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Ricardo Boechat comanda debate com presidenciáveis, em outubro de 2018: velório do jornalista seria realizado no Museu da Imagem e do Som, em São Paulo. | Kelly Fuzaro/ Divulgação Band
Ricardo Boechat comanda debate com presidenciáveis, em outubro de 2018: velório do jornalista seria realizado no Museu da Imagem e do Som, em São Paulo.| Foto: Kelly Fuzaro/ Divulgação Band

Em 2001, colunista do jornal O Globo e comentarista no Bom Dia Brasil, na Globo, Ricardo Boechat foi grampeado em conversa telefônica com o empresário Paulo Marinho, descrevendo uma reportagem que preparava para o jornal.

Nela, questionava o empresário Daniel Dantas, então em disputa com o empresário Nelson Tanure, ligado a Marinho. O grampo foi divulgado pela revista Veja, e Boechat foi demitido pelas Organizações Globo, hoje Grupo Globo.

O que poderia ser o fim de sua carreira se provou o contrário. Começou ali a trajetória que o tornaria popular em todo o país, por meio de veículos como a rádio BandNews FM, onde ancorava um programa matinal, e o Jornal da Band. Estava no Grupo Bandeirantes havia 15 anos. Ricardo Boechat, 66, morreu após a queda de um helicóptero em São Paulo nesta segunda-feira (11).

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Tendo começado no carioca Diário de Notícias nos anos 1970 e trabalhado por 14 anos produzindo notas para o colunista Ibrahim Sued, seu mentor, Boechat nunca quis deixar o jornalismo impresso e assinou até esta semana uma coluna de notas na revista IstoÉ.

Por seu trabalho, levou três vezes o extinto Prêmio Esso e é descrito como o maior vencedor do Prêmio Comunique-se. Mais recentemente, tornou-se celebridade a ponto de ser chamado para fazer voz numa animação da Disney, “Zootopia”.

Algumas de suas manifestações na rádio se transformaram em memes antológicos. Em 2015, por exemplo, ele questionou a intolerância religiosa que havia levado à agressão de uma menina de 11 anos. O pastor Silas Malafaia tuitou que era “asneira” e Boechat, “idiota”.

“Ô, Malafaia, vai procurar uma rola”, respondeu Boechat no ar. “Não me enche o saco. Você é um pilantra, tomador de grana de fiel, explorador da fé alheia. Você é um homofóbico, uma figura execrável, horrorosa. Não tenho medo de você, não, seu otário.”

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O pastor processou Boechat. Numa audiência de conciliação, os dois fizeram um acordo, e o jornalista retirou o que disse em seu programa. No dia, Malafaia escreveu no Twitter: “Ricardo Boechat, em seu pgm de hj na Band, retirou as palavras q feriram a minha honra. Independente d justiça, isso mostra a sua grandeza”.

Nesta segunda-feira, Malafaia desaprovou fiéis que, ao lembrarem dessa briga, trataram a morte do jornalista como uma punição divina. “Não trabalho com um Deus que se vinga porque alguém me xingou. Então tinha que morrer um monte aí, sou caluniado a todo momento”, disse o pastor. “Só posso pedir que Deus console sua família, a perda não e uma coisa fácil pra ninguém”, completou.

Autêntico e espontâneo

O jornalista nasceu em 1952 em Buenos Aires, na Argentina, filho do diplomata Dalton Boechat e da argentina Mercedes Carrascal. No início da carreira, viveu em Niterói, onde ainda mora a mãe, de 86 anos, que se tornou conhecida da audiência.

Ele contava das broncas que levava de “Doña Mercedes”, por coisas que falava da rádio. E chegou a ligar para ela, no ar, para que ajudasse a esclarecer se ele havia traduzido corretamente a palavra “taller”, oficina em espanhol.

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Boechat tornou-se um personagem que os ouvintes aprenderam a “amar”, na descrição do colunista da Folha José Simão, que conversava com ele todas as manhãs, há uma década. Além da mãe, citava constantemente a mulher, “minha doce Veruska”. “O Boechat era um vulcão”, descreve Simão. “Tinha pensamento próprio, falava o que estava na cabeça. Era o que ele imaginava, o que sentia na hora. E muito engraçado. Era um gozador. Carioca da gema.”

A jornalista Mônica Bergamo também conversava pelas manhãs com Boechat e recorda: “A coisa mais desafiadora do mundo era entrar no ar com ele. Era muito difícil para os colunistas, porque ele contestava no ar. Não tinha esse negócio de encher a bola”.

Passado comunista do “Jacaré”

Ambos e outros enfatizavam a independência que o caracterizava. Ele havia sido membro do Partido Comunista Brasileiro e, quando da morte de Fidel Castro, deixou escapar seu respeito pelo líder cubano no ar.

Mas, de maneira geral, desde a saída das Organizações Globo, atacava sem distinguir partido. Até Jair Bolsonaro começar a ganhar proeminência, falavam-se constantemente e o futuro presidente o tratava pelo apelido de Jacaré.

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Mas, quando Bolsonaro votou pelo impeachment dizendo ser em “memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff”, Boechat questionou a “barbaridade” no Jornal da Band, onde geralmente se mostrava mais contido:

“Torturadores não têm ideologia. Torturadores não têm lado. Torturadores são apenas torturadores. É o tipo humano mais baixo que a natureza pode conceber. São covardes, são assassinos e não mereceriam, em momento algum, ser citados como exemplo.”

“Brasil perde um grande homem”

Em nota, o Grupo Bandeirantes disse lamentar “o súbito falecimento do jornalista” que “além de um profissional muitíssimo conceituado, premiado e admirado, o Brasil perde um grande homem, pai de seis filhos, avô e amado esposo. Estamos todos, funcionários e colaboradores, muito tristes e abalados com esta trágica notícia.”

“O jornalismo e o Brasil perderam hoje uma referência insubstituível. E nós, do Grupo Band, perdemos um amigo e profissional que jamais esqueceremos”, disse, em nota, João Carlos Saad, presidente do Grupo Bandeirantes.

Ricardo Boechat era casado com Veruska Boechat e deixa seis filhos. Beatriz, 40, Rafael, 38, Paula, 36, e Patricia, 29, de seu primeiro casamento com Claudia Costa de Andrade, e duas meninas de 12 e 10 anos, do casamento com Veruska. O velório do jornalista será realizado no Museu da Imagem e do Som, em São Paulo.

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