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| Foto: Marcelo Chello/Estadão Conteúdo

Na reta final da definição de coligações e chapas para eleições, a ordem é atrair o maior número de apoios. É o caso do presidenciável Ciro Gomes (PDT), que tenta trazer para sua candidatura partidos com visões antagônicas ao posicionamento que ele diz ter e com o qual tenta convencer parte do eleitorado, de centro-esquerda, a votar nele. A negociação com o Democratas, em fase avançada, mas ainda incerta, é um desses movimentos que parecem estranhos programaticamente, mas mostram o que Ciro e DEM tem em comum: fome pelo poder. 

“Eu não vejo nenhuma conexão ideológica entre os dois projetos. Então você cai para um segundo ponto, que é projeto de poder. Ciro tem sido visto como uma opção menos pior do que as outras que estão colocadas, por alguns grupos”, avalia Leonardo Barreto, doutor em Ciência Politica pela Universidade de Brasília (UnB).

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“O DEM tem o desejo do poder no DNA, assim como o MDB. Ensaiaram uma candidatura Rodrigo Maia que não avançou, e estão nesse mercado pré-eleitoral buscando alianças”, aponta o cientista político André Pereira César, da Hold Assessoria Parlamentar. 

Dentro do DEM, não é hegemônico o aval à aliança com Ciro. A negociação é capitaneada por ACM Neto, presidente do partido e prefeito de Salvador (BA), mas há grupos na legenda que preferem apoiar a candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) ou mesmo de Jair Bolsonaro (PSL). Porém, com dúvidas sobre a força e viabilidade desses pré-candidatos, tanto o DEM como Ciro podem ganhar com uma aliança, mesmo que com quase nenhum alinhamento programático.

“Para alguns, o Bolsonaro é completamente imprevisível, embora tenha agenda que declara ser liberal. E do outro lado o Alckmin, que teria conexão natural com esses grupos, tem sido visto como inviável eleitoralmente. Por exclusão sobrou o Ciro, que combina chance efetiva de vencer a eleição, com algum nível de construção de hegemonia no Nordeste”, diz Barreto. 

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O líder do DEM na Câmara, deputado Rodrigo Garcia (SP), engrossa o time contrário ao apoio a Ciro dentro do partido. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), participa das negociações com alas do DEM e Ciro, mas também não revelou seu apoio ao pedetista. Ele esteve com ACM Neto e Ciro em encontro em São Paulo no último final de semana.

Na equipe de Maia e do DEM em Brasília, predomina a incerteza sobre qual rumo o partido tomará. “Eles vão decidir nos 45 minutos do segundo tempo”, diz um técnico. A negociação seguirá intensa até o dia 2 de agosto, quando o DEM faz sua convenção e deve anunciar suas alianças e candidatos. 

Em jantar na noite de quarta-feira (18), o DEM e demais partidos que formam o chamado Centrão reafirmaram a união do grupo e a estratégia de anunciar apoio em bloco a um dos presidenciáveis. Reservadamente, líderes do Centrão têm dito que uma aliança com o PSDB possui ligeira preferência no bloco hoje. Até a semana passada, Ciro tinha mais força. Porém, recentes declarações polêmicas do pré-candidato do PDT provocaram desgaste e receio nos partidos. Nesta quinta-feira (19), o grupo divulgou nota informando que postergou para a próxima semana o anúncio sobre quem irão apoiar.

Da Arena ao lulopetismo

Apesar de tentar se projetar com a provável impossibilidade da candidatura do ex-presidente Lula, ligando-se mais à esquerda e com propostas antirreformistas, Ciro tem diversas trocas de partido em sua carreira política, começando pelo PDS no final do período da ditadura, criado a partir da Arena – partido que dava base de sustentação aos militares. 

O atual pré-candidato do PDT também integrou o PMDB, e depois o PSDB, o que o levou a assumir o Ministério da Fazenda em setembro de 1994, durante o governo de Itamar Franco. Depois, migrou para o PPS, partido pelo qual disputou as eleições presidenciais em oposição a Fernando Henrique Cardoso. No governo Lula, ele também foi ministro, da Integração Nacional. Em 2006, migrou novamente, indo mais à esquerda no espectro partidário, para o PSB, partindo depois para seu partido atual, o PDT. Porém, ainda hoje, Ciro mantém laços com tucanos importantes, como o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). 

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“Ciro não é um cara de partido. Da Arena, ele passou por todos os partidos”, explica o cientista político André César, da Hold Assessoria Parlamentar. “E com a incerteza geral que estamos vendo, reforça essas ideias de juntar DEM com PSB”, avalia. 

Além da percepção de que com Ciro o DEM pode chegar com mais força na Esplanada dos Ministérios no próximo governo federal, essa aliança também pode ser importante para ambos por tentar tirar parte da influência do PT e de Lula na Região Nordeste. Principalmente para angariar votos e favorecer palanques no Nordeste, a aliança Ciro/DEM pode fazer sentido nas urnas. 

Depois da redemocratização, o então PFL (partido que originou o DEM) era conhecido como “Partido do Nordeste”, com grande força no eleitorado da região. Depois da ascensão do PT e crescimento de Lula na região, o Democratas perdeu influência.

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“Talvez eles (do DEM) estejam encontrando no Ciro um ‘cavalo de troia’ para voltar a ter hegemonia no Nordeste”, avalia o cientista político Leonardo Barreto. “Pelo fato de essa articulação estar sendo conduzida por ACM Neto, talvez você tenha uma estratégia de recuperar o Nordeste, que foi reduto do antigo PFL”, pontua.

Governo Frankenstein 

Alianças como a que está em gestação entre DEM e Ciro expõem o DNA do chamado presidencialismo de coalizão, no qual para obter base de apoio no Congresso, o presidente da República loteia cargos e ministérios e os distribui entre os partidos. 

Apesar de Ciro defender pautas com viés mais desenvolvimentista (colocando-se contra reformas e propondo uma pauta econômica de controle cambial, limite para pagamento da dívida pública e subsídios para alguns setores), e o DEM assumir majoritariamente posição pró-reformas e com viés mais liberal, justifica-se a tentativa de aliança na possibilidade de conseguir maior participação em um eventual governo Ciro. 

Porém, um ministério Ciro com ministros do DEM se transformaria em um “ministério Frankenstein”, sem uma unicidade. ”Num período eleitoral, eles até conseguem disfarçar os problemas. Mas depois se tem uma coalizão de governo Frankenstein, dessas que a gente está acostumado. Elas não funcionam somente na base de ideias, de adesão a um projeto. Funcionam na base de distribuição de ministérios. O sistema funciona, mas a um preço altíssimo”, avalia Barreto. 

André César também vê na atual tentativa de aliança um retrato do esgotado presidencialismo de coalização. “Uma coisa é ganhar a eleição. Você faz um grande guarda-chuva, e vence. Outra coisa é governar. A síntese do mensalão veio aí. Ciro vai vir, eu imagino, com todos esses problemas, mas ele é inteligentíssimo, sabe jogar. Não é amador e nessa ele faz o cálculo político, dividindo em dois: até ganhar a eleição, e depois disso. Primeiro ele tem de pensar na eleição. Se ganhar, a partir daí ele pensa como vai governar”, avalia.

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