O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) recebeu na tarde desta quinta-feira (22) o procurador do Distrito Federal Guilherme Schelb, cotado para assumir o Ministério da Educação. O encontro ocorreu na Granja do Torto, uma das residências oficiais da Presidência da República, e durou quase três horas.
Ele deixou o local próximo às 17 horas e negou que tenha sido convidado por Bolsonaro. De acordo com o procurador, a possibilidade de um segundo encontro ficou em aberto. Schelb não quis dizer se aceitaria deixar a carreira no Ministério Público Federal para assumir o cargo no Executivo, caso o convite seja feito.
“Foi uma conversa de apresentação onde eu pude expor ao presidente Bolsonaro a minha análise sobre as questões centrais da educação brasileira que devem ser enfrentadas com a máxima urgência”, disse.
Após reação de evangélicos à indicação de Mozart Ramos para a pasta da Educação, na quarta-feira (21), o presidente eleito disse que o ministério não estava definido e anunciou que conversaria com Schelb nesta quinta. O gesto é um aceno à bancada evangélica, que apoia a indicação dele para o cargo.
Schelb disse ter defendido a Bolsonaro, no encontro, o cumprimento das leis para que o professor tenha segurança jurídica e para que haja segurança nas escolas. O procurador criticou a educação sexual nas escolas, bandeira evangélica e defendida pelo eleito.
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Defensor do projeto Escola Sem Partido, em discussão na Câmara, ele disse que a medida não seria necessária se houvesse cumprimento das leis. “Sala de aula não é uma masmorra. Sala de aula tem que ser transparente. Nós queremos transparência e democracia”, afirmou.
Segundo ele, os professores descumprem as leis, não por maldade, mas muitas vezes por desconhecimento. “No nosso contexto atual, os ativistas que utilizam a sua posição de professor para fazer doutrinação são todos da esquerda, isso é um fato. O escola sem partido é a previsão de respeito aos alunos e aos professores e proíbe qualquer proselitismo, de conservador, de esquerda, de direita, de religioso”, afirmou.
Ele disse que professores também não devem utilizar a sala de aula para manifestar aos alunos sua fé. O procurador é evangélico da Igreja Comunidade das Nações e próximo ao pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo.
Bancada evangélica vê procurador com bons olhos
Malafaia é amigo de Bolsonaro e defendeu a indicação do procurador para o cargo. “O Guilherme Schelb encarna o pensamento ideológico dessa bancada [evangélica]. Por isso que ele tem o apoio lá de quase todos”, disse o pastor.
O procurador conta também com a simpatia do deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), um dos líderes do grupo de parlamentares. “Não fomos consultados ainda. É um nome que agrada, mas se quiserem que a gente avalie se agrada, temos que nos reunirmos. Com quem eu converso eu tenho ouvido que ele é alinhado com o que a gente quer”, afirmou à Folha.
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Na quinta, Sóstenes reagiu à divulgação de notícias sobre a indicação de Mozart, que é diretor do Instituto Ayrton Senna, afirmando que ele é ‘esquerdista’. Bolsonaro tinha um encontro marcado com o educador nesta quinta, mas houve um cancelamento após a reação dos evangélicos.
O deputado pastor Marco Feliciano (Pode-SP) disse que o procurador tem o ‘perfil que a bancada sonha’. “Schelb tem o perfil que o presidente queria. O perfil do presidente é o perfil que a bancada sonha, um perfil conservador, uma pessoa que tenha cultura. Ele [Schelb] é preparado intelectualmente e nos agrada muito. E é de confissão evangélica. Teve inúmeros debates aqui na Câmara sobre erotização precoce, é muito bem preparado. E é ideologicamente afinado com a gente e com o presidente”, afirmou.
Schelb foi alvo de processo por incentivar censura
O procurador Guilherme Schelb foi alvo de procedimento administrativo do Ministério Público Federal (MPF), no ano passado, por compartilhar um modelo de notificação extrajudicial na internet contra professores que ensinam temas sobre sexualidade e gênero nas escolas. Em nota técnica, publicada em 2017, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) considerou o conteúdo inconstitucional.
No texto, o MPF também deixa claro que Schelb divulgou o material “em atividade privada não apoiada pelo Ministério Público Federal -–instituição constitucionalmente comprometida com a promoção da igualdade de gênero e da orientação sexual e contrária a quaisquer formas de preconceito”.
Mesmo sem apoio da instituição, Schelb chegou a criar um nome para o que chamou de programa: “Proteger - Programa Nacional de Prevenção da Violência e Criminalidade Infanto-Juvenil”.
Ele compartilhou modelo notificação dirigida a professores e diretores de escolas e afirmou que, caso “insistam” em apresentar conteúdos sobre sexualidade e gênero em sala de aula, poderão ser processados, com pena de até seis meses de prisão, perda de cargo público e indenização por danos morais. Ele cita como exemplo professores que buscam “relativizar os conceitos morais de masculinidade e feminilidade”.
“Se você é contra essas medidas ilegais e abusivas à infância e que desrespeitam a dignidade humana especial, em particular, a fragilidade humana psicológica diante desse quadro, apresento, no link abaixo, o modelo de notificação extrajudicial a ser apresentado ao diretor da escola de seu filho. Esse documento servirá de um alerta formal aos professores sobre normas que protegem as crianças de informações abusivas e, também, sobre os direitos da família na formação moral dos filhos”, diz Schelb em um dos trechos.
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No modelo de notificação, Schelb orienta os pais a vedarem, sob ameaça de processo judicial, temas relacionados a homossexualidade, bissexualidade e transsexualidade. Diz, ainda, que “a responsabilidade do dano moral será do professor ou direção da escola que permitir o acesso de aluno a material didático impróprio ou ministrar a aula com conteúdo indevido”.
Segundo a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Schelb incorreu em “erro básico” ao confundir ensino escolar com a educação transmitida no âmbito da comunidade e da família.
No ano passado, em audiência pública na Câmara dos Deputados, na comissão especial do projeto Escola Sem Partido, disse que professores estão descumprindo a lei ao expor alunos a materiais de conteúdo sexual, impróprio para a idade e capacidade de compreensão, muitas vezes em forma de livros e cartilhas.
“Muitos docentes são induzidos por políticas públicas que não respeitam a Constituição, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Penal ou o Código Civil. Outros são verdadeiros ativistas da erotização, ao incluir conteúdos de incentivo a práticas sexuais”, declarou na ocasião.