Uma denúncia sobre crime eleitoral sacudiu a campanha presidencial nesta quinta-feira (18), causando repercussão nas coligações de Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL), que disputam o segundo turno da eleição para suceder Michel Temer.
O aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp seria usado em uma suposta campanha de difamação com objetivo de influenciar a corrida ao Palácio do Planalto. A votação em segundo turno será realizada no dia 28 de outubro. Veja tudo o que se sabe até agora e tire suas próprias conclusões:
Do que trata a denúncia?
O jornal Folha de S. Paulo denunciou a suposta compra de pacotes de mensagens para impulsionamento em grande escala no WhatsApp. O objetivo seria atingir o PT e a campanha de Fernando Haddad às vésperas do segundo turno da eleição presidencial.
Segundo a reportagem, empresas que apoiam a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) estariam por trás da iniciativa. Cada contrato chegaria a custar R$ 12 milhões. A distribuição de centenas de milhões de mensagens ocorreria nos dias quer antecedem a votação.
Quais as consequências até agora?
A assessoria jurídica da campanha de Fernando Haddad entrou com uma ação de investigação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a chapa Jair Bolsonaro/Hamilton Mourão e as empresas responsáveis por supostamente bancar a compra dos pacotes de mensagens.
A alegação é abuso de poder econômico e uso indevido dos veículos e meios de comunicação digital com objetivo de causar desequilíbrio nas eleições.
A ação foi aceita. Corregedor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Jorge Mussi decidiu na noite desta sexta-feira (19) abrir uma investigação para apurar a suspeita de compra de disparos em massa de mensagens anti-PT pelo WhatsApp.Mussi mandou notificar Bolsonaro e abrir prazo de cinco dias para que ele se manifeste. Além disso, o PDT de Ciro Gomes ingressou com pedido de anulação do primeiro turno da campanha presidencial deste ano.
Já a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu à Polícia Federal a abertura de inquérito para apurar se empresas têm disseminado, de forma estruturada, mensagens em redes sociais referentes a Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (PSL).
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O WhatsApp enviou notificação extrajudicial para as agências Quickmobile, Yacows, Croc services e SMS Market determinando que parem de fazer o envio de mensagens em massa e de utilizar números de celulares obtidos pela internet e baniu as contas associadas a essas agências.
Outras contas foram bloqueadas, inclusive a de Flávio Bolsonaro (PSL), filho de Jair Bolsonaro e senador eleito pelo Rio de Janeiro. Segundo a Folha, a conta foi banida há alguns dias porque a plataforma detectou movimento anormal a partir de queixas de usuários que disseram ter recebido spam do número.
O que é e como funciona a distribuição em massa de mensagens?
Segundo a reportagem da Folha, as empresas compram um serviço chamado “disparo em massa”, usando base de usuários fornecido pelo próprio candidato ou bases vendidas por agências de estratégia digital. Listas de contatos muitas vezes são fornecidas ilegalmente por empresas de cobrança ou por funcionários de empresas telefônicas.
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Quando usam bases de terceiros, essas agências oferecem segmentação por região geográfica e, às vezes, por renda. Enviam ao cliente relatórios de entrega contendo data, hora e conteúdo disparado.
Os preços variam de R$ 0,08 a R$ 0,12 por disparo de mensagem para a base própria do candidato e de R$ 0,30 a R$ 0,40 quando a base é fornecida pela agência.
Existe crime eleitoral nessa prática?
Se ficar comprovada, a denúncia configura crime eleitoral. A Lei Eleitoral proíbe que pessoas jurídicas façam doação de campanha para candidatos. A mudança foi introduzida pela mais recente reforma eleitoral (Lei nº 13.165), em 2015. Apenas pessoas físicas podem fazer contribuições eleitorais, desde que declaradas à Justiça.
A reportagem não apresenta provas da suposta compra e vínculo de empresas com a coligação de Bolsonaro. É possível que seja uma ação voluntária de empresários, sem interferência alguma da campanha do capitão reformado. A Folha fala em uma ação de “empresas”, mas cita apenas a rede varejista Havan entre as compradoras dos pacotes. O dono da empresa, Luciano Hang, é, de fato, um bolsonarista assumido. Mas disse à reportagem desconhecer a denúncia e não fazer impulsionamento nas redes sociais.
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A Folha também não deixa claro se o objetivo dos empresários é perpetrar uma campanha de difamação, com uso de fake news (notícias falsas). Fala-se somente em “mensagens contra o PT”. Também é factível que as mensagens visem apenas reforçar a candidatura Bolsonaro – uma diferença importante.
Bolsonaro tem envolvimento?
O presidente do PSL, Gustavo Bebianno, negou que a campanha receba ajuda de empresas para divulgar nas redes sociais notícias contra o PT. “Nem o PSL nem a campanha do candidato Jair Bolsonaro e muito menos o candidato Jair Bolsonaro se prestam a esse tipo de papel. Toda e qualquer doação feita até hoje, fosse para o PSL, fosse para a campanha do candidato, são recursos doados via nossa plataforma, de acordo com a legislação”, afirmou.
Questionado se a campanha contratou alguma empresa para impulsionar conteúdo na internet, ele disse que não. “Nunca fizemos qualquer tipo de impulsionamento, de direcionamento. O nosso crescimento é orgânico. Muito antes de começar a pré-campanha, o candidato Jair Bolsonaro já tinha uma rede social muito, muito grande. Como ele tem esse diálogo direto e verdadeiro com a população, é um trabalho voluntarioso feito por pessoas pelo Brasil afora, coisa que o PT não tem”, afirmou.
Bolsonaro reconheceu que a prática fere a lei, mas disse não ter controle sobre ações de empresas. “Eu não tenho controle se tem empresário simpático a mim fazendo isso. Eu sei que fere a legislação. Mas eu não tenho controle, não tenho como saber e tomar providência”, afirmou.
Ele sugeriu ainda que essas ações possam estar sendo feitas por pessoas de esquerda para prejudicá-lo. “Pode ser gente até ligada à esquerda que diz que está comigo para tentar complicar a minha vida me denunciando por abuso de poder econômico”, disse ao site “O Antagonista”.
O PT também já usou desse expediente?
Em agosto, o PT também foi acusado de pagar por propaganda eleitoral ilegal no Twitter e no Facebook no caso que ficou conhecido como Mensalinho do Twitter. Empresas ligadas ao deputado federal Miguel Corrêa (PT-MG), a agência Lajoy e a Follow Análises Estratégicas, foram denunciadas por influenciadores digitais. Um mês depois, o Facebook removeu 11 páginas e 42 perfis administrados pela empresa Follow. Segundo o Facebook, as páginas violavam as políticas de autenticidade da rede social.
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Na ocasião, sobre as acusações de que as empresas do deputado teriam pago pessoas para promover conteúdo favorável ao seu partido nas redes sociais, Corrêa disse que “nunca houve um contrato com uma única pessoa com esse objetivo.” “Eu desafio qualquer um a provar isso com um único depósito relativo a minhas empresas.”
O que pede o PT?
O PT pede que a Corte eleitoral declare a inelegibilidade de Bolsonaro para os próximos oito anos após a eleição atual; a busca e apreensão de documentos na sede da Havan e na residência de Luciano Hang; e que o aplicativo WhatsApp apresente em 24 horas um plano de contingência para suspender o disparo em massa de mensagens ofensivas ao presidenciável petista.
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No pedido, o TSE é solicitado a requerer a Luciano Hang documentação sobre eventual contribuição feita em apoio a Bolsonaro. Em caso de negativa, pede que seja expedido mandado de prisão contra o empresário. O partido pede também a oitiva e a quebra de sigilo bancário, telefônico e telemático dos citados na ação, que também engloba outras empresas apontadas como responsáveis pela onda de mensagens na rede social.
Já o PDT, do presidenciável derrotado Ciro Gomes, estuda entrar com outra ação no TSE questionando o resultado do primeiro turno da eleição presidencial pelo que chamou de suspeita de “fraude eleitoral. Ciro ficou em terceiro lugar no primeiro turno.
Já o empresário Luciano Hang, em transmissão ao vivo na internet, chamou a reportagem da Folha de “mentira” e “fake news”, e afirmou que processará o jornal por danos morais.
A denúncia pode resultar na anulação do pleito?
O TSE vai designar um relator para o caso, que pode se manifestar liminarmente atendendo aos pedidos do PT, caso acredite haver indícios suficientes que configurem os crimes citados na alegação, ou ainda rejeitar o pedido de investigação, se considerar que não há elementos para tal.
A petição do PT não solicita a anulação do resultado da eleição em primeiro turno. Porém, o PDT já entrou com pedido de nulidade da eleição. Nesse caso, como o partido de Ciro Gomes seria parte prejudicada no resultado das urnas abertas em 7 de outubro, é possível que o relator do TSE decida por suspender temporariamente o resultado da eleição em primeiro turno, enquanto não se aprecia o mérito da ação.
Mas é muito improvável que isso ocorra. Em 2014, o PSDB questionou o resultado da eleição presidencial sob alegação de abuso de poder econômico e o processo tramitou na Corte por três anos até ser rejeitado, confirmando a vitória da chapa Dilma/Temer.
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