O candidato a presidente Fernando Haddad (PT) sugeriu mudanças na atuação das polícias. Ele quer que a Polícia Federal (PF) passe a coordenar todas as demais polícias do país e, para isso, deve propor mudança na legislação, se eleito. A ideia, porém, desagradou aos policiais, que veem isso como uma perda de poder e quebra do pacto federativo. Os próprios policiais federais, que em tese ganhariam mais poder, entendem que a proposta reduziria o papel e a importância dos especialistas dentro da entidade.
Em um momento em que o combate à corrupção e a segurança são uns dos assuntos de mais peso nestas eleições, na esteira do sucesso da Operação Lava Jato, Haddad tenta projetar isso em seu plano de governo. Para isso, apostou em usar a marca da Polícia Federal.
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"A Polícia Federal vai passar a atuar na segurança pública do país pela primeira vez na história”, afirmou durante um evento de campanha em Feira de Santana (BA) neste mês. “Eu vou mudar a lei e a Polícia Federal, que é uma polícia civil, que tem inteligência e técnica, vai atuar na segurança pública e vai coordenar todas as demais polícias do país", disse Haddad.
Em seu plano de governo, no capítulo que trata da “segurança pública cidadã”, o candidato petista diz que “ a modernização do sistema institucional de segurança e a consequente reforma das polícias não podem mais ser adiadas”. Afirma, ainda, que “é preciso avançar também no debate sobre a militarização das polícias”.
Representante dos PMs de SP critica a proposta
A proposta foi duramente criticada por representante dos policiais militares. O coronel da PM de São Paulo, Elias Miler da Silva, presidente da Associação dos Oficiais da Polícia Militar do Estado de São Paulo (Defenda), destacou a dificuldade em se aprovar algo desse tipo, que seria inconstitucional por quebrar o pacto federativo.
Para o coronel Miler, a proposta de Haddad “é um golpe”. “Isso é um golpe no Estado Democrático de Direito. O Brasil é um Estado federado. No pacto federativo, a União não manda. Se foi o Haddad que fez essa proposta, ou quem fez para ele, é um analfabeto jurídico”, diz o coronel, que considera que a proposta teria contornos ditatoriais, por centralizar o poder na mão do presidente.
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O representante dos PMs ainda aponta que, apesar de tentar embarcar na fama e no sucesso da Lava Jato, a proposta de Haddad deve surtir pouco efeito sobre o combate ao crime.
“A Polícia Federal não dá conta nem da atividade dela. Veja o que a PF reduziu de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro? Nada. A PF parece eficiente por conta da Lava Jato, mas prendendo empresários e políticos”, afirmou.
Policiais federais também são contra a ideia
Mesmo entre os policiais federais, que aparentemente teriam mais poder com a mudança, a proposta é criticada. “Essa proposta é generalista. De algo que pode ser muito pesado, burocrático e que não vai ter a eficiência que o brasileiro quer. O brasileiro quer o fim da impunidade”, disse Flávio Werneck, vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef).
“É uma proposta um tanto quanto fora a normalidade. É centralizadora. Ao invés de se buscar a especialidade de cada área, você está concentrando o poder mais ainda”, afirmou.
Para Werneck, o ideal seria o caminho contrário, o de dar independência técnica e investigativa para a PF, reduzindo a burocracia e fortalecendo as especialidades.“Não conheço nenhum lugar do mundo que seja assim, com uma polícia cuidando de tudo. O que o mundo inteiro busca são especializações. O que se busca é ter o melhor bacharel de economia cuidando de crimes financeiros, o melhor especialista em computação investigando crimes cibernéticos”, explicou.
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O plano de governo da candidatura Haddad diz que “o governo federal deve assumir suas responsabilidades no enfrentamento da criminalidade que, tendo origem transnacional, afeta a segurança dos estados e dos municípios”. Segundo o texto, essa seria a forma de alcançar o “ciclo completo na cadeia do crime”.
A PF defende que o ciclo completo de polícia seja feito pela própria entidade, mas sem retirar as atribuições das outras polícias. O ciclo completo permitiria que a PF pudesse também investigar crimes e encaminhá-los diretamente para a Justiça, o que não acontece hoje.