que o trabalhador possa ingressar nesse sistema. A tendência é de que apenas pessoas com salários mais altos possam participar, segundo reportagens dos jornais “O Globo” e “Valor”.

No regime de capitalização, as contribuições previdenciárias do trabalhador vão se acumulando numa poupança individual que ele mesmo vai resgatar, mensalmente, na aposentadoria. É o que ocorre na previdência privada. É também é o modelo adotado no Chile décadas atrás, que ficou famoso mas acabou rendendo aposentadorias baixíssimas para boa parte dos trabalhadores, que ao longo da vida contribuíram pouco para suas poupanças.

Atualmente, a Previdência Social brasileira – e a da maioria dos países – usa o sistema de repartição simples, em que as contribuições dos trabalhadores são usadas para bancar os benefícios de quem já se aposentou.

Proposta em estudo

Segundo relatos de bastidores da equipe econômica, uma das principais propostas em estudo no governo Bolsonaro é a apresentada pelos economistas Armínio Fraga e Paulo Tafner. Ela não institui um modelo de capitalização “puro”, mas sim “híbrido”, que mistura uma parcela de benefício universal (o piso previdenciário) mais uma de repartição simples (até determinada remuneração) com uma camada de capitalização (para os valores que excederem a linha de corte da repartição).

Assim, quem ganha acima de determinado salário poderá participar do sistema de capitalização. Mas esse sistema bancaria apenas uma parte da futura aposentadoria desse trabalhador – justamente a parte que exceder a linha de corte.

Em outras palavras: se levada adiante a sugestão dos dois economistas, o profissional mais bem remunerado continuará contribuindo para o atual regime de repartição (que formará parte de sua renda como aposentado) mas também contribuirá para a capitalização (que bancará a parcela do benefício que superar determinado valor).

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Armínio e Tafner propõem uma alíquota para a capitalização de 8,5% e que, se quiser, o trabalhador possa acrescentar, à sua conta individual de Previdência, até 25% do valor depositado em suas contas de FGTS. A chamada “nova Previdência” seria voltada a trabalhadores nascidos a partir de 2014 – que, em tese, só começarão a trabalhar e contribuir para o sistema de 2030 em diante.

Ainda que o governo Bolsonaro realmente adote a reforma sugerida por Armínio e Fraga, todas essas datas e valores envolvidos estão sujeitos a modificação.

A vantagem dessa proposta, em relação à implantação imediata de um sistema de capitalização “puro”, é que ela teria um custo mais baixo para os cofres públicos, por ser implementada aos poucos, para pessoas que ainda entrarão no mercado de trabalho e garantindo ao menos parte do financiamento do atual sistema de repartição.

Caso todos os trabalhadores – ou grande parte deles – migrassem imediatamente para a capitalização, contribuindo somente para suas poupanças individuais, o INSS não teria dinheiro para pagar as atuais aposentadorias. O custo, de centenas de bilhões de reais, recairia sobre o Tesouro – isto é, o contribuinte.

O sistema de capitalização de Armínio e Tafner

Pela proposta de Armínio e Tafner, a camada de capitalização será criada progressivamente entre 2020 e 2040. O valor da aposentadoria no novo regime será formado pela soma de: 1) o valor correspondente ao Benefício Universal do Idoso, equivalente a 70% do salário mínimo de 2020; 2) a parcela correspondente ao regime de repartição simples; e 3) a parte correspondente à capitalização, isto é, a poupança individual formada pelo contribuinte.

A parcela da capitalização começa pequena, mas crescerá com o tempo. A soma das duas primeiras parcelas (benefício universal mais repartição), que começa em 100% do benefício em 2020, será corrigida abaixo da inflação até corresponder, em 2040, ao máximo de 70% do teto da Previdência. Acima disso, seria a camada da capitalização.

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Com o passar do tempo, a linha de corte ficará cada vez mais baixa. Pela simulação feita na proposta de Armínio e Tafner, em 2025 o valor relativo à repartição será de R$ 4.496; acima dele, entra a camada de capitalização. Em 2030, a linha de corte será mais baixa, de R$ 4.056. Em 2040, de R$ 3.284.

Assim, no início o sistema seria acessível apenas a quem tem rendas maiores. Aos poucos, no entanto, trabalhadores com salários um pouco mais baixos poderiam também contribuir para ele.

Segundo o jornal “O Globo”, uma parte do financiamento do regime de capitalização pode vir da economia esperada com a medida provisória que vai endurecer regras para o pagamento de benefícios, reduzindo a possibilidade de fraudes e irregularidades. A meta de Paulo Guedes com a MP é ambiciosa: ele espera economizar perto de R$ 20 bilhões por ano com ela. Isso poderia garantir uma implantação mais rápida da capitalização, regime do qual ele é entusiasta.

Manobra na Câmara

Para propor a implantação do modelo de capitalização, o governo prepara uma manobra na Câmara dos Deputados. A equipe de Bolsonaro quer já levar a proposta de reforma da Previdência direto para o plenário da Casa, aproveitando que o projeto encaminhado pelo ex-presidente Michel Temer já passou pela etapa das comissões.

Apesar de o texto de Temer não prever a criação de um regime de capitalização, técnicos envolvidos na formulação da reforma de Bolsonaro dizem ser possível incluir isso na proposta que já está na Câmara.

Pelo menos dois deputados tentaram, por meio de emendas, criar um sistema de capitalização – Arnaldo Jordy (PPS-PA) e Alfredo Kaefer (PP-PR). Essas emendas, contudo, não avançaram e foram rejeitadas, em 2017, na tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

O governo argumenta que, por já haver emendas nesse sentido, poderá incluir a mudança do regime previdenciário no texto a ser apresentado no plenário da Câmara, que reunirá toda a reforma a ser desenhada pelos ministros, especialmente o da Economia, Paulo Guedes, e pelo presidente. Essa manobra é chamada de emenda aglutinativa por juntar assuntos que já foram alvo de debate durante a tramitação da PEC.

De acordo com a Secretaria-Geral da Mesa da Câmara, o atalho tem sido usado nos últimos anos. Os técnicos do Legislativo, no entanto, não podem dizer agora se, no caso planejado pelo governo, a manobra é legal.

A oposição já se prepara para contestar a via escolhida pelo governo para acelerar a votação da reforma da Previdência. “Vamos questionar isso tanto politicamente quanto juridicamente. Me parece uma tentativa de mexer com a vida das pessoas sem discutir com elas. A admissibilidade e constitucionalidade dessas emendas [dos deputados] têm que ser analisadas antes do plenário”, afirmou o deputado Paulo Pimenta (RS), líder do PT na Câmara.

Um dos integrantes do conselho criado por Guedes para tratar da reforma da Previdência, o economista Fábio Giambiagi também é contrário à estratégia do governo de incluir o debate da capitalização na PEC que já tramita no Congresso Nacional.

“Sou extramente cético em relação à conveniência de incorporar o tema, porque abriria um flanco para a contestação jurídica em troca de uma mudança pífia nos números [de gastos da Previdência]. Meu receio é que se dissipem energias discutindo o acessório quando o principal é a reforma paramétrica [que institui uma idade mínima para aposentadoria]”, justificou.

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