Não faltam pré-candidatos de direita para a eleição a presidente de 2018. Em geral, todos discursam em favor da iniciativa privada e de um Estado menor e mais eficiente – mantra do liberalismo econômico. Mas a direita brasileira não é uma só. São várias. E ainda carece de um representante genuinamente liberal.
Vários dos concorrentes direitistas do país têm posições que não são exatamente condizentes com o liberalismo. Na economia e, principalmente, nos costumes e comportamento.
O que é um liberal?
Um liberal, antes de tudo, é alguém que defende que a liberdade individual não pode ser restringida pelo Estado – a não ser que seja para garantir que o direito de um cidadão não tolha a liberdade de outro.
Direto ao ponto
Saiba quanto há de liberal em cada um dos pré-candidatos da direita à Presidência:
Desde que respeitada essa premissa, o liberalismo estabelece que o Estado não pode cercear a liberdade de empreender. Por isso o liberal é um defensor do livre mercado e de um Estado que não intervenha na economia e que apenas a regule.
A cobrança de impostos pesados, nesse sentido, seria uma forma de dificultar a atividade privada – daí a bandeira pela redução de tributos que costuma ser empunhada pelos liberais.
Deve-se ressaltar que o liberalismo econômico já foi testado na prática. Até a crise econômica de 1929, os governos não costumavam intervir na economia. Isso mudou depois disso, quando o Estado passou a intervir mais na economia – inicialmente como uma estratégia para induzir o crescimento econômico e tirar os países da Grande Depressão.
O princípio fundamental do liberalismo também implica que os governantes não devem regular o comportamento individual naquilo que ele não afeta a vida de outras pessoas. Um liberal autêntico não veria nenhum problema em autorizar o casamento de pessoas do mesmo sexo ou o consumo de drogas – embora, nesse segundo caso, defendesse punição para pessoas que prejudiquem outras se estiverem sob efeito de entorpecentes.
Por essa definição, o liberal em comportamento se opõe ao conservador (aquele que pretende conservar os valores tradicionais da sociedade) e aos reacionários (os que reagem às mudanças sociais).
A Gazeta do Povo analisou o quão liberal são sete pré-candidatos a presidente da República tidos como de direita.
Jair Bolsonaro (PSC)
O deputado federal Jair Bolsonaro (PSC) é um conservador nos costumes. Para alguns, ele pode até mesmo ser definido como um reacionário devido a suas posições radicalmente contrárias, por exemplo, ao casamento entre pessoas do mesmo sexo e à adoção de crianças por casais homossexuais. Nesse aspecto, ele está no extremo oposto do liberalismo de costumes.
Na economia, Bolsonaro têm dado declarações mais alinhadas ao liberalismo clássico. Diz ser a favor de um Estado mínimo e de privatizações de estatais, inclusive da Petrobras. Já elogiou, por exemplo, a ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher – um ícone dos liberais.
Mas a adesão de Bolsonaro ao liberalismo econômico é vista com reticência pelo mercado. Ele sempre esteve mais alinhado ao nacional-desenvolvimentismo estatal – modelo econômico adotado durante a ditadura militar (1964-1985) e nos governos do PT, por meio do qual o Estado atua diretamente na economia para induzir o crescimento, inclusive por meio de reservas de mercado para estimular a indústria nacional.
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Bolsonaro já disse ser contra a autonomia do Banco Central, abrindo a possibilidade de intervenção política na taxa de câmbio e de juros. Para ele, um BC independente tornaria o país refém do mercado financeiro.
Demonstrou ainda ser contra uma economia mais aberta, ao defender a restrição do acesso dos chineses a setores que ele considera como estratégicos ao país.
O deputado também tem posições vistas como contrárias à austeridade fiscal do Estado. Nesse sentido, ele é mais alinhado com a esquerda, que tradicionalmente se caracteriza por defender um Estado mais “gastador”.
Ele é contrário à reforma da Previdência do governo Temer – considerada por especialistas como fundamental para equilibrar as contas públicas. Mas, como deputado, Bolsonaro votou a favor da PEC do Teto de Gastos Públicos, que limitou as despesas do governo federal.
Geraldo Alckmin (PSDB)
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), é visto por setores da esquerda como um representante do conservadorismo de costumes. Embora ele não possa ser considerado um liberal, tampouco é 100% conservador.
O tucano já disse ser a favor da união civil de pessoas do mesmo sexo, por exemplo. Mas é contrário, por exemplo, à legalização das drogas, inclusive da maconha – um liberal típico tenderia a ver essa questão como uma decisão pessoal, devendo o Estado apenas fixar punição para o caso de o usuário prejudicar outras pessoas sob efeito da droga.
Já no campo econômico, Alckmin tem um alinhamento maior com o liberalismo. Ele defende as reformas trabalhista (já aprovada no Congresso) e da Previdência – projetos que são rechaçados pela maior parte da esquerda brasileira. Vem defendendo a austeridade fiscal, o corte de despesas e a melhoria da eficiência do gasto público.
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Como governador paulista, fez concessões de obras e serviços públicos para a iniciativa privada. A esquerda, aliás, o acusa de promover um “desmonte” do Estado.
Mas, ao mesmo tempo, Alckmin não imprimiu em São Paulo uma gestão totalmente liberal. Seu governo tem várias políticas sociais que conduzem sua administração, no mínimo, mais para o centro do espectro político.
João Doria (PSDB)
Dos principais pré-candidatos à Presidência, o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), é um dos que têm assumido mais enfaticamente, ao menos no discurso, o figurino de liberal na economia – embora ele mesmo se defina como um social-democrata, o que o colocaria no campo da centro-esquerda.
Defende abertamente um Estado menos gastador e as privatizações. Elas inclusive são parte importante de seu plano de governo na prefeitura paulistana.
Considera que o maior problema da saúde pública não é a falta de dinheiro, mas a má gestão e os desperdícios. Já disse ser favorável à cobrança de mensalidades de estudantes de universidades públicas que possam pagar. Doria também é um defensor das reformas trabalhista e previdenciária do governo Temer.
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Por outro lado, Doria tem algumas posições que não se alinham ao liberalismo clássico. Não vê nenhum problema em haver o financiamento de empresas brasileiras, sobretudo as exportadoras, com juros subsidiados pelo BNDES – um banco público federal. Desde, segundo ele, que o dinheiro público seja bem aplicado. Também enviou um projeto de lei para a Câmara Municipal de São Paulo para cobrar impostos de serviços de streaming como Netflix e Spotify.
Já do ponto de vista de costumes, Doria tem posições que oscilam ora para o campo liberal ora mais para o conservadorismo.
Classificou como “libidinosa” a performance artística em que uma criança interagiu com um homem nu no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo. Disse que é preciso que os artistas respeitem a família, as religiões, os direitos e a liberdade alheia. Também é contrário à legalização das drogas.
Por outro lado, já disse não ter qualquer objeção ao casamento gay e à adoção de banheiros públicos para transgêneros. Afirmou ainda que toda pessoa tem direito a fazer sua opção de gênero (ou seja, de escolher se quer assumir identidade masculina ou feminina) – embora seja contra o ensino da ideologia de gênero nas escolas.
Luciano Huck (sem partido)
O apresentador de tevê e empresário Luciano Huck diz que chegou a hora de sua geração dar sua contribuição ao país, mas nega a pretensão de participar de eleições. Ainda assim, sua movimentação nos bastidores alimenta cada vez mais a especulação de que ele está construindo sua candidatura à Presidência.
Até mesmo por não admitir que será candidato (caso realmente queira ser), Huck não tem dado demonstrações públicas sobre suas crenças político-ideológicas. Ainda assim, a aposta de analistas é de que Huck, se vier a concorrer ao Planalto, será um candidato com tendências liberais na economia e nos costumes.
A trajetória profissional de Huck em programas de auditório e a proximidade que ele tem com a classe artística indicam que o apresentador não é conservador nos costumes.
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Além disso, Huck é empresário – costumeiramente, o empresariado é mais de direita em seu posicionamento sobre economia. Ele inclusive estaria em constante contato com o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga – economista com ideias liberais que foi responsável, na Presidência de Fernando Henrique Cardoso, por estabelecer o tripé macroeconômico formado por câmbio flutuante, meta de inflação e superávit primário.
Apesar disso, Huck estaria tendo contatos com partidos que vão da esquerda à direita: Rede, PPS, PSDB, DEM e Novo. Em princípio, seria para discutir um projeto suprapartidário para o país. Essas conversas, porém, sugerem que ele poderá ser um candidato centrista.
Henrique Meirelles (PSD)
Não é nenhum segredo que o atual ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), tem posições liberais. Ele é o responsável pela política econômica do governo Temer, marcada pelo corte de gastos (inclusive de programas sociais), proposição de reformas como a trabalhista e da Previdência e um programa de privatização de estatais e de concessões de serviços públicos para a iniciativa privada.
Meirelles pouco se manifesta sobre seu posicionamento com relação a comportamento e costumes. Mas, nos últimos tempos, começou a ensaiar um movimento de aproximação com eleitores evangélicos, indicando ter uma tendência mais conservadora do que liberal nos costumes.
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Na primeira manifestação pública após o PSD convidá-lo oficialmente a ser candidato a presidente, Meirelles gravou um vídeo direcionado a pastores em que pede “oração” pela melhora da economia e fala de Deus e de valores. “Eu me sinto muito à vontade para conversar com vocês porque nós temos os mesmos valores: são os valores da lei de Deus e dos homens visando crescer, colaborar com o país”, afirmou.
Ronaldo Caiado (DEM)
O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) costuma discursar contra o “Estado paternalista”, slogan que é usado pelos liberais. Seus posicionamentos na área econômica costumam ser tipicamente de direita.
Porém, Caiado é proprietário de terras e integrante da bancada ruralista. E, na defesa dos interesses do grupo que representa, adota posições que podem ser enquadradas dentro do que ele classifica de Estado paternalista – posição que nada tem de liberal.
Em maio, defendeu a anistia das dívidas retroativas de produtores rurais com o Funrural (imposto previdenciário rural), cobrança imposta em julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que soma R$ 20 bilhões. Caiado também, como ruralista, é defensor de crédito subsidiado para produtores rurais – prática que adotada em quase todo mundo, mas que não condiz com a doutrina liberal pura.
Do ponto de vista dos costumes, o senador de Goiás também não pode ser classificado como um liberal. Está mais para conservador. Já declarou ser “100% contrário” à legalização das drogas. Classificou a exposição do Museu de Arte Moderna (MAM), em que uma criança manipulou um artista nu, como “repugnante”, “triste”, “deprimente” e criminosa.
Como integrante titular da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Caiado teve a oportunidade em março de se posicionar sobre o projeto que equipara os casais formados por pessoas do mesmo sexo a uma família tradicional, formada por homem e mulher. Ele estava presente na sessão que apreciou o texto. Mas não votou, nem a favor, nem contra, tampouco se absteve.
João Amoêdo (Novo)
O empresário e ex-banqueiro João Amoêdo ainda não foi lançado oficialmente pelo partido Novo como candidato a presidente, mas nos bastidores isso é dado como praticamente certo. Amoêdo tinha tudo para ser o candidato mais liberal da eleição de 2018, tanto na economia como nos costumes. Mas, se a sigla vem defendendo abertamente as bandeiras do liberalismo econômico, não faz o mesmo no campo do comportamento.
O Novo considera que as liberdades individuais (com responsabilidade) são um de seus valores e diferenciais. Em tese, isso contemplaria liberdade de comportamento. Mas o partido ainda não se posicionou claramente sobre temas como casamento gay e legalização de drogas, por exemplo.
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Amoêdo inclusive já deu entrevista afirmando que esses são assuntos importantes mas não prioritários na agenda do Novo. Segundo ele, a prioridade do partido, ao menos por enquanto, é a defesa da redução do tamanho do Estado. Nesse ponto, o Novo tem sido liberal ao ponto de se recusar a utilizar dinheiro do Fundo Partidário (estatal) para financiar suas atividades. A sigla acredita que não é função do Estado financiar os partidos.
Atualizado corrigindo a informação de que Jair Bolsonaro votou contra a PEC do teto de gastos. O deputado votou a favor do projeto.
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