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| Foto: Marcelo Chello/Estadão Conteúdo

Ciro não pode ver um cearense que já abre um sorriso e chega mais perto para trocar impressões. “Se for de Sobral então, aí é longa a conversa”, conta o presidente do PDT, Carlos Lupi. Para se fazer entender com certas palavras que usa no dia a dia, o presidenciável tem presenteado alguns companheiros de campanha com dicionários de cearês. “É que ele não fala ‘boteco’, fala ‘bodega’. Aí tem hora que fica difícil entender até onde ir”, brincou um dos agraciados com o presente. 

Mas não é esse lado mais afável que torna Ciro Gomes, 60 anos, mais conhecido junto aos brasileiros. De comportamento, digamos, rústico, não há quem não mencione o jeito intempestivo, as respostas ácidas e a língua afiada do pedetista. De amigos próximos a adversários históricos.

A ficha corrida na política é extensa: foi prefeito, deputado estadual, deputado federal, governador, duas vezes ministro e candidato à Presidência da República. “Isso prova que uma coisa não impede o bom andamento da outra”, disse um aliado, sobre o temperamento do pré-candidato.

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Com esse jeitão contraditório, Ciro segue para a sua terceira disputa presidencial em 36 anos de vida política. E repete por aí: agora vai!

“Quero vencer no primeiro turno”, “enfrentarei os fascistas” e “por que não” têm sido frases recorrentes do Ciro público, palestrante, presidenciável, em reuniões com possíveis aliados. A orientação a todos que trabalham em sua candidatura é não descartar ninguém, da direita à esquerda. 

Apesar da pré-campanha a todo vapor, o PDT ainda não fechou aliança com ninguém. Está num namoro firme com o PSB após o ministro aposentado do STF Joaquim Barbosa avisar que não disputará a Presidência. Chegou a cogitar uma união da esquerda, na qual se ligaria aos petistas, mas a insistência da sigla em lançar a candidatura de Lula, mesmo preso, tem feito os pedetistas crerem que, para o primeiro turno, vão mesmo sem o PT. Lança também olhares sedutores para o PP, partido enrolado até o pescoço na Operação Lava Jato.

O início na política

Ciro Gomes fala cearês e foi no estado nordestino que construiu sua carreira política. Mas é paulista do interior, da cidade de Pindamonhangaba. Nasceu em 1957 e cedo, com três anos de idade, mudou-se para o Ceará, onde sua família já tinha um histórico na vida pública. Seu bisavô foi prefeito de Sobral, cargo também ocupado posteriormente por seu avô e depois pelo pai. 

É formado em Direito pela Universidade Federal do Ceará e chegou a dar aulas em universidades cearenses, além de advogar. Mas foi chamado a continuar o legado da família. 

Entrou na vida política em 1982, quando o pai José Euclides, à época prefeito de Sobral, inseriu o nome do filho na lista de candidatos do PDS (Partido Democrático Social) a deputado estadual no Ceará. Fez uma campanha voltada para a elite e foi o mais votado no município, com 11 mil votos. 

Como deputado estadual, aproximou-se de Tasso Jereissati, hoje senador pelo PSDB. A relação entre os dois se estreitou durante a campanha das Diretas Já, em 1984. E nunca mais foi rompida. 

O passado tucano

Ciro passou ao PMDB, onde novamente se elegeu deputado estadual e, em seguida, em 1988, prefeito de Fortaleza. Teve uma das gestões mais bem avaliadas da capital. Em 1989, apoiou Mário Covas (PSDB) na eleição presidencial e, no segundo turno, declarou voto em Lula, que acabou derrotado por Fernando Collor. 

A convite de Tasso, em 1990, filiou-se ao PSDB e foi eleito no primeiro turno governador do Ceará, com 56% dos votos. Renunciou ao cargo a quatro meses do fim do mandato para assumir o Ministério da Fazenda no governo de Itamar Franco, na época da implantação do Plano Real. 

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Mais para frente, já no PPS, concorreu à Presidência da República em 1998 e 2002. Derrotado por Lula, foi nomeado ministro da Integração Nacional, onde permaneceu de 2003 a 2006 e participou de importantes projetos do governo, como a transposição do Rio São Francisco. 

Apesar do que se diz de sua personalidade, manteve-se discreto enquanto ministro, sendo várias vezes elogiado pelo então presidente Lula, que chegou a dizer que ele era um de seus “mais leais auxiliares”. 

Deixou o cargo para se candidatar à Câmara dos Deputados pelo PSB. Como parlamentar até 2010, integrou a comissão especial sobre a crise econômico-financeira e sobre atividade de exploração e produção do pré-sal. Manteve-se em defesa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e da transposição do São Francisco, sua cria. 

Teve uma curta passagem pelo Pros, entre 2013 e 2015, quando então migrou para o PDT. 

Jeitão que custou caro

Desde a filiação ao PDT, Ciro tem se posicionado cada vez mais enfaticamente sobre a situação política nacional. Mas como brinca por aí e disse em uma reunião com lideranças partidárias no mês passado, “agora, com 60 anos” é mais “inteligente”. 

Alvo de mais de 70 processos, Ciro ironiza, na intimidade, que seu “jeitão” tem lhe “custado caro”. Em um evento no ano passado sobre Reforma da Previdência, mencionou o processo movido contra ele pelo presidente Michel Temer – Ciro perdeu em primeira instância, mas recorre. 

“Na véspera da delação do gângster da JBS, ele ganhou R$ 30 mil do miserável aqui em um processo lá em Brasília. Eu vou tomar de volta. Não paguei, ainda estou recorrendo. Simplesmente porque eu disse que ele era um golpista. Como pode um negócio desses?” 

Ciro foi um dos primeiros a se apresentar publicamente contra o impeachment de Dilma Rousseff antes mesmo que o próprio PT tivesse definido uma linha de defesa. Foi quando disse que Temer era o “capitão do golpe”. 

Alguns passaram a chamá-lo de “coronel”, após ele dizer que receberia “à bala a turma” do juiz Sergio Moro, se tentassem conduzi-lo coercitivamente a depor. Essa característica de personalidade intempestiva, avaliam assessores, foi o que lhe custou a eleição de 2002. 

Na campanha daquele ano, durante jantar com empresários em São Paulo, perguntado sobre o que faria para acalmar os investidores – o país vivia um período de crise financeira, com descontrole da dívida – não pensou duas vezes e respondeu: “estou me lixando para o mercado”. 

Ciro entrou na campanha bem posicionado nas pesquisas de opinião. Posicionamentos como o que teve nesse jantar, contudo, foram usados pelos adversários, que pretendiam colar nele a ideia de uma pessoa “desequilibrada” para assumir a Presidência da República. 

No PDT, embora todos estejam sempre atentos ao que o pré-candidato fala, há a avaliação de que esse Ciro é um mito criado. “Quando você pensa em cargo de presidente, a personalidade intempestiva pode ser um risco. Mas o presidente não toma decisões sozinho. E o Ciro tem um histórico na administração que mostra que a marca dele, esse temperamento, não significa que ele governe desse jeito”, ponderou um colaborador da campanha pedetista. 

O que defende o economista de Harvard?

Desde o início da gestão de Michel Temer, Ciro tem se colocado como um oposicionista contumaz da política econômica. Contrário ao teto de gastos públicos, às reformas da Previdência – na forma proposta pelo atual presidente – e trabalhista, que prometeu revogar caso eleito. 

Como economista, porém, não é só à política emedebista que lança críticas. Na campanha de 1998, tomou para si o discurso de ataque à gestão Fernando Henrique Cardoso em relação à venda do patrimônio público, à valorização artificial do real e à explosão das dívidas interna e externa. Defendeu redução drástica de juros e adoção de um câmbio flutuante. 

Em 2002, contra Lula e José Serra, saiu em defesa da necessidade de estabilização da moeda com a abertura da economia. Falou em uma reforma tributária que desonerasse o setor produtivo e tutelou a criação de um regime de capitalização da Previdência Social. 

Propôs ainda elevação dos juros para credores que concordassem com o alongamento dos prazos de pagamento da dívida interna. No campo político, argumentou a favor de uma reforma política que instituísse a fidelidade partidária, o financiamento público de campanhas e a adoção, a longo prazo, do parlamentarismo. 

Na época, Mangabeira Unger estava na sua equipe de campanha. O filósofo é considerado fora do país um dos mais influentes pensadores, com obras sociais marcantes. O cenário se repete neste ano. E lado a lado, os dois têm defendido uma reforma fiscal dos sistemas tributário e previdenciário, e um redesenho da reforma política, com redefinições do pacto federativo que, para eles, foi o que endividou os estados.

É nessa toada que Ciro mantém a proximidade com Lula, apesar das rusgas com o PT, e com Tasso Jereissati, do PSDB. Atacando os dois lados, se coloca como alternativa de todo lado, e é rejeitado por ambos. 

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