| Foto: Flickr/Família Bolsonaro

O deputado e presidenciável Jair Bolsonaro (PSC-RJ) está fazendo um tour pela Ásia. Já passou pelo Japão e Coreia do Sul e deve encerrar o giro em Taiwan. Já a China, o maior parceiro comercial do Brasil, ficou de fora do roteiro. A razão é muito simples: Bolsonaro já repetiu em diversas ocasiões ser contrário ao avanço chinês no Brasil. "A China não está comprando no Brasil, está comprando o Brasil", afirmou o pré-candidato em mais de uma entrevista. Mas a proximidade dos chineses deve ser vista como algo ruim? Para especialistas, essa relação deve ser cultivada, mas com precaução.

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A China não deve ser vista como um parceiro internacional comum, avalia o cientista político e especialista em relações internacionais Wagner Parente, diretor da consultoria Barral M Jorge. “Os chineses planejam investimento com foco diferente do nosso. A intenção não é puramente privada, tem um plano por trás, que são os planos quinquenais do Partido Comunista. A China não pode ser considerada um parceiro normal, porque não é”, afirmou. 

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Apesar dessa atipicidade dos investimentos chineses, a começar pelo inseparável vínculo entre o Estado e o Partido Comunista, Bolsonaro ainda não conseguiu dar clareza a sua proposta para as relações internacionais ao criticar a China. 

“Bolsonaro está tateando qual será sua política externa. Ele está num momento de fazer um programa de governo minimamente consistente e está com muita dificuldade. Tem tentado coordenar o histórico dele com uma guinada liberal. É difícil, ele tem um discurso estadista e agora busca o mercado, iniciativa privada. Não é um raciocínio completamente despropositado se preocupar com China e é fácil pintá-la como inimigo. O difícil é como você se aproveita do momento chinês e traz benefício para o país”, disse Parente. 

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A China é o maior parceiro comercial brasileiro, destino de um quarto de tudo o que o Brasil vendeu ao exterior no ano passado (US$ 47,5 bilhões, do total de US$ 217,7 bilhões exportados), principalmente itens básicos, como soja e minério de ferro. É de lá também que o Brasil mais recebe importações (US$ 27,3 bilhões do total de US$ 150,7 bilhões comprados no ano passado). 

Crítica pelos motivos errados 

Bolsonaro critica algo que procede, mas pelos motivos errados. Ao dizer que a China é uma ameaça, o pré-candidato não está considerando o risco de o Brasil ter uma pauta de investimentos e comércio exterior tão dependente de um único país. O deputado está criticando a nação comunista sob o prisma de uma visão ideológica e nacionalista que ainda mantém, mesmo após os acenos de que quer adotar um programa econômico pró-mercado e liberal.

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"Visitei a região produtora de grafite de Miracatu (SP) e vi muita gente de olho puxado que está ali fazendo pesquisa há décadas, não podemos permitir isso", teria dito o pré-candidato segundo reportagem do site BuzzFeed, em fevereiro deste ano. 

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Para o analista Wagner Parente, Bolsonaro não vai conseguir resolver o problema da concentração chinesa nos investimentos no Brasil com declarações ou frases de efeito.

“O Brasil deve perseguir uma exposição um pouco menor perante a China. Devemos buscar mais acordos comerciais, novos parceiros. Isso também em relação a investimentos. Mas não conseguimos fazer isso com retórica. Temos de negociar, buscar acesso a mercados brasileiros em mercados não convencionais, onde não há restrições. São ações concretas. Não precisamos declarar guerra à China, mas o Brasil deve cuidar para reduzir sua exposição e isso não só com a China”, avalia. 

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Entre 2010 e 2015, foram investidos no Brasil US$ 37,1 bilhões pelos chineses, segundo o Conselho Empresarial Brasil-China. Na última década, em alinhamento com os planos do Partido Comunista, a China criou ondas de investimentos no Brasil. Entre 2007 e 2009, eles buscaram commodities (alimentos e minério) no país, fomentando recordes comerciais brasileiros. De 2011 a 2013, foi a fase do desenvolvimento industrial quando, em alinhamento com as políticas do governo petista, os chineses trouxeram indústrias para o Brasil, como a Sany (montadoras de máquinas e equipamentos), a Chery (veículos) e Huawei e Lenovo (eletrônicos e comunicação). 

A terceira onda foi em 2013, com bancos chineses trazendo suas operações ao Brasil, e a quarta onda se iniciou em 2015, com grandes investimentos no setor de energia, como a compra de usinas hidrelétricas no governo Dilma Rousseff, resultando em arrecadação de R$ 17 bilhões no final daquele ano. Desse total, R$ 13,8 bilhões foram pagos pela gigante China Three Gorges (CTG), dona da maior hidrelétrica do mundo. Na área de petróleo os chineses também fizeram aquisições no Brasil, como a compra de 40% das operações brasileiras da petroleira espanhola Repsol pela estatal chinesa Sinopec. 

Aportes devem continuar, querendo ou não

Como a economia chinesa é gigante, é possível esperar que os aportes e investimentos no Brasil continuem. Segundo o Conselho Empresarial Brasil-China, em 2016 estavam previstos investimentos da ordem de US$ 12,5 bilhões por aqui. 

Na política, a China vem abrindo sua economia ao mundo, mas ainda mantém no Partido Comunista sua base. Tradicionalmente, o presidente do país é o secretário-geral do partido, e o atual presidente, Xi Jinping, está fortalecido, com uma tentativa do partido de permitir reeleições sem limite para o presidente, a ser votada em março. Xi já é visto como o novo Mao-Tsé Tung, o fundador da China moderna. 

Se por um lado a China vem aprendendo a ocupar seu espaço na economia mundial e a dialogar com o mercado financeiro, por outro o papel do Partido Comunista seguirá grande na economia e nas empresas estatais, o que pode significar risco para a administração dessas empresas em outros países. 

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Bolsonaro ainda precisará esclarecer por que critica a China e com que objetivo, sem o espectro nacionalista e cheio de resquícios de um mundo dividido nos anos de guerra fria. "A China está comprando terras agricultáveis do Brasil e isso é preocupante porque a nossa segurança alimentar brevemente estará nas mãos dos estrangeiros. Não quero brigar com país nenhum nem impedir o comércio, mas não podemos vender o Brasil", disse o pré-candidato durante a visita ao Japão. 

Em uma entrevista à Bloomberg em Nova York, falando diretamente com os investidores internacionais, Bolsonaro chegou a dizer que a China “não tem coração”, sugerindo restringir acesso a setores estratégicos.  Em dezembro passado, em sua conta do Twitter, comentou que o Brasil estaria “perdendo o controle da produção primária e da sua própria segurança alimentar. É preciso estabelecer limites legais, urgentes e propositalmente não utilizados nesta área”. 

O analista e especialista em Relações Internacionais alerta que Bolsonaro tem de correr para definir seu discurso de forma clara. “Falar que há perigos com a China é falar obviedade. Agora como se usa isso em favor do Brasil? Apontar que é o inimigo, não é assim que se faz. Bolsonaro precisa desenvolver muito suas propostas e para a política externa ele não tem essa pessoa que aponte o dedo, mostre o caminho. É bom que apareça logo, antes que ele se meta numa encrenca”, conclui Parente.