O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, viaja nesta semana a Washington para preparar o primeiro encontro de Jair Bolsonaro (PSL) com o o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Em entrevista, o chanceler informou que aproveitará a passagem pela capital americana, entre os dias 5 e 7 deste mês, para iniciar um esforço de aproximação e intercâmbio entre as agências reguladoras dos dois países. “Ao governo cabe fazer a regulação e facilitar os investimentos. Às vezes, as empresas querem investir, mas esbarram na regulamentação”, disse. “Temos que colocar as agências em sintonia.”
A preparação da viagem de Bolsonaro a Washington ocorre no momento em que o governo brasileiro intensifica sua aproximação com Trump. Na última semana, o Itamaraty divulgou discurso de Ernesto Araújo em Davos que apontou um apoio do Brasil à ação conjunta dos Estados Unidos, da União Europeia e do Japão para reverter práticas de concorrência desleal da China no âmbito do comércio internacional, especialmente na questão de subsídios, estatização e apropriação e tecnologia de empresas privadas.
O ministro disse que o Itamaraty estará focado nas empresas brasileiras para moldar a relação não apenas com os Estados Unidos, mas com os demais países.
“O segredo é buscar as ideias do setor privado e criar plataformas para facilitar o desenvolvimento delas”, ressaltou. “As empresas sabem quais são os gargalos.”
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Araújo trabalha para que as embaixadas brasileiras atuem num maior entrosamento entre diplomacia e comércio, transformando-se em postos de negócios de empresas do País no exterior. Ele pretende fazer uma integração mais efetiva entre as embaixadas e consulados e os escritórios da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil).
“A Apex já está na estrutura do Itamaraty, mas precisa de uma maior integração”, ressaltou. “Vamos insuflar as embaixadas nas novas demandas, motivar mais as pessoas para ter novas ideias.”
Ao comentar a surpresa com os discursos e pronunciamentos incisivos do Itamaraty especialmente nas notas de ataque ao governo de Nicolás Maduro, na Venezuela, o ministro disse que a política vive um novo momento de interseção do País no exterior e demandas internas.
“O mundo vai mudando, não podemos repetir posições antigas”, afirmou. “Há dez anos, certas posições faziam sentido. Hoje não fazem mais. Temos de fazer pressão por mudanças, por uma atualização.”
Ele adianta que o tom incisivo será adotado nas disputas nos fóruns comerciais no exterior, sempre numa toada de negócio e com um toque brasileiro.
“A gente tem que estar sempre vivo, falar como a sociedade, afirmou. “Não podemos mais falar itamaratês.”
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Antes dos encontros preparatórios em Washington, o chanceler participará, em Ottawa, no Canadá, na segunda-feira, de reunião dos países do Grupo de Lima, criado por iniciativa do governo peruano, em 2017, para buscar uma solução pacífica para a crise na Venezuela.
O chanceler observou que a posição do governo brasileiro em relação ao governo do país vizinho, com um discurso mais duro, sinalizou a disposição do Itamaraty de se adaptar a uma nova realidade. Logo depois, a União Europeia e países latino-americanos tomaram posições mais incisivas.
“A gente assumiu uma posição firme que contribuiu muito para a pressão internacional”, afirmou. “As pessoas diziam que não era possível fazer nada. Podemos. É muito transformador quando você faz uma ação que traga esperança.”
Na entrevista, o chanceler não escondeu sua visão crítica à rotina e ao estilo muitas vezes “palaciano” do Itamaraty. Ele disse que é preciso promover a “ousadia” e incentivar a “criatividade” do corpo diplomático para aproximar a instituição também de outras pastas do governo envolvidas no comércio e na geração de emprego. Uma das primeiras medidas tomadas pelo ministro foi a criação de um departamento voltado ao agronegócio, que deverá atuar em parceria com a pasta da Agricultura, da ministra Tereza Cristina.
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As críticas incisivas do chanceler à predominância de acordos multilaterais e mesmo às práticas da Organização Mundial do Comércio (OMC) causaram, num primeiro momento, incômodo em setores da diplomacia. Ele avaliou que o choque é necessário num momento de concorrência ainda mais acirrada nos fóruns internacionais. O próprio diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, admitiu que o chanceler falou levando em conta os interesses brasileiros e a necessidade de priorizar acordos bilaterais que foram deixados de lado.
Ao mesmo tempo em que busca estreitar relações com mercados tradicionais, o chanceler avalia mudanças nas relações com a África. Neste caso, ele considerou que governos passados cometeram excessos de discursos e promessas.
“A África é um mercado potencial. Em alguns países, temos embaixadas muito pequenas, que precisam ser reforçadas. Em outros, não. É preciso identificar as prioritárias”, afirmou. Ele citou a abertura, recente, do mercado da Malásia para o “gado em pé” do Brasil. “Vamos conversar com cada país, ver as características específicas de cada um. Vamos ser mais produtivos, abrir mais mercados para nossos produtos.”