Em toda campanha, o eleitor é forçado ao exercício mental de tentar imaginar o governo de cada candidato que se coloca a disposição para chefiar o país. Essa tarefa não é fácil, porém é essencial para que a escolha traga os melhores frutos para a sociedade. E como fazer essa projeção? Não existe outra forma se não através das propostas que cada candidato apresenta, a maioria delas disponíveis em seu plano de governo.
Embora todos os candidatos sejam obrigados a protocolar o plano de governo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), não existe um modelo deste documento que deva ser seguido. E basta uma passada de olhos rápida nos projetos para vislumbrar que cada partido e coligação optou por um formato de arquivo.
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Tem projetos com perfil acadêmico, com mais de duzentas páginas. Outros com estrutura de tópicos, não passando de 20 folhas. Baseado na série “Decifrando os candidatos”, publicada aqui na Gazeta do Povo com nove dos principais candidato a presidente, veja um compilado que caracteriza o plano de governo de cada candidato (por ordem alfabética) para auxiliar nesse cenário hipotético.
Alvaro Dias (Podemos)
Enquadra-se na linha dos liberais conservadores e seu projeto de governo, entregue ao TSE no momento do registro da candidatura, estabelece metas pontuais para que a gestão tenha o sucesso que ele espera. Político de longa tradição no Paraná, Alvaro Dias fez tudo o que era necessário para poder concorrer à chefia do Executivo. Passou por vários partidos até chegar ao Podemos, legenda pela qual é candidato nessa eleição.
Todo o projeto dele é inspirado no Plano de Metas do ex-presidente Juscelino Kubitschek e o presidenciável faz questão de demonstrar isso, citando JK em seu plano de governo. “A ideia das 19 metas foi inspirada no Plano de Metas do grande presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), que promoveu uma transformação no país através de um programa de industrialização e modernização levado a cabo ao longo dos cinco anos do seu governo na forma de um ambicioso conjunto de objetivos setoriais e regionais”, diz o documento.
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O candidato pautou sua campanha no combate à corrupção, ao ponto de declarar que convidaria o juiz federal Sergio Moro para chefiar o Ministério da Justiça. Contudo, o que mais chama atenção em seu “Plano de metas para refundar a República” é a facilitação do acesso ao crédito para pessoa física, que destinaria 70% de toda linha de crédito público para esse segmento.
Outra meta de Alvaro que chama a atenção é a intenção de que todos os alunos brasileiros possam estudar em período integral. Investimento em educação realmente é algo que pode fazer com que o Brasil mude sua posição em marcadores de desenvolvimento humano. Todo país em franco desenvolvimento aplicou boa parte de seus esforços em qualificar o ensino. Bons exemplos são a Coreia do Sul, a China e a Finlândia.
Ainda propõe uma revisão total da Constituição Federal, mas para isso, terá que ter apoio massivo do congresso nacional.
Cabo Daciolo (Patriota)
O candidato que se destacou nas redes sociais com memes e nos debates que participou (Band, RedeTV e Record), trouxe em seu plano de governo projetos para a “nação brasileira”, como ele costuma repetir nos debates. Trata-se de uma visão pessoal sobre os problemas morais do país e os pontos que sua administração irá se centrar: segurança, infraestrutura, educação e saúde.
Entre as mais impactantes de suas propostas está a “recuperação da soberania nacional”, que segundo o candidato será feita a partir do investimento de 10% do PIB brasileiro nas Forças Armadas e da retomada do capital nacional de áreas estratégica exploradas por entes estrangeiros, como é o caso da Petrobras.
Em setembro de 2017, então no PTdoB do Rio de Janeiro, Cabo Daciolo defendeu em discurso o fechamento do Congresso e uma intervenção militar no país. Em março deste ano, ao ser lançado pré-candidato pelo Patriotas, disse à Gazeta do Povo que não retirava “uma vírgula” do que havia dito sobre o fechamento do Congresso e afirmou ainda que a Câmara era dominada por uma quadrilha.
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Mais uma intenção ambiciosa do candidato é a pavimentação de 100% de toda malha rodoviária federal. Também promete auxiliar estados e municípios para que recuperem suas estradas. Em seu plano de governo, ele afirma que apenas 12% da malha viária federal é pavimentada, ou seja, restam 88% para serem asfaltados. Isso significa que ele planeja asfaltar cerca de 1,36 milhão de quilômetros de estradas, fora as de responsabilidade estadual e municipal que tiverem participação da União. Contudo, não fala de onde viriam os recursos para viabilizar este plano.
Ciro Gomes (PDT)
As diretrizes de governo do pedetista, como ele denomina seu plano de governo, deverão ser melhoradas com a ajuda de discussões com a população e a sociedade civil organizada. De toda forma ela está estruturada e visa um aquecimento do mercado, geração de empregos e retomada do desenvolvimento industrial do país.
Geração de emprego serve de base para todo o projeto. São nove páginas destinadas a mostrar como pretende ajudar as cerca de 13 milhões de pessoas desempregadas no Brasil, segundo os últimos dados do IBGE . Uma das estratégias é fortalecer a economia a partir da diminuição dos encargos tributários e das taxas de juros. Essas medidas estariam embarcadas nas reformas fiscal e tributária e atingiriam em cheio o setor industrial e a pequena, média e grande empresa.
Ciro Gomes defende também a expropriação de todos os poços de petróleo leiloados à empresas estrangeiras, assim como o rompimento do acordo entre Embraer e Boeing. Este acordo, ainda com vários pontos a serem ajustados, foi firmado com a proposta de proteger as duas empresas dos avanços das concorrentes russas, chinesas e da americana Airbus.
Algo peculiar de seu projeto é a adoção de planos de desenvolvimento a longo prazo. Isso seria parte de uma “reforma da gestão pública”, que tentaria romper com a lamentável tradição brasileira de uma gestão abortar os projetos iniciados por outras administrações. Isso se daria através da implementação de um processo dinâmico de planejamento de longo prazo, com um horizonte de 20 anos, no qual, a cada 4 anos, o planejamento seria atualizado para as próximas duas décadas, servindo de base para a elaboração dos planos plurianuais.
Fernando Haddad (PT)
O petista assumiu a candidatura no lugar do ex-presidente Lula, que foi impedido de integrar o pleito com base na Lei da Ficha Limpa, e também o plano de governo que o partido denominou como “Plano Lula de Governo”. O documento valoriza ações e projetos de mandatos passados do ex-presidente e aborda pontos como a retomada da participação em discussões mundiais e inúmeras reformas.
Com relação à política externa, o governo petista quer retomar a aproximação com países em desenvolvimento e com as gigantes Rússia, China e Índia. Segundo o projeto petista é preciso atuar de forma “altiva e ativa” para amenizar a polarização das decisões globais para a economia.
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“O Brasil precisa lutar para sediar o Arranjo Contingente de Reservas - ACR (fundo monetário dos BRICS), que está pronto para operar, assim como precisa contribuir para os avanços na formulação e participação no Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), que possui potencial para ser um dos maiores bancos de desenvolvimento do mundo”, diz o plano de governo de Fernando Haddad, do qual ele é um dos formuladores.
Ao que parece, reformar será uma das metas que nortearão o possível governo petista. O termo “reforma” foi usado 70 vezes no documento. Há previsão de reforma das leis trabalhistas, reforma do novo ensino médio, reforma tributária, reforma bancária, entre tantas outra.
Entre as reformas que não poderiam faltar nesse projeto, devido ao histórico do partido, é a reforma agrária. No primeiro governo Lula, aproximadamente 13 milhões de hectares foram desapropriados e deram origem a quase 32 milhões de hectares de projetos de assentamentos. Contudo, em seu segundo mandato, esse número caiu bastante e, no governo de Dilma Roussef, quase não existiu.
Esse novo projeto promete, além da desapropriação de áreas improdutivas e criação de assentamentos, tornar a vida no campo mais digna e atrativa, principalmente para o jovem agricultor. Um dos atrativos seria possibilitar internet banda larga em toda zona rural.
Geraldo Alckmin (PSDB)
O plano de governo tucano é enfático ao mostrar que a sua prioridade é a recuperação econômica do país. Uma redução de taxas e tributos para aquecimento do mercado, aliado ao incentivo aos setores geradores de emprego, na teoria, será a receita para tirar o Brasil do estado de estagnação. Na mesma linha, ele defende reunir alguns impostos que hoje são cobrados separadamente.
Em conjunto com essas medidas, defende a desoneração dos cofres públicos através da privatização de diversas estatais para assim zerar a dívida pública do país. A estratégia é que sem essa despesa, o país volte a ser atrativo para os investimentos de empresas estrangeiras caiam as taxas de juro. Ele pretende abrir a economia para que metade do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro seja proveniente de exportações. Ainda na linha econômica, promete uma reforma do Plano Safra, para que tenha um planejamento plurianual.
Na área da segurança pública, Geraldo Alckmin promete atuar para que as penas sejam mais rígidas, principalmente no que se refere à progressão de regime penal dos crimes graves e ao aumento do tempo máximo das medidas socioeducacionais . Essa proposta incide diretamente em dois pontos bem preocupantes da segurança pública: a superlotação dos presídios e unidades de socioeducação e os gastos públicos para manter o sistema prisional.
Outro ponto que se pode observar no documento tucano é como ele caminha em paralelo com o atual governo. Em nenhum momento são questionadas as ações e reformas do governo de Michel Temer. Quesitos como a reforma trabalhista, reforma política, reforma previdenciária, política externa e planos de educação parecem caminhar exatamente na mesma linha do projeto emedebista.
Outra semelhança é o posicionamento sobre a reforma política. Assim como o governo do MDB, o ex-governador de São Paulo enxerga no voto distrital uma das saídas de nossa maior crise política da era democrática.
Henrique Meirelles (MDB)
Ex-ministro da Fazenda do governo Michel Temer e ex-presidente do Banco Central no governo Lula, o candidato prioriza em seu programa ações na área econômica como forma de combater o desemprego e gerar renda. A meta dele é fazer o país voltar a crescer 4% ao ano.
Henrique Meirelles prometer trabalhar para que o orçamento federal seja mais transparente e impositivo, um formato que poderá fazer da discussão em torno de receitas e despesas do governo federal, pelo Congresso, um dos pontos mais importantes da atividade parlamentar, como nas democracias maduras.
Ele afirma ainda que vai simplificar o processo de concessões, possibilitando uma desconcentração dos investimentos, tanto em termos regionais como de tamanho. No caso das concessões plenas, promete reequilibrar o risco do empreendimento entre poder concedente e concessionário, evitando os extremos, atraindo, dessa forma, um universo maior de investidores com maior segurança jurídica.
Acelerar o processo de privatização, nas áreas em que isso for necessário, garantindo que os recursos públicos não escoem pelo ralo dos prejuízos das empresas que hoje dependem do Tesouro Nacional.
Financiamento, inovação, expansão dos projetos de pequenos irrigantes e melhoria da infraestrutura serão prioridades para que os agricultores sigam ampliando a produtividade. Outras medidas de apoio estão previstas, como o reforço da segurança no campo e a expansão da telefonia celular, graças ao satélite geoestacionário do Brasil.
Como forma de combater a corrupção, Meirelles diz que vai estabelecer um sistema aberto e interativo de planejamento, com a criação de “mesas de diálogo público-privado”, sob escrutínio da população e dos órgãos de controle.
Jair Bolsonaro (PSL)
Os pontos mais batidos pelo candidato do PSL têm sido a privatização de quase todas as estatais, facilitação do porte de arma para o cidadão, redução da maioridade penal e investimento na educação militar e o imposto de renda único.
Como assumiu em várias entrevistas que não intende nada de economia, passou todas decisões ao futuro ministro da Economia, pasta que substituirá o atuais Ministérios da Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio, Paulo Guedes, que passou a ser seu guru. Entre as propostas estão a venda de quase todas as estatais, o que geraria uma renda de aproximadamente R$ 800 bilhões, os quais seriam usados para diminuir a dívida pública com os bancos, e a criação de uma alíquota única de Imposto de Renda, cobrada de todos que tiverem renda mensal acima de cinco salários mínimos.
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Para segurança, além de incentivar que o próprio cidadão se proteja com uma arma de fogo, também pretende deixar mais rígidas as penas, progressões e saídas de detentos. Aliado a esse endurecimento carcerário, Jair Bolsonaro defende a redução da maioridade penal para 16 anos. Ainda, para que os policiais se sintam mais amparados, espera conseguir aprovar que a excludente de ilicitude, que já existe no ordenamento jurídico do país, seja ampliado para os agentes de segurança pública que cometerem homicídio durante operações policiais.
Na área da educação, o candidato vê nos moldes dos colégios militares a solução para a falta de disciplina e qualidade das instituições públicas. Ele promete a criação de um colégio militar em cada capital brasileira, que servirá de base para o ensino das demais escolas. Também é a favor do projeto “Escola sem partido”, que defende a retirada de qualquer tema ideológico da grade de ensino, principalmente no que concerne a ideologia de gênero.
João Amoêdo (Novo)
A proposta do Novo é ousada: fazer um governo sem políticos de profissão. Fala em seu plano de governo que sua candidatura não se trata de um projeto pessoal, mas sim parte de um esforço para mudar como a política é feita no Brasil. Nesse sentido fará uma reforma na estrutura de governo com a extinção de metade dos ministérios, que passariam a ser 12, segundo o presidenciável.
Outra promessa é que cada pasta será chefiada por pessoas técnicas, sem a interferência de indicações políticas e que cada servidor terá que responder positivamente à avaliação de produtividade e cumprimento de metas.
Também promete privatizar 100% das empresas públicas, assim como todo o ensino superior. Outro foco dessa desvinculação do controle do Estado está a administração dos presídios. João Amoêdo credita que parcerias público-privadas seriam a solução para resolver a precariedade do sistema prisional do Brasil. Hoje, a população carcerária brasileira é a quarta maior do mundo, ficando atrás apenas de Estados Unidos, China e Rússia.
A educação básica tem um papel fundamental no projeto do candidato. A intenção é inverter a lógica de investimento que rege o sistema educacional brasileiro. Atualmente, o país investe três vezes mais no ensino superior do que na educação básica. A intenção é mudar esse cenário. Aportar maior investimento na base educacional da população e deixar que a iniciativa privada invista no ensino superior, a exemplo de países que se tornaram exemplos para o mundo, como a Coreia do Sul.
Uma curiosidade de seu plano de governo é que mesmo com uma visão super liberal de administração, pretende manter os investimentos em programas sociais. Ele, inclusive, elogia Bolsa Família, o qual exige contrapartidas para o recebimento, como assiduidade escolar das crianças, e coloca o Estado como garantidor de uma cidadania plena.
A crítica ao modelo atual é com relação ao fato de o programa não ter “porta de saída”. “(...) é preciso criar alternativas para que cada vez mais pessoas deixem os programas assistenciais e passem a conseguir manter sua vida e sua família sem a dependência do Estado”. Ele defende que essa saída deve se dar através de capacitação profissional e da geração de empregos.
Marina Silva (Rede)
No pleito de 2014, ela foi duramente atacada por não sair de cima do muro, e não querer desagradar nenhum setor da sociedade. Nesta campanha, seu programa de governo toca em pontos cruciais da administração pública, entre eles a reforma política e a atenção ao saneamento básico, mas ainda revela sua reticência em desagradar quando toca no tema da reforma agrária.
A candidata defende a democratização dos processos partidários e adoção do sistema distrital misto, como substituto ao sistema político atual. Este modelo define que parte das cadeiras no Legislativo (normalmente, a metade delas) seja disputada nos distritos e a outra parte seja determinada pelo voto em legenda, o que abre espaço para a eleição de candidatos ligados mais a causas que a regiões geográficas, e permite que partidos que contem com uma parcela minoritária da simpatia do eleitorado também se vejam representados. Também promete atuar para acabar com a reeleição para cargos do Poder Executivo, que passariam ter mandatos de cinco anos.
Com relação ao saneamento básico, Marina Silva propõe um investimento massivo, inclusive com a participação da iniciativa privada. O norte brasileiro apresenta péssimos índices de saneamento, o que interfere diretamente no sistema de saúde do país. E mesmo as outras regiões não desfrutam de um tratamento de esgoto adequado, o que onera empresas que usam água em sua produção e poluem o meio ambiente.
“Para superar esse problema [de saneamento] apoiaremos a criação de capacidades institucionais nos Municípios para que os PMSBs [Planos Municipais de Saneamento Básico] sejam elaborados de forma adequada, permitindo que os projetos de implantação e gestão tenham qualidade, condição essencial para o acesso aos recursos públicos e atração de investimentos privados”, promete.
O termo reforma agrária não é exposto expressamente no texto do documento, mesmo que a presidenciável aborde a remarcação de terras indígenas e redistribuição de terras improdutivas . E antes de abordar esse tema, trata de tudo aquilo que a bancada ruralista espera ouvir de um presidente, como o incentivo a exportação, redução de tributos e expansão das tecnologias da Enbrapa. Mostrando que ainda há resquícios do “projeto em cima do muro” de 2014.
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