| Foto: EVARISTO SA/AFP

“Por ser homem, o senhor considera que existem terrenos em que o senhor não possa ou não saiba atuar?” A pergunta pode parecer estranha, mas só porque está com o gênero invertido. A troca foi feita pela pré-candidata à Presidência da República pelo PCdoB, Manuela D’Ávila, para chamar a atenção para os questionamentos com viés machista que ela já precisou responder durante entrevistas.

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Em vídeo divulgado na última terça-feira (10) em suas redes sociais, Manuela citou 17 perguntas que já foram feitas a ela e que candidatos homens jamais precisaram responder. Invertendo o gênero de propósito, a pré-candidata destacou o machismo institucional que precisa enfrentar em sua trajetória política.

Ela avalia que perguntas como essa são estimuladas por uma cultura machista que ainda é regra no Brasil. “Quantas mulheres chegam aos espaços de poder? Poucas! E depois que chegam, lá dentro, quantas são poderosas? Quantas são líderes de bancadas ou presidem comissões? A cultura machista é muito enraizada e ainda é muito pequeno o número de mulheres na política, então raciocínios como esse da pergunta são mais comuns do que a gente pensa.”

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“Uma das coisas que eu mais faço como pré-candidata à Presidência é conceder entrevistas. Mas hoje eu vou fazer algumas perguntas para vocês fazendo o jogo do espelho, para que vocês percebam as perguntas que só eu respondo nesta eleição”, explica ela no início do vídeo.

Em uma entrevista recente de Manuela ao programa Roda Viva, da TV Cultura, ela foi interrompida ao menos 40 vezes enquanto tentava formular suas respostas, segundo levantamento feito pela “Folha de S.Paulo”. Em suas participações no mesmo programa os pré-candidatos Ciro Gomes (PDT) e Guilherme Boulos (Psol), por sua vez, foram interrompidos oito e nove vezes, respectivamente.

“O senhor se depila?”; “Sua situação política fez com que os planos de casamento e paternidade ficassem em segundo lugar?”; “Homens públicos fortes assustam as mulheres. Como sua esposa reage a isso?”; “Por que seu filho nunca está com o senhor nas atividades públicas?”; “O senhor sofreu preconceito por ser homem?”; “Em algum momento, ser bonito lhe ajudou na carreira política?”; “O que o senhor faz para manter o peso?”

Essas são, de fato, perguntas que não costumam ser feitas a candidatos homens. Seu equivalente feminino, no entanto, é comum, tratado como natural.

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Casos anteriores

Manuela não é a primeira mulher a passar por esse tipo de situação no universo da política. Na campanha de 2010, quando Dilma Rousseff (PT) era candidata ao primeiro mandato, a própria Manuela denunciou um caso de machismo naturalizado envolvendo a presidente. Naquela ocasião, um jornal havia publicado uma análise das roupas usadas por Dilma.

Em uma entrevista ao New York Times em abril de 2017, a ex-presidente contou que “havia padrões diferentes para homens e mulheres. Me acusaram de ser dura e severa, enquanto um homem seria considerado firme e forte. Fui vista como alguém obcecada com o trabalho e um homem teria sido visto como muito trabalhador”. Dilma ainda lembrou os muitos episódios, ao longo da campanha presidencial, em 2014, durante seu governo e quando o processo de impeachment já corria, em que foi chamada de “vaca”.

Outro exemplo do machismo institucional tem a ver com um assunto que segue atual, os altos preços dos combustíveis. De acordo com a Agência Nacional de Petróleo (ANP), em julho de 2015 o preço médio da gasolina no Brasil era de R$ 3,29. Uma alta nos preços naquele período fez surgir um adesivo que retratava a presidente de pernas abertas e que era colado na entrada dos tanques de combustível dos veículos. Em 2018, embora a gasolina tenha custado em média R$ 4,55 no mês de junho, o último divulgado pela ANP, nenhum ataque do mesmo nível foi feito contra o presidente Michel Temer (MDB).

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Manuela lembra, ainda, do caso da deputada federal Maria do Rosário (PT). “O caso mais emblemático, sem dúvida, foi a sequência de ofensas proferidas pelo Bolsonaro contra a Maria do Rosário no plenário da Câmara dos Deputados. Apologia escancarada à cultura do estupro.”

Em 2014, o também deputado e agora pré-candidato à Presidência Jair Bolsonaro disse a ela, em plenário, que “tu me chamou de estuprador, no Salão Verde, e eu falei que não ia estuprar você porque você não merece”. Em agosto de 2017, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) de condenar o deputado a pagar uma indenização de R$ 10 mil a Maria do Rosário. Bolsonaro também é réu em outras duas ações, ambas tramitando no Superior Tribunal Federal (STF), por injúria e incitação ao crime.

Luciana Genro (PSol) também já reclamou por ter sido vítima do machismo institucional. “É inaceitável que alguns jornalistas sigam utilizando o espaço privilegiado que possuem na mídia para propagar machismo”, disse, em fevereiro de 2015, em sua conta no Twitter.

Quando era candidata à Presidência, na campanha de 2014, Luciana protagonizou uma cena com o então candidato do PSDB, Aécio Neves. Durante um dos debates na televisão, depois de ser questionado por Luciana sobre o aeroporto de Cláudio, em Minas Gerais, Neves chamou a candidata do PSol de “leviana” e levantou o indicador para ela. Luciana o repreendeu dizendo “você não levante o dedo para mim”.

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Em junho deste ano ela trouxe o assunto de novo à tona ao comentar o ocorrido com Manuela no Roda Viva. “Somos interrompidas a todo momento. Também levamos dedo na cara com frequência, como ocorreu comigo num debate presidencial.”