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| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Depois da sugestão de “estocar o vento” da ex-presidente Dilma Rousseff, o Congresso tenta agora formalizar uma proposta que soa quase tão fantasiosa. Com a proximidade das eleições de 2018, avançaram os debates para aprovar uma lei que considera os ventos um patrimônio da União e obrigam a cobrança de royalties. A proposta, se aprovada, resultaria em mais aumento na conta de luz, com a transferência desse custo para o consumidor. 

Uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de 2015 voltou a tramitar e em dezembro foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. A justificativa do autor do projeto, o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), é que as usinas de geração eólica competem com outras atividades econômicas e reduzem a geração de emprego e renda nas áreas onde se instalam. O objetivo é engordar o caixa de municípios, estados e da União com mais essa obrigação a ser recolhida. 

Especialistas condenam a proposta e afirmam que a energia eólica produz exatamente o efeito contrário ao propagado na justificativa da PEC, gerando desenvolvimento nas regiões onde são instaladas, majoritariamente no Nordeste do país. 

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“Esta proposta é bastante curiosa e inédita, não há precedente mundial nesta direção e, se aprovada, estaríamos ‘inventando moda’. Além disso, será um custo adicional aos consumidores, sobre o qual ainda incidem impostos e é um movimento que vai na direção contrária da busca pela racionalização dos já excessivos encargos e subsídios que oneram o já alto custo da energia e afetam a competitividade do país”, Luiz Augusto Barroso, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), do governo federal.

A cobrança de royalties chegaria ao bolso do consumidor de energia, avalia Cristopher Vlavianos, presidente da Comerc Comercializadora de Energia. “Não sei nem da onde apareceu essa ideia. Ela vai contra tudo que está se caminhando hoje, de redução de custos e encargos do setor. É muito fácil ir criando despesas. Não vejo isso como coisa muito lógica. Tudo que você cria de custo vai parar no consumidor. Você não está cobrando royalties da empresa geradora, mas sim do consumidor de energia”, disse.

Royalties não fazem sentido sobre o vento

A cobrança de royalties no setor energético é adotada sobre fontes finitas, como o petróleo e os minérios (carvão mineral, por exemplo). O conceito por trás disso é o de que esses recursos são um bem da União, que precisa ser compensada pelo uso daquele recurso, que uma dia vai acabar. Esse não é o caso dos ventos, que não são finitos e também não precisam de processos exploratórios para serem aproveitados. 

“Precisamos qualificar melhor esse debate. O impacto caso se crie o royalties para a geração renovável vai ser maior do que apenas o financeiro. Tem dano à imagem do Brasil ao dar um passo atrás na geração renovável, tem aumento do risco Brasil com a mudança, tem insegurança jurídica, tem redução na atração de investimentos. Uma medida como essa coloca o Brasil mais próximo do (Donald) Trump do que do (Emmanuel) Macron. Mais próximo do antigo do que do novo”, analisa Rodrigo Sauaia, presidente-executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar). 

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Outro efeito danoso, avaliam os especialistas, seria o incentivo à adoção de outras fontes de geração de energia, mais poluentes. A Associação Brasileira da Energia Eólica (ABEEólica) argumenta que o pagamento de royalties chegaria ao consumidor, na conta de luz, e encareceria a geração eólica, tornando-a menos competitiva e estimulando a compra de energias poluentes e não-renováveis. Também argumentam que a medida teria efeito contrário ao desejado para os estados geradores, reduzindo empregos.

Divisão do ICMS pode ser solução para crise dos estados, mas de difícil realização 

Sauaia pondera que um dos argumentos de defesa da medida é a necessidade de recursos financeiros para os municípios e estados. Porém, ele critica a tentativa de buscar eleger um setor econômico para ser o “salvador da pátria”. Uma proposta que poderia ser estudada para ajudar os estados geradores de energia eólica seria a divisão dos impostos entre o estado que gera a energia e o que consome. Atualmente, o imposto estadual (ICMS) recolhido fica para o estado onde a energia é consumida e o imposto pago. 

“Os municípios, estados e União já arrecadam impostos sobre os renováveis. E uma forma prática e eficiente de reduzir a disparidade da distribuição dos recursos entre os entes seria que o ICMS que hoje incide sobre a energia exclusivamente nos estados consumidores fosse dividido entre o consumidor e o produtor. Hoje só recebe ICMS no estado consumidor. Mas a arrecadação é computada pelas distribuidoras ou no mercado livre, no estado consumidor”, sugere. 

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Ele também destaca que os municípios geradores da energia renovável ganham com a manutenção dos parques geradores, principalmente com recolhimentos de impostos sobre serviço (ISS). Como exemplo, Sauaia explica que cerca de 60% dos empregos gerados na indústria solar fotovoltaica estão na instalação e manutenção das usinas geradoras, o que é feito no local das placas, geralmente áreas isoladas e áridas, com poucas opções de agropecuária. 

Mas a divisão de tributação pode ser algo quase impossível de realizar, na visão de Cristopher Vlavianos, da Comerc Energia. Ele explica que é difícil saber onde a energia é consumida, uma vez que ela entra na rede de transmissão e distribuição. Poderia se adotar uma divisão do imposto com base na venda dos leilões de energia, onde as distribuidoras compram, mas que a mudança tributária estadual demandaria um longo processo com as secretarias de fazenda dos estados, algo difícil de empreender. 

A CCJ da Câmara aprovou a PEC no dia 8 de dezembro. Agora o mérito da PEC será analisado por uma comissão especial. Depois, a proposta seguirá para apreciação no plenário, onde precisará ser votada em dois turnos, algo difícil, mas que pode ter apoio dos deputados, pois aumentaria a arrecadação dos entes federativos e seria uma proposta defendida por prefeitos e governadores.

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