| Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

Ainda que autoridades do Judiciário e da Procuradoria-Geral da República (PGR) tenham rechaçado veemente a conduta do desembargador Rogério Favreto, que no último domingo (8) determinou a soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – a qual só não foi cumprida por uma reação rápida da força-tarefa da Operação Lava Jato –, tudo indica que a defesa buscará outras alternativas para libertá-lo.

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As chances de sucesso nos tribunais são pequenas, mas os apoiadores deverão fazer de tudo para manter o petista nos holofotes. Mesmo que o cenário mais provável se concretize, com Lula preso e impedido de se candidatar pela Lei da Ficha Limpa, um objetivo já foi alcançado: seu partido encontrou novo fôlego, na tentativa de mantê-lo na disputa presidencial.

Se isso vai ser bom ou não para o PT, ainda é cedo para dizer. Mas o fato é que as idas e vindas da Justiça no domingo e seus desdobramentos jogaram de novo Lula para o centro das atenções nacionais. O partido tem motivo para fazer barulho. As pesquisas eleitorais mostram tendência de declínio nas menções a Lula. Ele, que chegou a obter 18% da preferência do eleitor em pesquisa espontânea feita pelo Datafolha em setembro de 2017, caiu para 10% na mais recente, realizada entre 6 e 7 de junho de 2018.

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Nas redes sociais, que se transformaram na arena mais popular para discussões políticas, as páginas relacionadas ao ex-presidente voltaram a ganhar destaque – mesmo que de forma não orgânica –, revertendo uma tendência de queda observada ao longo das últimas semanas.

Na primeira semana de julho, por exemplo, a página oficial de Lula no Facebook teve 379,2 mil interações: uma média de 54,1 mil por dia, o que representa um terço da média dos últimos 12 meses, de 105,1 mil interações diárias, conforme a ferramenta Crowd Tangle. No dia da “quase soltura”, foram 615,5 mil interações, se aproximando dos recordes registrados com a prisão do petista, em abril, e da condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em janeiro.

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No Twitter, o impasse sobre a situação de Lula gerou 1,53 milhão de citações, conforme cálculo feito entre 10h de domingo (8) e 11h de segunda-feira (9) pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas (FGV). Foram mais menções do que a média diária registrada entre 4 e 8 de abril, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou o pedido de habeas corpus de Lula: 956 mil tuítes na ocasião.

No episódio mais recente, a maioria das menções (30%) fez críticas ao juiz Sergio Moro e ao Judiciário; outros 20% eram de perfis contrários ao petista; e 11% eram pró-Lula. Segundo a FGV, no grupo pró-Lula houve atuação de robôs, o que camufla a real participação das pessoas. Foram 8,19% robôs no grupo pró-Lula, contra 2,95% entre os opositores a Lula e 0,35% nos comentários sobre Moro e Judiciário.

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De todo modo, o imbróglio animou o PT, que já fez vários atos públicos e programou outros eventos para a próxima sexta-feira (18), data que marca o centenário de nascimento de Nelson Mandela, líder político sul-africano que ficou preso por 27 anos. A intenção é explorar o discurso petista de que Lula, tal como Mandela, também é um preso político.

Para ajudar na narrativa, ainda no domingo, o PT repercutiu com destaque que uma organização não-governamental com sede em Madri (Espanha) deu a Lula o status de preso político. A ONG espanhola, Fundación Internacional de Derechos Humanos, tem atuação limitada, mas a semelhança de grafia com a Federação Internacional para Direitos Humanos (FIDH, na sigla em francês) gera confusão sobre a importância do fato.

Análise

Lula só conseguiu um habeas corpus para sair da prisão no domingo por uma conjunção de fatores, como a inclinação política do desembargador Rogério Favreto, ex-advogado que foi filiado ao PT por 20 anos. A decisão monocrática do desembargador foi desautorizada pela presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Laurita Vaz, e questionada judicialmente pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Ela apresentou ao STJ pedido de abertura de inquérito judicial contra o desembargador, pelo crime de prevaricação. Para ela, Favreto agiu fora da sua competência ao conceder liminar em habeas corpus a Lula.

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Ainda assim, as críticas às condutas tomadas pelo juiz Sergio Moro (de férias, ele despachou para impedir a soltura de Lula) e pelo desembargador do TRF-4 João Pedro Gebran Neto (que desautorizou uma ordem de um colega no mesmo nível de hierarquia, com o argumento de que é relator da Lava Jato no tribunal) indicam que as decisões dos magistrados da Operação Lava Jato não são soberanas, o que anima a militância e a defesa em apostar em estratégias heterodoxas.

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Os três magistrados envolvidos no episódio de domingo (Favreto, Moro e Gebran) viraram alvo de procedimentos na Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conforme determinado pelo corregedor, João Otávio de Noronha.

A presidente nacional do PT e senadora paranaense, Gleisi Hoffmann, reagiu. “[Sérgio] Moro não prevaricou impedindo o cumprimento da sentença pela Polícia Federal? Não observando o devido processo legal? Em que país estamos vivendo?”, questionou na quinta-feira (12). Ela ainda criticou a proibição de Lula de dar entrevistas, mesmo com os direitos políticos vigentes. “Até Marcinho VP, traficante, deu entrevistas”, destacou.

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Para o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, a “confusão” ocorrida no domingo é decorrente da situação inédita em que o país vive. Lula, ex-presidente e líder nas pesquisas eleitorais, foi condenado em segunda instância por um colegiado, mas o processo ainda não transitou em julgado e, por isso, ele mantém seus direitos políticos vigentes. Isso inclui a possibilidade de se declarar candidato, mesmo na prisão.

“Oficialmente, ele ainda é inocente, e por isso a defesa está provocando, tentando interpretações novas, tentando recursos extraordinários, o que coloca o Judiciário na iminência de decidir de maneira heterodoxa, rápida”, avalia ele, que é coordenador do Centro Brasileiro de Estudos sobre a Democracia (Cebrad), da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

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Na opinião de Lucas de Aragão, cientista político da consultoria Arko Advice, o episódio reforçou o discurso no qual o PT vinha insistindo. “A chance de sucesso é mínima, mas, uma vez que o partido embarcou no discurso de que é vítima de golpe, não dá para desistir. Como temos um Judiciário que permite inúmeras tentativas de soltura, a defesa pode tentar criar fatos novos e com isso entrar com mais pedidos de habeas corpus”, diz.

Aragão ressaltou que o PT está em uma “campanha de relações públicas”, mais do que uma campanha presidencial e que, com estratégias nunca imaginadas, pode até conseguir a liberdade do ex-presidente. “Mas liberdade e elegibilidade são duas coisas bem diferentes”, afirma, dizendo que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vai barrar a candidatura de Lula por causa da Lei da Ficha Limpa.

O jurista Ives Gandra da Silva Martins se diz mais cético quanto à liberdade de Lula – a não ser por um novo julgamento do STF a respeito da prisão em segunda instância. A presidente do tribunal, Cármen Lúcia, se nega a colocar o assunto em pauta, mas seu sucessor, Dias Toffoli, que assume em setembro, poderá seguir caminho diverso.

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Em outubro de 2016, por um placar apertado, 6 a 5, o STF entendeu que a medida é constitucional, mas há uma certa expectativa quanto a uma mudança no placar. “Mas isso não deve ocorrer antes do fim de setembro. Até lá, ele deve permanecer preso, mas a defesa indica que vai entrar com quantos recursos forem necessários para manter o nome de Lula em circulação”, opina.

Ainda que não confirme, o PT tem um nome que desponta para substituir Lula: Fernando Haddad. “O Haddad tem a vantagem de não estar sendo investigado, mas se o PT lançar seu nome agora, ele será atropelado. Basta lembrar que a gestão dele em São Paulo foi fraca, o que o levou a perder a disputa pela reeleição ainda no primeiro turno, contra um candidato que nunca tinha sido eleito ou concorrido, o João Doria”, opina Gandra Martins.

Futuro do PT

Assim, o caminho provável para o PT é tentar manter o nome de Lula como candidato até a discussão final sobre registro de candidaturas, que deve se arrastar até 17 de setembro, data de julgamento de todos os pedidos de registro de candidatura no TSE. Por um lado, isso pode prejudicar uma possível união de siglas de oposição, e também embaralha as definições em torno da candidatura de Ciro Gomes (PDT) – um nome de esquerda que pode caminhar para o centro, a depender dos partidos que conseguir atrair.

Para Geraldo Tadeu Monteiro, a estratégia do PT não é só manter o nome de Lula em alta, mas garantir a própria sobrevivência. “Estamos em meio às definições de coligação. Há, por exemplo, uma forte disputa entre PDT e PT pelo apoio do PSB. A meu ver, a manutenção da candidatura Lula é uma peça do jogo político que diz mais respeito ao futuro da política brasileira. O PT foi o partido que mais decaiu nas eleições de 2016, e está tentando minimizar os danos”, acrescenta.