O ministro Humberto Martins, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), indeferiu na noite desta terça-feira (30) o pedido de liminar da defesa de Luiz Inácio Lula da Silva para evitar que o ex-presidente seja preso antes do trânsito em julgado do processo do tríplex do Guarujá. O mérito do habeas corpus preventivo será avaliado agora pela 5ª Turma do STJ, sob relatoria do ministro Felix Fischer, responsável pela Lava Jato na Corte.
O HC foi apresentado pelos advogados Cristiano Zanin Martins, Valeska Teixeira Martins e José Roberto Batochio. No documento, eles elencam “seis motivos concretos” para sustentar que não há necessidade da execução provisória da pena de 12 anos e um mês de prisão em regime fechado. O petista foi condenado pelo juiz federal Sergio Moro, da Justiça Federal de Curitiba, e teve a pena aumentada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre.
Os desembargadores da 8ª Turma do TRF-4 recomendaram o início da execução da pena – com base no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), de 201,6 sobre a prisão em segunda instância – tão logo se esgotem os recursos da defesa do ex-presidente no próprio tribunal. Os advogados dele ainda podem entrar com embargos de declaração, para esclarecer dúvidas sobre a decisão do Tribunal da Lava Jato e protelar ao início da execução da pena, assim que o acórdão do julgamento for publicado, o que deve ocorrer ainda nesta semana.
Mas as chances de Lula obter uma decisão favorável na 5ª Turma do STJ para barrar a prisão são mínimas, principalmente pela fragilidade dos “motivos concretos” apresentados pela defesa. Leia abaixo o que os advogados sustentam como razão para ele não ser preso:
1) Colaboração com a Justiça
A defesa alega que Lula esteve sempre à disposição da Justiça, comparecendo em juízo toda vez que foi solicitado na ação penal do tríplex e em outras nas quais é réu. “As inúmeras violações infligidas a seus direitos e garantias processuais penais não tiveram o condão de retirar do Paciente [Lula] o interesse em colaborar e de provar em Juízo sua inocência”, afirmam em trecho da petição.
E lembram que o ex-presidente prestou depoimento à autoridade policial em 16 oportunidades e em dois interrogatórios conduzidos pelo juiz Sergio Moro, em Curitiba. “O Paciente respeita as decisões judiciais, mesmo as teratológicas [deformadas]”. A defesa cita o episódio da retenção do passaporte de Lula, após decisão da Justiça de Brasília, na quinta-feira (25), alegando que o petista cumpriu de pronto a determinação judicial. O documento foi entregue no dia seguinte. Lula recorre dessa decisão no Tribunal Regional Federal da 1.ª Região (TRF-1).
A tese de que colabora com a Justiça é fraca. Desde o início Lula propaga o discurso de que é vítima de uma perseguição do Judiciário e do Ministério Público Federal. No primeiro interrogatório prestado ao juiz Sergio Moro, o petista adotou uma postura desafiadora, respondendo às questões formuladas pelo magistrado e pelos procuradores de modo evasivo, irônico e até mesmo arrogante. Um comportamento inaceitável para alguém que diz não ter cometido crime algum e que tem interesse em provar sua inocência.
Mas ele não parou por aí! Após a confirmação da condenação no TRF-4, Lula subiu ainda mais o tom, pregando uma desobediência à decisão judicial ao garantir que será candidato a presidente de qualquer jeito, mesmo que esteja enquadrado na Lei da Ficha Limpa e sob risco de ser preso.
2) Sem antecedentes criminais
Os advogados lembram que o processo do tríplex do Guarujá é a primeira condenação judicial sofrida pelo ex-presidente, reiterando que ele é réu primário e tem bons antecedentes criminais.
O ex-presidente é réu em outras seis ações penais em Varas da Justiça Federal de Curitiba e Brasília, além do processo do tríplex: 1) por tráfico de influência na liberação de verba do BNDES para obra da Odebrecht em Angola; 2) por obstrução da Justiça no caso da delação premiada de Nestor Cerveró; 3) por tráfico de influência na compra de caças suecos; 4) também por tráfico de influência na edição de medidas provisórias para o setor automotivo; 5) por corrupção e lavagem de dinheiro na aquisição de um terreno para o Instituto Lula e de um imóvel em São Bernardo do Campo; e 6) por corrupção no caso do sítio de Atibaia, que seria de propriedade do ex-presidente.
Lula ainda é alvo de outras duas denúncias formuladas pelo Ministério Público Federal e que aguardam análise da Justiça: uma por corrupção no caso do quadrilhão do PT; e outra por obstrução de Justiça no caso da nomeação dele para a chefia da Casa Civil no governo Dilma Rousseff.
Sem falar que o petista já foi preso na época em que era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Paulista, em 1980. Lula passou 31 dias na prisão por liderar uma greve dos trabalhadores. O então líder sindical foi enquadrado na Lei de Segurança Nacional pela ditadura militar.
3) Crime não violento
Outro motivo apresentado é que Lula não responde na Justiça pelo cometimento de crimes violentos, como homicídio ou assalto à mão armada. “(...) foi condenado, injustamente, pela prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro”, diz a defesa no pedido de habeas corpus.
O procurador da República Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, costuma dizer que a corrupção mata. “A corrupção é uma assassina sorrateira, invisível e de massa. Ela é uma serial killer que se disfarça de buracos em estradas, em faltas de medicamentos, de crimes de rua e de pobreza”, afirmou ele em discurso na Câmara dos Deputados quando da apresentação do projeto de iniciativa popular das Dez Medidas Contra a Corrupção.
É ponto pacífico hoje que a corrupção é a mãe de todos os outros crimes sendo, portanto, um delito tão grave quanto o homicídio, guardadas as devidas proporções.
4) Idade avançada
A defesa lembra ao juízo que o ex-presidente Lula tem 72 anos de idade, dando a entender que não prendê-lo seria um gesto misericordioso por se tratar de um idoso.
O deputado federal Paulo Maluf (PP-SP), que tem 86 anos, está cumprindo sua pena de 7 anos, 9 meses e 10 dias de prisão em regime fechado no Presídio da Papuda, no Distrito Federal, desde 22 de dezembro. Ele foi condenado à prisão e teve a perda de mandato decidida pelo Supremo Tribunal Federal após ser considerado culpado pelo crime de lavagem de dinheiro. Diversos recursos da defesa que solicitavam a prisão domiciliar de Maluf foram negados desde então. Ou seja, idade avançada não é razão para impedir a prisão de ninguém, muito menos de Lula.
5) Ex-presidente da República
Os advogados lembram que Lula foi presidente eleito do Brasil por duas vezes, exercendo o mandato entre 2003 e 2010. E que, nesse período, ele foi responsável pela implementação de “diversas políticas de prevenção e repressão à criminalidade organizada e à prática de crimes econômicos e financeiros, como a criação da Controladoria Geral da União, o fortalecimento da Polícia Federal e a nomeação de procuradores-gerais da República mais votados nas listas tríplices apresentadas pelo Ministério Público Federal, respeitando o desejo da maioria dos procuradores, entre outros.
A defesa esquece um princípio constitucional fundamental: todos são iguais perante à lei. Este é, portanto, o argumento menos plausível para justificar a não detenção do petista. Em um país onde o senso comum prega que só negros e pobres vão para cadeia, a prisão de um ex-presidente condenado pela Justiça teria inclusive um caráter pedagógico importante, desmistificando a ideia de que homens ricos e poderosos não são presos no Brasil.
De fato, o governo Lula contribuiu para o aperfeiçoamento dos mecanismos e das instituições que combatem a corrupção no Brasil. Mas isso não lhe confere salvo-conduto para o cometimento de crimes como os que ficaram provados no processo do tríplex.
6) Pré-candidatura
Na petição, os advogados lembram que Lula é pré-candidato a presidente da República nas eleições deste ano e aparece em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de votos divulgadas em 2017 por diversos institutos de pesquisa, “ganhando de todos os seus oponentes em projeções de segundo turno”.
Por isso, privá-lo de sua liberdade no período de campanha ou pré- campanha eleitoral trariam “um prejuízo irreversível ao exercício da democracia no país – que pressupõe o debate de ideias muitas vezes antagônicas entre si”. “Garantir liberdade de trânsito e voz a alguém que representa tantos brasileiros, especialmente neste período de conflagração sócio-política que se atravessa – é conferir efetividade aos fundamentos de nossa República, que se alicerça no pleno exercício da cidadania (artigo 1º, II, da CF) e do pluralismo político (artigo 1º, V, da CF)”, sustentam.
A Lei da Ficha Limpa, assinada pelo próprio Lula em 2010, é clara ao estabelecer a inelegibilidade de pessoas condenadas por um órgão colegiado da Justiça. Ou seja, a eventual candidatura de Lula pelo PT deve ser indeferida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tão logo ela seja registrada. A defesa do ex-presidente pode recorrer dessa decisão no Supremo Tribunal Federal (STF) , mas não há garantia nenhuma de que vá vencer.
O que vale, por ora, é o entendimento do STF de que condenados em segunda instância por um órgão colegiado devem iniciar o cumprimento da pena imediatamente, mesmo que ainda tenham recursos de apelação tramitando em órgão superiores da Justiça.
Leia na íntegra o pedido de habeas corpus – as seis razões estão nas páginas 35 a 38
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