Há cerca de um mês, Brasília estremeceu com o “fim do mundo” anunciado pela divulgação dos depoimentos de colaboração premiada dos executivos da Odebrecht, que trouxe para o centro das investigações figuras importantes da política brasileira. Nesta quinta-feira (18), porém, o país acordou com um novo apocalipse causado pela Operação Patmos, da Polícia Federal, nome que faz referência à ilha grega onde o apóstolo João teve visões do Apocalipse.
Desta vez, os alvos foram pessoas ligadas ao senador Aécio Neves (PSDB-MG) e ao deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Os dois foram implicados no acordo de colaboração premiada dos executivos da JBS – maior exportadora de carne bovina do mundo e dona da marca Friboi.
A delação da JBS acabou se tornando ainda mais explosiva do que o acordo da Odebrecht por expor crimes ainda mais graves. O presidente Michel Temer (PMDB) foi gravado pelo sócio da JBS Joesley Batista dando aval para o pagamento de propina para o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB) permanecer em silêncio na prisão em Curitiba e não firmar acordo de colaboração premiada.
Mas a colaboração da JBS deve ir muito além do que já foi noticiado até agora. A empresa foi a maior doadora de campanha em 2014 e a divulgação dos depoimentos deve arrastar outros parlamentares para o centro da confusão política em Brasília.
“Pega o PT, o PSDB e o PMDB. Isso é o que é mais desesperador para a classe política”, analisa o cientista político Marcio Coimbra. “A gente está vendo que a Lava Jato não faz diferença entre partidos políticos, como se dizia”, completa.
Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a JBS doou em 2014 um total de R$ 366,8 milhões para campanhas eleitorais de diversos partidos. Segundo levantamento do portal Uol, somente para a eleição de 2014, a empresa doou 39,56% de todo o seu lucro líquido registrado em 2013, que foi de R$ 926,9 milhões. Entre 2006 e 2014 foram doados a campanhas políticas 18% dos recursos que a empresa conseguiu através de um empréstimo do BNDES.
Com o acordo homologado e os depoimentos vindo a público, os executivos da JBS podem explodir o mundo político em Brasília e nos estados na mesma proporção, ou em grau ainda maior, que os funcionários da Odebrecht.
Operação Patmos
Os principais alvos por enquanto foram o senador Aécio Neves e o deputado federal Rodrigo Rocha Loures – braço direito do presidente Michel Temer.
Aécio foi gravado pedindo o pagamento de propina no valor de R$ 2 milhões para pagar um advogado para fazer sua defesa na Lava Jato. O senador foi afastado do cargo a mando do Supremo Tribunal Federal (STF) e chegou a ter o pedido de prisão feito pela Procuradoria Geral da República, mas negado pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato na Suprema Corte.
A irmão do senador, a jornalista Andrea Neves, e o primo dele, Frederico Pacheco de Medeiros, foram presos durante a operação dessa quinta-feira (18).
Já o deputado federal Rocha Loures foi pego recebendo dinheiro depois de negociar com a JBS em nome do presidente Michel Temer (PMDB). Ele também tem um pedido de prisão para ser analisado pelo Supremo.
Para Coimbra, a situação de Aécio e Rocha Loures são mais graves por causa das gravações feitas pela polícia e pelos executivos. “Você pode ser citado, mas o que pega para o Rocha Loures e para o Aécio são as gravações”, analisa o cientista político. “Se tivesse gravações de qualquer outro parlamentar, ele estaria enrolado também”, completa.
Para Coimbra, os dois parlamentares devem ser cassados pelos colegas por quebra de decoro parlamentar. Se isso acontecer, Aécio e Rocha Loures perdem a prerrogativa de foro e passam a ser investigados pela Lava Jato em primeira instância.
Situação de Temer
O próprio presidente Michel Temer acabou se complicando com a colaboração da JBS. Um dos sócios da empresa gravou uma conversa na qual Temer dá o aval para a JBS pague uma mesada ao ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB) para que ele permanecesse em silêncio na prisão, em Curitiba, e não fizesse um acordo de colaboração premiada. “Tem que continuar isso, viu?”, teria dito Temer ao ser informado sobre o pagamento a Cunha. O presidente tem dito a interlocutores, porém, que a conversa foi retirada de contexto.
O teor das denúncias já fez com que vários parlamentares pedissem a renúncia do presidente. Também já foram protocolados na Câmara pedidos de impeachment de Temer por obstrução de Justiça – crime de responsabilidade previsto na Constituição.
O PSDB – principal aliado do governo – deve decidir ainda nesta quinta-feira (18) se deixa a base aliada e entrega os cargos em ministérios que ocupa. O mesmo pode acontecer com outros partidos da base. A falta de apoio no Congresso pode obrigar o presidente a renunciar, para evitar uma paralisia decisória no país.