Membros do governo e o próprio Michel Temer – o primeiro presidente a ser denunciado no exercício do cargo – são suspeitos de envolvimento em esquemas de corrupção. A segunda denúncia contra o presidente chegou nesta quinta-feira (21) à Câmara dos Deputados.
É pouco provável, no entanto, que problemas como esses ou uma eventual pressão popular – algo que não se viu em nenhum momento desde a posse de Temer – possam enterrar o governo. O Congresso pode até usar a corrupção e a pressão popular como pretextos, caso algum dia queira derrubar o presidente, mas não quer dizer que os leve a sério.
O que realmente mobiliza a maioria dos deputados e senadores são questões de outra natureza. Que se desenrolam nos subterrâneos de Brasília. Essas, sim, parecem capazes de inviabilizar a gestão Temer – embora não necessariamente de encerrá-la.
Duas dessas questões vieram à tona nesta semana. São episódios de desentendimento do governo com aliados. Coisas que parecem miudezas para o público, mas que valem muito para os parlamentares, como já ficou provado no impeachment de Dilma Rousseff – crime de responsabilidade à parte, o que pesou mesmo para sua deposição foi o descuido no trato com o Congresso e no atendimento das demandas comezinhas de deputados e senadores.
1) O DEM está chateado
O DEM – partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia – está chateado com o que classifica de tentativa de ministros do governo de enfraquecer a legenda. Na quarta-feira (20), enquanto ocupava interinamente a presidência da República, Maia disse que seus colegas de partido estão revoltados com o assédio do PMDB sobre parlamentares do PSB que o DEM tentava atrair. E que eles poderão votar contra propostas do governo.
Maia se queixou de que a ofensiva do PMDB contou com a participação dos ministros Eliseu Padilha e Moreira Franco, e acusou Temer de não cumprir com a palavra quando assegurou que o PMDB não tentaria cooptar egressos do PSB.
“Se é assim que querem tratar aliados, não sei o que é ser adversário! Que fique registrado. Se depois a bancada do Democratas estiver em alguma votação numa posição divergente do governo, espero que o governo entenda. Entenda que há uma revolta grande na nossa bancada”, disse Maia.
Horas depois, ele participou de um jantar que reuniu críticos do governo como os senadores peemedebistas Renan Calheiros (AL), Kátia Abreu (TO) e Eduardo Braga (PMDB). Na quinta (21), Maia se encontrou com João Doria (PSDB) e rasgou elogios ao prefeito paulistano: “Com certeza apoiaríamos Doria para a Presidência”, cravou.
Depois de tudo isso, Maia garantiu que a revolta de seu partido não será descontada na votação da denúncia contra Temer. “Não vamos misturar uma coisa tão grave, que é a denúncia, com um problema que envolve dois partidos e parte do Planalto”. Outros demistas foram bem mais duros e disseram que a retaliação pode, sim, ocorrer já na apreciação da denúncia.
2) O governo não quer dar mais benesses
Outro motivo de atrito entre o governo e seus aliados é que o Ministério da Fazenda não aceita as benesses que os parlamentares querem conceder a devedores da União na enésima edição do “Refis”.
A história começou meses atrás, quando o governo editou uma medida provisória criando mais um programa de parcelamento de dívidas com a União. A expectativa era arrecadar R$ 13 bilhões. No Congresso, a MP foi desfigurada. O texto original previa perdão de 25% a 90% de multas, juros, encargos legais e honorários administrativos, mas o relator da proposta – deputado Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG), um dos maiores devedores da União – propôs descontos de 85% a 99%, que reduziriam a arrecadação a apenas R$ 400 milhões.
Enquanto governo e parlamentares não chegavam a um acordo para votar a MP e convertê-la em lei, contribuintes foram aderindo ao programa dentro das condições estipuladas pelo governo. Circulam pelo Congresso informações de que a Fazenda já teria arrecadado algo entre R$ 6 bilhões e R$ 9 bilhões com o novo Refis. E que, safisfeito, o ministro Henrique Meirelles não teria mais interesse em aprovar a MP.
A “bancada do Refis” se enfureceu. Segundo o jornal “Valor Econômico”, ao saber que a Fazenda pretende deixar a MP caducar, o líder de um grande partido da base disse que “aí cai o governo”. “O presidente terá que decidir. A opção é política ou financeira”, disse outro grande devedor, o deputado Alfredo Kaefer (PSL-PR).
Não é com pouca gente que o governo está mexendo. Nada menos que 114 deputados federais e 25 senadores têm débitos inscritos na Dívida Ativa da União. Além disso, 273 deputados e 25 senadores receberam doações eleitorais de empresas ou pessoas físicas que devem à União.
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