O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) abre a partir da próxima semana a temporada das vaquinhas para políticos que pretendem concorrer as eleições de 2018. A partir de terça-feira (15), os pré-candidatos estarão autorizados a começar as campanhas de financiamento coletivo através da internet, os chamados crowdfundings. Essa forma de arrecadação não é uma novidade de 2018, mas ganhou peso com o fim do financiamento empresarial.
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A expectativa é que a proibição às doações por empresas, aliada ao teto de gastos para cada cargo disputado, torne as campanhas mais baratas no Brasil. Em 2014, a campanha da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que venceu as eleições em 2014, gastou ao todo R$ 350,2 milhões, enquanto o teto de gastos para disputa presidencial nesse ano é de R$ 70 milhões.
Para o advogado eleitoral Cassio Prudente Vieira Leite, a arrecadação por crowdfunding tem uma vantagem importante para os “outsiders” da política que pretendem disputar cargos nas eleições. “Com o financiamento coletivo a pessoa abre a plataforma de financiamento para ver se a candidatura dela será viável. Ou seja, ele começa a arrecadar agora e lá na frente, em agosto, ele consegue saber se a campanha dele é viável ou não”, explica. “O financiamento coletivo tenta tornar viáveis algumas campanhas que naturalmente não conseguiriam naqueles 45 dias de campanha ter recursos para uma disputa justa”, completa.
O dilema: quem está disposto a bancar políticos?
Em um cenário de pouca credibilidade de políticos, fazer o eleitor tirar dinheiro do próprio bolso para doar para candidatos pode ser um desafio. Para o especialista em marketing eleitoral Marcos Zablonsky, pré-candidatos que tenham uma ideologia ou uma causa bem definidas saem na frente na hora de conquistar potenciais doadores. Mesmo assim, é preciso que o candidato saiba combater o discurso que criminaliza a política.
“Apesar de todo esse dilema, da própria realidade que estamos vivendo em que quase todos os políticos têm algum tipo de envolvimento com corrupção ou está respondendo a algum tipo de processo, a política ainda é uma alternativa para conseguir as coisas. O candidato é que vai ter que fazer esse trabalho, vai ter que trabalhar uma campanha de convencimento de que o caminho é por meio da política, da boa política”, explica Zablonsky.
Para a advogada eleitoral Tailaine Costa, a arrecadação virtual pode ter um papel importante para as campanhas nesse ano. “Acredito que pode mobilizar mais pessoas a participar. Afinal, a doação também é um modo de participação política. A informatização da sociedade e as relações virtuais são uma realidade”, opina.
Como funciona: empresas precisam pedir habilitação
As empresas interessadas em fazer a ponte entre doadores e pré-candidatos por financiamento coletivo precisam ser habilitadas pelo TSE. Até esta terça-feira (8), 33 empresas pediram habilitação no tribunal para operar a partir da semana que vem. Entre elas está a Confia Brasil, que foi criada especificamente para atuar na arrecadação de doações para campanhas.
O diretor-geral da Confia Brasil, Luiz Felipe Pereira Bazzo, diz que a empresa aposta em tecnologia e ferramentas de engajamento para atrair potenciais doadores. Além de receber doações para as campanhas desse ano, a plataforma também vai oferecer ferramentas de acompanhamento dos candidatos eleitos. “A ideia é justamente dar mais transparência, praticidade e segurança, tornar o processo de doação mais interativo para que haja uma cobrança pelo eleitorado”, explica. Além do engajamento do eleitor, Bazzo destaca que o financiamento coletivo quebra a lógica de um conflito de interesses causado pelas doações de pessoas jurídicas. Segundo Bazzo, cerca de 400 pré-candidatos já estão negociando com a plataforma para arrecadar recursos a partir da semana que vem.
Arrecadação funciona como ‘poupança’, que só será acessível em agosto
Apesar de poder começar a arrecadar doações a partir do dia 15 de maio, os pré-candidatos só terão acesso aos recursos doados a partir do registro de candidatura, que ocorre até o dia 15 de agosto. Caso os pré-candidatos que tenham arrecadado doações decidirem não registrar candidatura até esse prazo, o dinheiro é devolvido aos doadores pelos próprios sites de financiamento coletivo.
O eleitor que optar por doações pelos crowdfundings também está sujeito às regras de teto para doações - 10% do rendimento do ano anterior. Além disso, os doadores só podem usar as ferramentas de crowdfunding para doar valores inferiores a R$1.064,10. A partir desse montante, os recursos devem ser repassados através de transferência bancária no período de 45 dias de campanha.
“Do ponto de vista do eleitor, ele tem que tomar cuidado para somar as eventuais doações que ele quiser fazer, porque o limite de 10% é um limite para todas as doações que ele fizer para todos os candidatos; não é um limite de 10% para cada candidato ou para cada eleição. E inclui o período pré-eleitoral e eleitoral”, alerta Costa.
Também há limite para os políticos que vão receber os recursos. “Para o candidato, o limite do financiamento coletivo é o limite de gastos para a candidatura dele. Se tiver mais recursos, esse excesso será repassado para o partido dele”, explica Leite. As doações podem ser captadas até o último dia de campanha, segundo resolução do TSE.
Crowdfunding como alternativa para o fim do financiamento privado
Costa alerta para possíveis fraudes através do financiamento coletivo para “driblar” a proibição de empresas doarem para campanhas políticas. Para a advogada, pode haver crime de caixa dois e abuso de poder econômico através da utilização de vaquinhas virtuais.
“Existe o risco, sim, das pessoas jurídicas, por meio de laranjas, que tenham um padrão de renda compatível, doarem, através de crowdfunding, para os candidatos de sua preferência. Para isso, basta que elas tenham um mecanismo de reembolsar as pessoas que querem doar recursos, e aí ela arregimenta 40, 50, 60 doadores que vão fazer exatamente aquilo que ela faria dentro da legalidade”, alerta Costa.
Vaquinhas não empolgaram o eleitor brasileiro em campanhas passsadas
Até agora os crowdfundings não foram fontes significativas de arrecadação em campanhas anteriores. Em 2014, apenas quatro dos 12 candidatos utilizaram a ferramenta. Dos R$ 602 milhões arrecadados por todas as campanhas naquele ano - R$ 587,7 milhões doados por empresas e R$ 15,2 milhões por pessoas físicas – apenas R$ 620 mil foram levantados através de financiamento coletivo.
A candidata que mais arrecadou recursos através dessa modalidade foi Marina Silva, que concorreu pelo PSB: R$ 317 mil. A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) conseguiu levantar R$ 266 mil; a candidata Luciana Genro (PSOL), R$ 29 mil, e o candidato Zé Maria (PSTU), R$ 8 mil. Ainda em 2014, o então candidato ao Senado, Eduardo Suplicy (PT-SP), conseguiu arrecadar apenas R$ 166 através de financiamento coletivo para sua campanha.
Já em 2016, o então candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, Marcelo Freixo (PSOL), bateu o recorde de financiamento coletivo no Brasil ao arrecadar mais de R$ 1 milhão para sua campanha através de crowdfunding. O então candidato recebeu doações de 9 mil pessoas. Freixo já havia utilizado o financiamento coletivo na campanha de 2012 pela Prefeitura, quando arrecadou R$ 162 mil através de uma vaquinha online, e em 2014, na disputa pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, quando conseguiu R$ 64 mil em doações.
Obama foi referência para o modelo
A forma de arrecadação de dinheiro para campanha através de vaquinhas virtuais começou com a campanha de Barack Obama à Presidência dos Estados Unidos em 2008. O candidato democrata conseguiu arrecadar US$ 500 milhões.
A novidade das vaquinhas para as campanhas foi inaugurada por Barack Obama em 2008, quando o então candidato à presidência dos Estados Unidos arrecadou meio bilhão de dólares para sua campanha. Em 2012, na campanha para a reeleição, Obama conseguiu arrecadar US$ 690 milhões através do crowdfunding.
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