“Já tentaram me matar muitas vezes, mas eu não sou morredor”, costuma dizer Renan Calheiros (MDB-AL). A eleição de Jair Bolsonaro (PSL) e a onda de rejeição da velha política colocam o senador alagoano em seu mais difícil teste de sobrevivência política em décadas. Em campanha para presidir o Senado pela quinta vez, Renan tenta se realinhar ao novo eixo de poder e faz um esforço para se aproximar de Bolsonaro.
Pode até não dar certo. Mas não chega a ser uma novidade para um político que, apenas nos últimos anos, deixou de ser aliado do PT para defender o impeachment de Dilma Rousseff (PT), fez parte da base de Michel Temer (MDB) e pulou fora do barco do colega de partido para subir no palanque de Lula – muito popular em Alagoas num momento em que Renan corria o risco de não se reeleger ao Senado.
Renan ensaia discurso pró-reformas liberais e a favor do conservadorismo
“O sentimento do MDB é de ajudar o governo e fazer as mudanças de que o país precisa. Eu só posso ser produto da indicação da minha bancada se concordar com isso”, diz Renan. Ele passou a usar as redes sociais para se adaptar aos novos tempos, fez ataques a indicações políticas para cargos públicos (compromisso de campanha de Bolsonaro) e até flexibilizou sua visão sobre pautas sociais.“Quando a sociedade muda os costumes, o Parlamento tem que atualizar as leis. Muitos itens da pauta de costumes do Bolsonaro eu vou ajudar”, afirmou.
Leia também: Filho de Bolsonaro trabalha para que Renan não se eleja presidente do Senado
Crítico mordaz das reformas econômicas do governo Michel Temer durante o período em que havia se reaproximado de Lula, Renan também tenta amenizar suas críticas à pauta liberal para se alinhar ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Renan se aproximou de Guedes no fim de novembro. Seu objetivo era derrubar um possível veto da equipe econômica a seu nome.“Como eu, muitos senadores não são tão liberais. Mas nós achamos que a economia vive um estágio que precisa de mudanças”, diz o senador.
Então líder do MDB, o senador trabalhou em 2017 contra a aprovação da reforma trabalhista de Temer e disse que sua proposta de mudança na Previdência era “exagerada”. Agora, diz que fazia críticas “específicas” . A reforma da Previdência de Bolsonaro, ao menos no discurso do governo, será mais “profunda” que a de Temer. E o atual presidente também promete aprofundar a flexibilização da legislação trabalhista aprovada por seu antecessor.
O senador alagoano busca mostrar que não é um antibolsonarista. Cita os pacotes de corte de gastos que propôs em seu segundo ciclo na presidência do Senado, de 2013 a 2016. “Nossa convergência é a faca”, afirma, tentando se aproximar da promessa de Bolsonaro de reduzir o tamanho do Estado.
Renan representa a velha política? Ele responde: “Deixem eu fazer a transição entre o velho e o novo”
Enquanto o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) conseguiu a adesão do PSL de Bolsonaro à sua candidatura a presidente da Câmara, Renan ainda conta com a antipatia de integrantes do governo. O senador alagoano quer derrubar essas resistências e, principalmente, convencer seus pares de que não será um elemento de conflito com o Planalto caso se eleja para comandar o Senado.
Saiba mais: Acordo do PSL para eleição na Câmara é 1.º ‘choque’ da política real em Bolsonaro
Mas o desafio que ele enfrenta agora é incomum: o grupo de Bolsonaro demonstra hostilidade aberta a seu nome, pois ele simboliza a “velha política” rejeitada na eleição. O alagoano já foi alvo de 18 inquéritos (9 deles arquivados) no Supremo Tribunal Federal (STF). E é um personagem recorrente em delações premiadas da Lava Jato, a operação deflagrada pelo hoje superministro da Justiça, Sergio Moro. E coleciona um histórico de casos suspeitos.
“As pessoas só lembram que eu sou velho. Pelo menos deixem eu fazer uma transição entre o velho e o novo. Vou me esforçar para cumprir esse papel”, diz. Ainda assim, não admite publicamente sua candidatura. Mas está em campanha: em 18 de dezembro, véspera do recesso parlamentar, entrou sorridente no plenário e apertou a mão dos colegas, um a um – até de senadores em fim de mandato, que não votarão em 1.º de fevereiro. Embora muitos senadores acreditem que o vento sopra contra, Renan espera atravessar a tempestade. “O meu couro já ficou grosso”, disse.
Para aliados, Renan só conseguirá conquistar votos para se eleger presidente do Senado se mostrar que não será fonte de conflitos com o governo. Mas, em conversas internas, o alagoano promete aos colegas que, se eleito, trabalhará pela independência do Congresso em relação ao Planalto. Esse ponto é considerado um aceno à oposição, que teme medidas do novo governo. “Eu sou um batedor de continência. Eu só não bato continência quando estou na presidência do Senado. Ali, você tem que defender o seu território institucional”, diz Renan.
Nesta quarta-feira (9), Renan ganhou uma ajuda em sua tentativa de voltar ao comando do Senado. O presidente do STF, Dias Toffoli, determinou que a eleição interna da Casa seja com votação fechada. A decisão de Toffoli cassou a liminar do também ministro do Supremo Marco Aurélio Mello que, em dezembro, havia determinado que a eleição no Senado fosse aberta.
Renan aposta suas fichas numa eleição secreta – como costuma ocorrer. Isso porque ele acredita que muitos senadores não votariam nele, com voto aberto, em função das muitas denúncias a que responde. Pegaria mal. Mas, numa votação sigilosa, esse entrava seria removido.
De Collor a Bolsonaro, as muitas metamorfoses de Renan
Renan tem vasta experiência em metamorfoses políticas. Em 1989, articulou a eleição de Fernando Collor a presidente. No ano seguinte, rompeu com o governo e chegou a depor contra o presidente na CPI que investigou o esquema PC Farias.
Na eleição presidencial de 2002, apostou em José Serra (PSDB) contra Lula (PT). Depois, apoiou a adesão do então PMDB ao governo petista e acumulou poder para se eleger presidente do Senado em 2005. Durante a era petista no Planalto, Renan foi um aliado do PT até a véspera do impeachment de Dilma Rousseff – quando pulou para o barco de Michel Temer.
Mas senador alagoano também rompeu com Temer, em 2017. Aliou-se ao PT para se reeleger num Nordeste afinado com o lulismo. Passada a campanha, reatou com Temer. “Não imaginava que pisaria de novo nesse palácio com você no poder”, disse, segundo um auxiliar.
Moraes eleva confusão de papéis ao ápice em investigação sobre suposto golpe
Indiciamento de Bolsonaro é novo teste para a democracia
Países da Europa estão se preparando para lidar com eventual avanço de Putin sobre o continente
Ataque de Israel em Beirute deixa ao menos 11 mortos; líder do Hezbollah era alvo
Deixe sua opinião