No Brasil, há 11 mil obras paralisadas, que já consumiram R$ 143,7 bilhões em recursos públicos e, por diversos tipos de problemas, até agora não cumprem sua função, de ajudar a melhorar os serviços de infraestrutura do país e até mesmo outras áreas vitais, como saúde e educação. A retomada dessas obras pode ser a oportunidade para o próximo presidente gerar empregos e reaquecer a economia brasileira.
Mas limpar a lista de obras paradas no país também representará um desafio: conseguir os recursos bilionários para terminar os projetos e, antes disso, fazer uma análise minuciosa sobre as causas das paralisações. Além disso, demandará coragem do governante para enterrar parte dos investimentos já feitos e declarar que alguns desses projetos nunca sairão do papel.
O candidato Jair Bolsonaro (PSL) e seus técnicos para economia e energia já afirmaram que não iniciarão novas obras enquanto houver projetos paralisados. E Ciro Gomes (PDT) vê na retomada das obras uma forma de ajudar a gerar empregos na construção civil.
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A conta acima foi feita pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), que avalia que o custo das obras paralisadas implica ainda na contenção de um aumento de 1,8% na economia do país em curto prazo, além de um ganho na capacidade de crescimento do país de 0,65% de forma duradoura, ou R$ 42 bilhões ao ano.
O setor de construção, que reúne as empreiteiras, avalia ser essencial que o próximo presidente encare o problema das obras com atrasos, o que pode ajudar a destravar a economia e ainda trazer ganhos de produtividade e emprego para o país, diz José Carlos Martins, presidente da CBIC.
“Eu acho vital (retomar as obras). É uma coisa que só tem de continuar o que está parado. Ou seja, o novo presidente chega, analisa porque essas obras estão paralisadas e adota uma decisão com firmeza, para resolver. Se não foram concluídas, é porque está pegando em algum lugar. Tem de analisar o que está pegando, fazer um levantamento de campo”, avalia Martins.
Por que parou, parou por quê?
As causas das interrupções são diversas, incluindo a má gestão, problemas com sócios privados, e até corrupção. Um caso emblemático é a usina termonuclear de Angra 3, no Rio de Janeiro, que está paralisada desde 2015, como reflexo da Operação Lava Jato. Ela já custou R$ 12 bilhões e precisará de mais R$ 17 bilhões para ser concluída, caso essa seja a vontade do novo governo.
Parte desse governo é recurso público, investido por meio da empresa estatal Eletrobras, que é sócia de grupos privados no projeto. Técnicos do governo estão concluindo um estudo sobre o tema, que será apresentado ao presidente Michel Temer, para que uma decisão seja tomada.
Nesse processo, o governo terá de ter coragem para investigar os problemas e admitir onde não será possível seguir em frente, quais obras devem ser enterradas e quais continuadas. “Tem de ser analisado e dado uma solução. Pois se for para alguém perder dinheiro, (o investidor) não vai”, disse Martins.
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Eleger as prioridades também é fundamental, aponta o presidente da CBIC. Como não há dinheiro para tocar todas as obras paradas, será preciso clareza para definir por onde começar. “Ver quais são, por exemplo, as 200 obras mais prioritárias, porque não tem recursos para tudo. É creche? Ou é Angra 3? Se o governo concluir que vai faltar energia, então toca Angra 3. Tem de botar na mesa, à luz do dia, e ver o que se faz”, avalia o representante das empreiteiras.
Temer tentou criar um programa para tirar do papel as obras paradas e lançou, em 2017, o “Agora é Avançar”, com recursos previstos de R$ 76 bilhões. Mas o panorama pouco mudou.
Segundo o Painel de Obras do governo federal, gerido pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, que monitora 103.555 obras em todo o país (iniciadas de 1998 até hoje), apenas 42% estão concluídas ou em fase de prestação de contas. Outras 8,25% estão canceladas, 5,39% estão em ação preparatória e a maioria (43%), em execução.
A conclusão de obras viárias, por exemplo, traria benefícios como melhor escoamento de produção agrícola. Já obras de saneamento ajudariam a reduzir a quantidade de doenças, pontua a CBIC.
Outro problema são os prazos. As obras de infraestrutura demoram para ser concluídas. É provável que mesmo retomando obras paradas, a maioria ainda não seja entregue no mandato do próximo presidente. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o tempo médio de construção de uma usina hidrelétrica é de 45 meses. Uma pequena central hidrelétrica demora em média 29 meses para ser construída, seguida por 24 meses para usinas térmicas, 18 meses para eólicas, e um ano para fotovoltaicas.
No setor elétrico, 22,7% dos projetos de geração e 42% de transmissão estão atrasados
Mesmo no setor elétrico, um dos mais organizados e que conta com grande participação de recursos privados para realização de investimentos, 22,7% dos projetos de usinas em construção no país (de todas as fontes) têm “baixa” viabilidade de conclusão e não têm previsão de entrega, de acordo com levantamento feito pela Aneel, publicado em setembro deste ano. São cem usinas nessa situação.
Dos 24 mil megawatts (MW) previstos para serem entregues de 2018 a 2025, de energia de todos os tipos, quase 5 mil MW são classificados com “baixa” possibilidade de entrega, por motivos como falta de licenciamento ambiental, problemas de financiamento ou questões judiciais, que podem impedir a implantação da usina.
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O maior percentual de problemas, em comparação ao total de obras, é entre as usinas térmicas. 34% da energia prevista para ser entregue por usinas térmicas a serem concluídas deste ano até 2025 tem “baixa” viabilidade. Entre esses problemas está a Usina Termelétrica Mauá 3, no Amazonas, que começou a ser construída em 2012 e hoje tem problemas de operação, por falta de gás para que ela opere. A empresa que opera a usina, a Eletrobras Amazonas, tem dívidas bilionárias com a Petrobras. A petroleira se nega a fornecer gás para a usina, que alega ter contratado gás até 2042. Porém, o prazo de concessão do gasoduto termina em 2030.
Na área de transmissão de energia, dos 371 empreendimentos em andamento, 154 estão atrasados, o que equivale a 42% do total. Entre os empreendimentos com problemas estão parte das linhas que foram licitadas durante o governo Dilma Rousseff.
Durante o governo petista, as estatais do setor participavam dos leilões de geração e transmissão entrando em projetos com taxas de retorno que depois se mostraram inferiores ao ideal para que os projetos saíssem do papel. Esse modelo também previa que as estatais se associassem a empresas privadas para realizar os projetos em Sociedades de Propósito Específico (SPE), que eram muito favoráveis para os sócios privados, que reduziam seus riscos ao terem o governo como sócio, e ainda conseguiam empréstimos com bancos públicos.
Foi nesse modelo que o grupo JBS, de Joesley Batista, expandiu sua atuação do ramo de frigoríficos para o setor elétrico, ao ser sócio de usinas eólicas. Nenhuma das 13 eólicas do grupo que foram contratadas pelo governo sequer saiu do papel e diversas obras de transmissão estão em atraso.
Outro caso é o da empresa espanhola Abengoa. A empresa participou de leilões e ganhou ao oferecer a menor tarifa para construir as linhas. Porém, a empresa teve problemas financeiros na Espanha e alegou que não conseguiria realizar as obras pelo valor proposto. Depois de um longo processo de negociação e questionamentos na justiça, em 2017 o governo federal conseguiu declarar caducidade e retomar as concessões, para leiloá-las novamente. Isso, porém, causou atrasos nessas obras.
Esse tipo de situação não é raro no setor de transmissão elétrica. Atualmente, a Eletrosul (do grupo Eletrobras) enfrenta problemas com linhas que a empresa arrematou em leilão em 2014. Alegando problemas financeiros, a Eletrosul alega que não conseguirá entregar as obras. A empresa procura um sócio para ajudar a tocar o projeto, em atraso e com problemas financeiros. Os projetos deverão ter a concessão revogada para serem novamente leiloados, caso a sociedade com um grupo chinês, que está sendo costurada pela Eletrosul, não dê certo.
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