Com o decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) facilitando a posse de armas, a Taurus deve ser, por enquanto, a empresa beneficiada com a medida. A companhia é a principal fabricante e vendedora de armas em atuação no país e, devido às legislações vigentes, tem uma espécie de “reserva de mercado”, principalmente para pistolas, que só pode ser quebrada com autorização do Exército e do governo.
A companhia só terá sua hegemonia ameaçada se Bolsonaro cumprir a sua promessa de campanha: “quebrar o monopólio da Taurus”. Durante o período pré-eleitoral, ele afirmou que modificaria a legislação vigente para abrir o mercado a empresas estrangeiras, tanto para a venda para o setor público quanto para o varejo (consumidor final).
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“Se eu estiver no poder não vai ter monopólio (...) Quero que venda arma da Taurus, mas não com monopólio”, disse em entrevista ao jornal Valor Econômico em junho. Porém, depois de eleito, Bolsonaro ainda não retornou ao assunto.
Por que a Taurus tem uma espécie de monopólio
Oficialmente, a Taurus não tem monopólio. Mas a companhia privada conseguiu o domínio do mercado brasileiro graças às legislações vigentes que permitem uma espécie de “reserva de mercado” às fabricantes nacionais de armamento e munições.
Segundo o artigo 190 do Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados pelo Exército (R-105), o “produto controlado que estiver sendo fabricado no país, por indústria considerada de valor estratégico pelo Exército, terá sua importação negada ou restringida, podendo, entretanto, autorizações especiais ser concedidas, após ser julgada a sua conveniência”. Entre os produtos controlados pelo Exército estão armas e munições.”
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Além do R-105, há uma portaria do Ministério da Defesa que também dá preferência a produtos fabricados no Brasil. “A importação de produtos controlados poderá ser negada, quando existirem similares fabricados por indústria brasileira do setor de defesa”, diz o artigo 5.º da portaria nº 620, de 4 de maio de 2006. A regra só é quebrada na impossibilidade de atendimento por parte de uma empresa nacional e caso “caracterizada a urgência ou relevância da operação”.
A Taurus também é considerada uma Empresa Estratégica de Defesa (EED) e têm preferência em processos licitatórios.
E não há outras fabricantes nacionais?
No Brasil, as únicas fabricantes credenciadas a produzir e vender pistolas calibres 9 mm, ponto 40 e ponto 380, segundo documentos da Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (Abimde), são a Taurus e a Imbel. A estatal Imbel, porém, tem um portfólio menor do que o da Taurus e, para alguns casos, como de alguns modelos de pistolas convencionais e semiautomáticas, a Taurus tem exclusividade na fabricação.
Outra fabricante autorizada a produzir armas no Brasil, segundo o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (SIGMA), é a E.R. Amantino. Mas ela vende somente espingardas e carabinas, atendendo ao mercado de armas esportivas. Mesmo caso da Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), que é dona da Taurus.
Companhias estrangeiras querem entrar no Brasil
Há, porém, um movimento de companhias estrangeiras para entrar no Brasil, principalmente para vender pistolas. O processo, contudo, é burocrático e precisa da autorização do Exército e do governo. Ou seja, não é um mercado livre. As empresas estrangeiras que querem entrar no país são a Caracal, dos Emirados Árabes, a CZ, da República Tcheca e a Glock, da Áustria.
A Ruag, da Suíça, chegou a conseguir autorização durante o governo Michel Temer (MDB) para se instalar no Brasil, sendo a primeira empresa estrangeira a quebrar a barreira legislatória e conseguir isso. A autorização foi emitida em maio de 2017. Contudo, ela desistiu de seu plano de erguer uma fábrica em Pernambuco.
Por ser uma empresa de controle estatal, o governo suíço acabou vetando o projeto sob a justificativa que a instalação de uma fábrica no Brasil representaria uma risco para a reputação da Suíça.
O decreto de Bolsonaro, contudo, frustrou as empresas estrangeiras. “Não mudou nada para nós importadores”, disse à Folhapress Hugo de Paula, que representa a tcheca CZ no país. Segundo o executivo, o setor ainda tem expectativas de que virá uma abertura maior aos fabricantes estrangeiros nos próximos meses.
Como quebrar o ‘monopólio’ da Taurus
Apesar de não haver empresa estrangeira fabricando arma no Brasil, é possível “quebrar o monopólio” da Taurus e importar armas usando algumas brechas na lei. O poder público tem conseguido isso, principalmente depois dos casos registrados de falhas das armas da Taurus.
A Polícia Federal (PF) e as polícias dos estados do Paraná, do Distrito Federal e do Ceará são alguns exemplos que já conseguiram autorização para importar armas estrangeiras. As justificativas utilizadas vão deficiências técnicas e de segurança das armas da Taurus a preço mais baixo e urgência em receber os equipamentos. A PF utiliza desde 2003 pistolas Glock calibre 9mm.
Às vésperas do decreto, Taurus muda de nome
Na segunda-feira (14), um dia antes de Bolsonaro assinar o decreto que facilita a posse de armas, a Taurus mudou o nome da companhia: de Forjas Taurus para Taurus Armas. Segundo comunicado da empresa, a mudança se deu porque a companhia não atua mais com forjaria e porque quer focar “no seu principal negócio, a produção e venda de armas”.
A companhia foi fundada em 1939 como uma forjaria e a partir das década de 1940 passou a fabricar armas de fogo. Tem ações listadas na Bolsa e fabrica armas custas, longas e submetralhadoras. Vende para o Brasil e para o exterior, principalmente para os Estados Unidos. No Brasil, atende, majoritariamente, o setor público, fornecendo pistolas e fuzis, quem mais demandava esses tipos de armas até então.
Ações da empresa sofrem queda após decreto: realização de lucros
Apesar de a empresa ter um horizonte positivo graças ao decreto, as ações da Taurus sofreram uma queda aguda após o anúncio de Bolsonaro. Entre as 12h50 e as 13h41 desta terça (15), os papéis da empresa tiveram uma queda de 25,8%, chegando ao mínimo de R$ 6,80. Fecharam o pregão a R$ 7,40, uma retração de 16,85% em relação ao pregão anterior. Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o movimento é normal, de realização de lucros: nos últimos meses, os papéis quase quaduplicaram de valor.
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