Diminuir o número de ministérios para melhorar o funcionamento do país foi uma das promessas de campanha de Jair Bolsonaro (PSL). Ainda em seu plano de governo, o pesselista dizia que a grande quantidade de pastas era ineficiente e não atendia aos legítimos interesses do país, além de representar o loteamento do Estado. Contra isso, o presidente eleito anunciou algumas junções de pastas. Mas criar superministérios torna o Estado mais eficiente? Não necessariamente – mas é um começo.
Enxugar a máquina pública é um desafio e tanto. E a redução de ministérios é um dos debates que passou a ganhar força – o país chegou a ter 39 pastas durante o governo de Dilma Rousseff, tem 29 atualmente e deve ficar com um número entre 15 e 19 a partir do próximo ano. Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo concordam que a medida é importante no sentido de racionalizar a administração e abrir espaço para a busca por eficiência. Mas esse tipo de medida, por si só, é insuficiente para reduzir as despesas públicas substancialmente.
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Estrutura paquidérmica
Se outros países conseguem manter a estrutura administrativa com menos ministérios, por que seria diferente no Brasil? Para a professora de economia do Insper Juliana Inhasz, a criação de superministérios, como proposto por Bolsonaro, cria um ambiente para que se tenha mais eficiência do Estado. Mas é preciso de outras condições que vão além da redução do número de pastas: é necessário cortar custos, enxugar a operação da máquina pública e estruturar os novos ministérios para que não haja pontas soltas.
“Para ter mais eficiência, esses ministérios em conjunto precisam ser mais proveitosos e ter mais sinergia do que temos hoje. Se criar ministérios e deixarmos assuntos pendentes, podemos ter ineficiência, porque você terá uma estrutura mais enxuta, mas ainda custosa”, analisa.
Para Gil Castello Branco, economista e secretário-geral da ONG Contas Abertas, a redução da quantidade de ministérios não tem como efeito principal reduzir despesas, mas sim racionalizar a máquina administrativa. “A meu ver, houve uma cultura que criou raízes de que é necessária a existência de um setor como ministério para que ele tenha prestígio. Isso é uma falácia”, avalia.
Ele aponta outras duas consequências desse excesso de pastas. A primeira é que não há condições de um presidente receber tantos ministros, que acabam despachando com algum outro representante. A segunda, e pior, é de que muitos estados e municípios acabam repetindo esse desenho de estrutura, por imaginar que isso poderia facilitar a obtenção de convênios e repasses. De certeza, há apenas o aumento generalizado do gasto público. “Essa estrutura é paquidérmica, corporativa, ineficiente e cara”, resume.
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Essa mudança de estrutura proposta também trará um novo efeito: a valorização da figura dos secretários dentro dos ministérios. Ainda que superministérios como o da Economia acomodem pastas com assuntos afins, a variedade e complexidade de cada setor vai acabar exigindo um interlocutor capacitado. “Quando você diminuiu de forma significativa a quantidade de ministérios, você terá de valorizar a função dos secretários e indicar pessoas que representem o setor. O cargo de secretário vai ter uma importância que não tinha”, aposta Castello Branco.
O peso do funcionalismo
Um dos gastos mais elevados do governo é com despesas de pessoal. Ainda que o novo governo opte pela junção de pastas e otimize o trabalho, os servidores concursados continuarão com seus empregos – mas há espaço para redução de gastos com cargos comissionados, funções com gratificação e gastos com aluguel de imóveis.
Em 2017, o governo federal gastou R$ 172 bilhões com a folha de pagamento de funcionários da ativa, aposentados e pensionistas. “As despesas com pessoal ativo e inativo são as maiores despesas da Administração Pública Federal, ficando atrás apenas das despesas com a Previdência e, entre 2015 e 2017, registraram crescimento de 17%”, diz um relatório elaborado pelo Ministério do Planejamento para a transição de governo. E o gasto total, considerando o pessoal civil e militar, deve crescer. O orçamento para esse ano prevê o gasto de R$ 241,8 bilhões. Em 2019, a previsão orçamentária salta para R$ 262,9 bilhões.
Para Juliana Inhasz, do Insper, o grande objetivo do governo será conciliar a redução de ministérios com a quantidade de funcionários públicos. Na visão dela, esses servidores devem ser absorvidos no lugar dos comissionados, que seriam dispensados.
A gestão de pessoas ganha papel fundamental. É preciso lidar com o estigma que recai, muitas vezes injustamente, sobre o funcionalismo. E também se acostumar com a administração pública impessoal, sem indicações políticas. O Ministério do Planejamento aponta, por exemplo, a necessidade de uma revisão da estrutura de carreiras, cargos e funções. Em 1990, eram cerca de 80 carreiras no Poder Executivo. Hoje, são mais de 300, com regramento e estrutura remuneratória distintos.
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O Banco Mundial, no relatório “Um ajuste justo”, lançado em 2017, já alertava para o peso da folha do funcionalismo público. “Os altos níveis de gastos são impulsionados pelos altos salários dos servidores públicos, e não pelo número excessivo de servidores. Isso se verifica principalmente na esfera federal, onde os salários são significativamente mais altos que aqueles pagos a servidores dos governos subnacionais, ou a trabalhadores em funções semelhantes no setor privado”, diz o texto.
O estudo aponta que seria necessária uma revisão das remunerações e promoções no setor público, visando equilibrar as contas e equiparar à realidade de mercado.
O novo orçamento
Se o enxugamento de ministérios sair como o planejado pela equipe de Bolsonaro, o Brasil passará por uma situação inédita. Além da mudança em termos de administração, é preciso ter atenção especial ao orçamento para 2019, que será definido ainda este ano, mas encontrará uma realidade ainda desconhecida com o novo governo.
Esse cenário de fusões e partições de ministérios vai exigir muita paciência da sociedade e mesmo do Congresso, principalmente porque a racionalização vai tomar forma com o passar do tempo. O mais preocupante para fins de orçamento é entender como a transferência de recursos entre as novas pastas vai acontecer. Um exemplo é o ensino superior, que hoje é administrado pelo Ministério da Educação e que pode passar para o de Ciência e Tecnologia.
Os parlamentares, que devem votar o orçamento até o final deste ano, precisarão pensar em soluções para esse tipo de situação. Para isso, também precisam de definição das junções por parte do governo Bolsonaro. “No Brasil, o curioso é isso: todo mundo critica a megaestrutura do governo, mas quando se fala em reduzir, os setores não aceitam”, aponta Castello Branco.
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