A denúncia veiculada pela revista Veja de que o presidente Michel Temer teria ordenado que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) – o serviço secreto brasileiro – investigasse o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e relator da Operação Lava Jato, Edson Fachin, causou indignação e perplexidade nos meios jurídico e político brasileiro nesta sábado (10).
Segundo a reportagem, a Abin foi acionada para tentar encontrar elos entre o ministro do STF e o empresário Joesley Batista, dono do grupo J&F, proprietário do frigorífico JBS. Fachin é responsável por conduzir no Supremo a investigação contra Temer aberta com base na delação premiada de Joesley, que apresentou gravação feita por ele próprio de conversa comprometedora com o presidente da República.
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A Procuradoria-Geral da República abriu inquérito contra Temer para apurar indícios de crimes como corrupção passiva, organização criminosa e obstrução da Justiça. A ação da Abin, coordenada pelo Palácio do Planalto, teria como objetivo buscar fragilidades que poderiam colocar em xeque a atuação de Fachin.
Leia a seguir oito reações geradas pela denúncia da revista:
Alessandro Molon, deputado federal (Rede-RJ)
O parlamentar vai propor a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados para apurar o suposto uso da Abin e de outras instituições com fins de “investigar e constranger ministro do Supremo Tribunal Federal e o procurador-geral da República, de maneira a obstruir as investigações da Justiça sobre crimes praticados pelo senhor presidente da República”. Se aberta, a CPI terá prazo de até 120 dias, prorrogável por mais 60 dias, para apresentar um relatório.
“A denúncia é gravíssima e revela, mais uma vez, que o presidente Temer está disposto a qualquer medida, mesmo que ilegal, para se proteger da Lava Jato. Temer não está preocupado com as necessidades do país, mas, sim, em usar o cargo para se proteger da investigação contra seus crimes”, afirmou Molon, em nota.
Claudio Lamachia, presidente da OAB
A Ordem dos Advogados do Brasil repudiou com veemência “qualquer investigação ilegal contra ministro do STF, especialmente quando articulada por agentes públicos que possuem o dever de salvaguardar o Estado de Direito”, segundo nota assinada por Lamachia.
“O Estado policial, próprio de ditaduras, sempre foi e sempre será duramente combatido pela OAB, em qualquer de suas dimensões, e, mais grave ainda, quando utilizado por órgão de investigação estatal com o fito de constranger juízes da Suprema Corte e subverter a ordem jurídica”, completa.
Para o presidente da Ordem, se a denúncia da Veja for confirmada, “estaremos diante de um ataque direto ao Estado Democrático de Direito”. “Não podemos aceitar que o Supremo Tribunal Federal seja vítima de arapongagem política. É preciso esclarecer os fatos e, se as acusações forem confirmadas, punir os responsáveis, pois ninguém está acima das leis e da Constituição da República.”
Cármen Lúcia, presidente do STF
A ministra afirmou, em comunicado oficial, ser “inadmissível” a possibilidade de um integrante do Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte do país, ser alvo de investigação da Abin. Cármen Lúcia disse que o STF “repudia, com veemência, espreita espúria, inconstitucional e imoral contra qualquer cidadão e, mais ainda, contra um de seus integrantes, mais ainda se voltada para constranger a Justiça”.
“Própria de ditaduras, como é esta prática, contrária à vida livre de toda pessoa, mais gravosa é ela se voltada contra a responsável atuação de um juiz, sendo absolutamente inaceitável numa República Democrática, pelo que tem de ser civicamente repelida, penalmente apurada e os responsáveis exemplarmente processados e condenados na forma da legislação vigente”, disse. Segundo ela, se comprovada a prática, em qualquer tempo, “as consequências jurídicas, políticas e institucionais terão a intensidade do gravame cometido, como determinado pelo direito”.
Rodrigo Janot, procurador-geral da República
Em nota, Janot alertou para o suposto uso do “aparato do Estado para intimidar a atuação das autoridades”. “É com perplexidade que se toma conhecimento de suposta utilização do aparato estatal para desmerecer um membro da mais alta corte do país, que tem pautado sua atuação com isenção e responsabilidade”, afirmou. “O Ministério Público Brasileiro repudia com veemência essa prática e mantém seu irrestrito compromisso com o regime democrático e com o cumprimento da Constituição e das leis”, disse o chefe do Ministério Público Federal.
O procurador também criticou o meio político. “A se confirmar tal atentado aos Poderes da República e ao Estado Democrático de Direito, ter-se-ia mais um infeliz episódio da grave crise de representatividade pela qual passa o País. Em vez de fortalecer a democracia com iniciativas condizentes com os anseios dos brasileiros, adotam-se práticas de um Estado de exceção”, disse.
Roberto Carvalho Veloso, presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil
A Ajufe comparou a suposta investigação da Abin à ação de regimes totalitários e citou que a revelação indica “desespero”. “A estratégia de constranger magistrados com ataques à honra pessoal, colocando órgãos públicos a esse serviço, é típico de regimes totalitários”, diz o presidente da entidade, em nota. ”Esse tipo de comportamento é inaceitável, demonstrando que as pessoas que intentam utilizá-lo não possuem meios adequados para proceder à sua defesa, e resolvem partir para o desespero, pondo em risco as instituições republicanas e democráticas”, completa.
A nota cita a “absoluta repulsa a tentativas de obstrução da Justiça e de enfraquecimento do Poder Judiciário”. “Em um Estado Democrático de Direito é inadmissível que pessoas investigadas, por exercerem cargos públicos detentores de poder, se utilizem de agentes e recursos públicos para inviabilizar a apuração de fatos graves envolvendo desvio de dinheiro público”, afirma Veloso.
Randolfe Rodrigues, senador (Rede-AP)
O senador promete apresentar uma denúncia contra Temer na Procuradoria-Geral da República. Ele sustenta que, se confirmada a denúncia, o presidente cometeu crime ao usar o aparato do Estado para espionar um ministro que o investiga.
“Não há dúvida de que nós temos na Presidência um criminoso que atenta contra as regras básicas do Estado Democrático de Direito. Essa gravíssima denúncia de que a Abin foi utilizada para investigar um ministro é de um absurdo completo. Isso é característico das piores ditaduras”, disse à revista Veja.
Edson Fachin, ministro do STF e relator da Lava Jato
Procurado pelo Jornal Nacional, da TV Globo, para comentar a reportagem da Veja, Fachin não quis se manifestar. Disse apenas que a nota da presidente do Supremo, Cármen Lúcia, fala por si. Mas na sexta-feira (9), durante solenidade em Curitiba, o ministro disse não acreditar que altas autoridades da República possam causar qualquer tipo de “constrangimento” ao Judiciário. “Isso não é compatível com os exercícios dessas funções”, afirmou.
Michel Temer, presidente da República
Por meio de nota da assessoria de comunicação da Presidência, Temer desmentiu a reportagem da revista Veja e afirmou que jamais “acionou” a Abin para investigar a vida do ministro Fachin. “O governo não usa a máquina pública contra os cidadãos brasileiros, muito menos fará qualquer tipo de ação que não respeite aos estritos ditames da lei”, disse.
“A Abin é órgão que cumpre suas funções seguindo os princípios do Estado de Direito, sem instrumentalização e nos limites da lei que regem seus serviços. Reitera-se que não há, nem houve, em momento algum a intenção do governo de combater a operação Lava Jato”, afirmou o presidente.
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