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Segundo Lúcio Funaro, Eduardo Cunha tinha na mão vários deputados para quem intermediava propina, mas parte do dinheiro também seria destinada a Michel Temer. | Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Segundo Lúcio Funaro, Eduardo Cunha tinha na mão vários deputados para quem intermediava propina, mas parte do dinheiro também seria destinada a Michel Temer.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O corretor Lúcio Funaro, que está preso em Brasília e teve seu acordo de colaboração premiada homologado pelo ministro Edson Fachin, do STF, prestou depoimento à Procuradoria-Geral da República em 23 de agosto e fez várias afirmações envolvendo empresários e políticos, incluindo o atual presidente da República, Michel Temer. O vídeo com o depoimento foi obtido pelo jornal Folha de S.Paulo. Pelas regras da colaboração premiada, apenas o depoimento é insuficiente como prova; o colaborador precisa entregar outras evidências para apoiar o que diz às autoridades. Veja a seguir cinco afirmações do corretor sobre Michel Temer e sobre o chamado “quadrilhão do PMDB”:

1. A “equipe” de Temer

Quando explodiu o conteúdo da delação de Claudio Melo Filho, ex-executivo da Odebrecht, ainda no ano passado, apareceu o nome de José Yunes, amigo de Michel Temer e então assessor especial da Presidência da República. Segundo Melo Filho, parte do dinheiro que teria sido pedido por Temer a Marcelo Odebrecht para a campanha do PMDB em 2014 teria sido entregue diretamente a Yunes – que deixou o cargo no governo após a divulgação da delação. Mas, segundo Lúcio Funaro, Michel Temer não concentrava as negociações em uma única pessoa de confiança. Além de Yunes, Temer teria outros operadores que intermediariam pagamentos. Funaro diz ter certeza absoluta da participação do ex-deputado Eduardo Cunha e de Wager Rossi, que foi ministro da Agricultura nos governos Lula e Dilma, mas também citou João Baptista Lima Filho, coronel aposentado da PM de São Paulo, e o ex-deputado paranaense Rodrigo Rocha Loures, flagrado recebendo da JBS uma mala com dinheiro que seria destinado a Temer.

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2. Cunha e Temer

Funaro disse à PGR nunca ter entregue dinheiro dos esquemas de Eduardo Cunha a Michel Temer, mas apontou um emissário do ex-deputado, Altair Alves Pinto, dizendo que ele deve ter feito isso “algumas vezes”. O delator disse que a proximidade entre o seu escritório e os de Temer e José Yunes em São Paulo facilitava tudo. “O cara saía com a mala, ia andando meia quadra e já estava no escritório dele, não tinha problema nenhum”, disse Funaro. Ele fez, no entanto, uma ressalva: Temer nunca pegou dinheiro pessoalmente, mas teria conhecimento do esquema.

3. A MP dos Portos

Em 2012, a então presidente Dilma Rousseff publicou a Medida Provisória 595/2012, conhecida como “MP dos Portos” e que tinha o objetivo de modernizar o setor portuário brasileiro facilitando a atuação da iniciativa privada. A tramitação da MP foi tumultuada, e o Senado só a aprovou faltando poucas horas para que ela caducasse. Lucio Funaro disse à PGR que o texto original da medida provisória prejudicaria o grupo Libra, doador de campanha de Michel Temer. A empresa tinha débitos fiscais que a impediriam de renovar suas concessões no Porto de Santos (SP), descrito por Funaro como “área de influência” de Michel Temer; por isso, Eduardo Cunha inseriu na MP uma cláusula permitindo essa renovação, sob certas condições – esse trecho acabou ficando na lei sancionada por Dilma. Além disso, outros pontos da MP teriam sido trabalhados para favorecer outras empresas, que em troca fizeram doações de campanha oficiais. Funaro disse não ter conhecimento de outros tipos de repasses, e acrescentou que foi Eduardo Cunha quem lhe disse que teria havido interferência de Temer na tramitação da MP dos Portos.

4. Cunha era “o cara”

Lucio Funaro ainda ajudou a compreender por que tantos deputados relutavam em bater de frente com Eduardo Cunha, mesmo depois que as acusações contra ele ficaram mais volumosas e consistenes: o presidente da Câmara tinha vários parlamentares na mão. Funaro descreveu Cunha como um “banco de corrupção de políticos”: “todo mundo que precisava de recursos pedia para ele, e ele cedia. Em troca, mandava no mandato do cara”, disse o corretor à PGR – ele ainda acrescentou que Cunha nem precisava procurar deputados interessados em entrar no esquema: “Fazia fila de gente atrás dele”. Na divisão de propinas da Caixa Econômica Federal, a maior parte do bolo ficava com o então vice-presidente de Pessoa Jurídica do banco, Geddel Vieira Lima (que depois virou ministro de Temer e foi preso em julho e em setembro deste ano, após a apreensão de R$ 51 milhões em um apartamento em Salvador) ; de 35% a 40% iam para Funaro e Cunha dividirem de acordo com a necessidade do momento.

5. Joesley estaria no esquema

O empresário Joesley Batista, dono da J&F, controladora do frigorífico JBS, também entregou dinheiro de propina a Lucio Funaro. O delator disse que o objetivo de Joesley seria conseguir que o FI-FGTS, um fundo que usa recursos do Fundo de Garantia para investir em projetos de infraestrutura, colocasse dinheiro na Eldorado Celulose, uma das empresas da J&F. “Eu tinha uma conta interna com ele”, disse o corretor à PGR. Os pagamentos seriam feitos por meio de notas fiscais, boletos de supermercado ou por intermédio de doleiros. O dinheiro iria para Eduardo Cunha, que o repassaria a outros líderes do PMDB. Entre os destinatários do dinheiro da J&F Funaro citou, novamente, o presidente Michel Temer, além do ex-ministro Henrique Eduardo Alves, preso em junho por acusações de fraude em um dos estádios da Copa do Mundo.

Funaro também confirmou que o dono da J&F ficou responsável por comprar o seu silêncio na cadeia. O delator revelou que assinou um contrato fictício de R$ 100 milhões com o dono do frigorífico para esquentar notas frias que ele já havia emitido para uma empresa do grupo, a Eldorado. Como o contrato tinha de parecer mais antigo, caso fosse submetido a uma perícia da Polícia Federal, ele e Joesley assinaram e rasgaram os originais, ficando só com cópias - porque “com o xerox a PF não tinha como” atestar a data da assinatura. Foi com base nesse contrato, que também embutia um serviço prestado à JBS e ao grupo Bertin, segundo Funaro, que Joesley começou a lhe pagar quantias mensais depois que ele foi preso, em julho do ano passado.

Outro lado

O Palácio do Planalto nega as acusações de que Michel Temer tenha atuado na compra da MP dos Portos, afirmando que em 2013 ele era vice-presidente da República e, portanto, “não era responsável pelas tramitações no Congresso Nacional”. A assessoria ainda nega qualquer relação de Temer com as empresas Rodrimar, Libra e Eldorado, e que ele tenha qualquer relação pessoal com Lúcio Funaro. “Se esteve com ele, foi de maneira ocasional e, se cumprimentou, foi como cumprimentaria milhares de pessoas”, diz resposta encaminhada pela Presidência. Referindo-se ao grupo de Eduardo Cunha, a nota diz que “o presidente Michel Temer não fazia parte da bancada de ninguém” e que “toda e qualquer afirmação nesse sentido é falsa”. Sobre as acusações de que teria comprado imóveis da construtora Yuny (de José Yunes) com dinheiro proveniente de propina, a assessoria do Planalto afirma que “todos os imóveis do presidente Michel Temer foram adquiridos com recursos próprios e declarados no Imposto de Renda”.

O advogado de Yunes, José Luis Oliveira Lima, disse, em nota, que “Lúcio Funaro já faltou com a verdade em inúmeras oportunidades”. “José Yunes, ao contrário de Funaro, goza de credibilidade. Tão logo esses fatos ficaram públicos, procurou a PGR e prestou todos os esclarecimentos devidos”, afirmou o defensor. “Yunes teve seus argumentos acolhidos pelo Ministério Público, tanto que jamais foi denunciado, mas sim arrolado como testemunha de acusação. É importante registrar que Funaro será processado por denunciação caluniosa pelo meu cliente”, disse Lima.

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