Em novembro passado, Roberto Campos Neto deixava o banco onde trabalhou por 18 anos para outro. De diretor do Santander, ascendeu para a presidência de nada menos que o Banco Central. Aos 49 anos, já em dezembro de 2018, foi oficialmente anunciado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro para o posto antes ocupado por Ilan Goldfajn .
Havia cerca de quatro meses, Campos Neto dividia-se entre as atribuições no Santander e reuniões capitaneadas por Paulo Guedes sobre o programa de governo de Bolsonaro. A relação com Guedes era antiga. Conhecera o economista ainda garoto por intermédio de seu avô, Roberto Campos, ex-ministro do Planejamento do marechal Castelo Branco e economista que se tornou referência para liberais brasileiros.
Fiel seguidor do ideário liberal, Guedes era admirador declarado de Campos, que o enxergava como expoente entre a geração mais jovem de economistas. Os dois mantinham contato frequente. Valiam-se de caminhadas pela praia no Rio de Janeiro para debater ideias. Campos Neto conheceu Guedes nesses tempos, mas ficou muitos anos sem se encontrar com o amigo do avô.
Trader
Nascido e criado no Rio, deixou a cidade para cursar a faculdade na Universidade da Califórnia, onde se formou em economia e emendou nos estudos de mestrado na mesma instituição. Encerraria a trilha acadêmica ali, atraído pela expectativa de emprego no mercado financeiro.
A primeira vaga veio no banco Bozano, Simonsen, em meados da década de 1990. Tornou-se “trader”, jargão usado para classificar quem faz operações no mercado. No seu caso, operava com derivativos, juros e ações.
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Quando o Bozano foi comprado pelo Santander, em 2000, Campos Neto lá permaneceu, percurso interrompido apenas por um breve período em 2004, quando, após rusgas internas, foi trabalhar no fundo Claritas. Um ano depois, recebeu convite para voltar. Aceitou.
A ascensão no banco espanhol não foi meteórica, mas consistente. Aos poucos, foi galgando postos. Chefiou áreas como renda fixa internacional e, em 2010, passou a liderar a mesa de formação de mercado da tesouraria. Por fim, tornou-se diretor da área nas Américas, um cargo de grande importância na estrutura global do banco espanhol.
Simplicidade
Colegas classificam Campos Neto como um executivo de fácil trato e extremamente reservado. Essa característica é reforçada por amigos, que conversaram com o Estado sob condição de anonimato. Eles descrevem um executivo sem hábitos extravagantes e fanático por esportes.
Ex-praticante de jiu-jítsu, manteve o hábito de correr e jogar tênis. Forma de aplacar a tensão da mesa de operações, tornou-se algo inegociável e que beira a compulsão, brinca um colega que se recorda de vê-lo semanas a fio com a perna imobilizada após ter engrenado, numa mesma manhã, quilômetros de corrida, uma série de musculação e horas seguidas de aulas de tênis.
Casado há cerca de 12 anos com uma advogada e pai de duas crianças, Campos Neto preserva o sotaque carioca, mas divide-se com a família entre a rotina num condomínio paulistano, fins de semana em sua casa no Guarujá e temporadas em Miami, onde vive um de seus irmãos e parte da família de sua mulher. Neste ano, acrescentará nova escala, passando a semana em Brasília. Não pretende se mudar, por ora, para a capital.
Há alguns anos, Campos Neto resolveu se dedicar a estudos sobre inovação. O interesse o levou a um curso de imersão na Singularity University, no Vale do Silício, e ele se prepara agora para se unir a um grupo de estudo sobre o tema na Universidade Stanford.
Desde o ano passado, porém, boa parte de seu tempo livre passou a ser ocupado por temas de governo. Campos Neto não era um bolsonarista apaixonado, mas um liberal convicto, nota uma pessoa próxima. Costumava reclamar amiúde do tamanho do Estado e da ingerência do governo nos negócios.
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Havia se reaproximado de Paulo Guedes, com quem manteve contatos esporádicos ao longo dos anos, e decidiu que iria contribuir no projeto eleitoral que o economista encampasse. Quando Guedes acertou-se com Bolsonaro, Campos Neto não titubeou em aderir. Contribuiu com ideias e, já no segundo semestre de 2018, passou a voar todas as quartas-feiras ao Rio para participar das reuniões do núcleo duro de Guedes, que se tornaria o superministro da Economia. Desse grupo saíram alguns dos principais nomes do novo governo, como Rubem Novaes para o Banco do Brasil e Roberto Castello Branco para a Petrobrás, entre outros.
Na campanha, Campos Neto dedicou-se à elaboração do capítulo sobre mercado de capitais, competição e crédito. Já nas reuniões da transição, no CCBB de Brasília, compunha o time que aconselhava em diversas frentes, até mesmo na formatação da reforma da Previdência.
Uma fonte próxima a Campos Neto diz que ele sempre teve interesse na presidência do Banco Central, apesar de nunca ter condicionado sua contribuição durante a campanha a cargos no governo. Um dos integrantes do time próximo de Guedes conta que, já na reta final da eleição, havia uma “grande tendência” de ele ser o indicado para BC. Ainda assim, houve conversas para que Ilan Goldfajn seguisse no cargo, o que acabou não acontecendo.
Mercado
A indicação de Campos Neto foi bem recebida pelo mercado. Ele não possui histórico acadêmico ou “teórico”, mas é visto como um executivo muito preparado e com longa experiência de “macroeconomia na prática”, diz um investidor.
Um ex-presidente do Banco Central observa que, por ter trajetória como “trader”, o perfil de Campos Neto difere dos últimos chefes da autoridade monetária. Um executivo do mercado financeiro nota que Campos Neto pega o banco num momento “muito mais tranquilo” do que seu antecessor, com juros sob controle e credibilidade restaurada e espera-se a continuidade de políticas já adotadas.
Desde dezembro, Campos Neto passou a estudar freneticamente, diz uma pessoa próxima. Em janeiro, enviou sua família a Miami e permaneceu no Brasil, dedicado às reuniões preparatórias com integrantes da equipe econômica e preparando-se para a sabatina no Senado, prevista para o dia 26. Quer estar afiado quando entrar pela primeira vez para o início do expediente na sede do Banco Central.
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