Um dos fundadores do Banco Pactual, Paulo Guedes tem doutorado na Universidade de Chicago, um dos mais importantes centros de formação liberal na economia.| Foto: Hugo Harada/ Arquivo Gazeta do Povo

O “posto Ipiranga” que tudo sabe sobre economia. O fiador que o deputado-capitão precisava perante o mercado financeiro. Sem Paulo Guedes, o economista liberal que virou uma marca, talvez Jair Bolsonaro (PSL) não tivesse obtido apoio do capital para sua eleição e poderia ter ficado para trás na disputa. Agora, a dúvida é: até onde irá o poder do economista dentro do governo do novo presidente? 

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Guedes deu o verniz liberal que faltava a Bolsonaro durante a campanha. Agora, terá de mostrar destreza para reunir os melhores nomes técnicos para compor o governo e apresentar propostas que ganhem apoios em cinco frentes: com o presidente, os técnicos do governo, o Congresso, o mercado financeiro e investidores, e ainda com a ala militar do futuro governo.

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Os cem primeiros dias serão essenciais, na visão de Ricardo Schweitzer, analista de mercado da Nord Research. Anunciado como ministro da super pasta econômica (que deve reunir os ministérios da Fazenda e do Planejamento), Guedes terá de ser rápido e conquistar espaço entre as diferentes linhas de pensamento que vão compor a gestão Bolsonaro. 

“O desafio número 1 é formação de equipe. Eu particularmente acredito que a coalizão que está se formando pode representar uma boa oferta de pessoas qualificadas para integrar as pastas de cunho econômico. Daí para frente, pensar os primeiros cem dias de governo”, afirmou Schweitzer. 

Na reta inicial do governo Bolsonaro, Guedes terá de definir e atacar as prioridades e urgências na pauta econômica. A reforma da Previdência está entre esses assuntos, se não tiver sido aprovada ainda na gestão de Michel Temer, deste ano, como esperam algumas alas do mercado financeiro.

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“A reforma da Previdência acho que tentam articular ainda em 2018. Se não passar, sim, é prioridade 1. Eu apostaria que após, tentariam atacar uma reforma tributária, que é um tema difícil. A sinalização de dissolução e fusão de pastas pode complicar o começo de governo”, avalia o analista. 

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Assessor econômico sim, porta-voz não

Por enquanto, Guedes vem perdendo – ao menos publicamente – espaço como porta-voz econômico de Bolsonaro. Na reta final da campanha, Guedes ficou calado e sumiu dos holofotes, principalmente após ser noticiado que o economista teria defendido a recriação da CPMF (o imposto sobre operações financeiras) em reunião com agentes do mercado financeiro. Depois disso, apareceu em foto no hospital ao lado de Bolsonaro, mas calado. 

Bolsonaro também colocou água fria na fervura ao relativizar o programa de privatização de Paulo Guedes – um de seus principais trunfos na campanha, com promessa de levantar até R$ 2 trilhões para os cofres públicos com a venda de empresas estatais e ativos como terrenos e prédios. Bolsonaro afirmou que não se mexe na Eletrobras e na Petrobras, contrariando o plano de Guedes. 

Nos dias que antecederam a eleição, mais uma fala de Bolsonaro desafiou a lógica liberal de Guedes. Em entrevista ao site Poder 360, o futuro presidente afirmou que irá determinar uma meta para o câmbio, junto com a meta de inflação, algo que desafia as bases do tripé macroeconômico instituído no Plano Real e medida rechaçada pela lógica liberal. Guedes continuou sem se manifestar.

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No domingo (28), após a oficialização da vitória de Bolsonaro nas urnas, o futuro superministro atendeu à imprensa. Para surpresa de todos, perdeu a paciência com uma simples pergunta feita por uma jornalista argentina. Ela quis saber sobre do futuro do Mercosul e das relações comerciais do bloco econômico.

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“Se eu só vou comercializar com Venezuela, Bolívia e Argentina? Não. Nós vamos comercializar com o mundo, serão mais países. Nós faremos comércio. E se eu quiser comercializar com outros países? É isso que você queria ouvir? Mercosul não será prioridade. A gente não está preocupado em te agradar. Eu conheço esse estilo”, disse, causando constrangimento.

Hora de lapidar as propostas

Como comandante da equipe técnica que lidera a formulação econômica do próximo governo, Guedes conseguiu reunir em torno de si especialistas nas diversas áreas, como o professor Luciano de Castro, da Universidade de Iowa (EUA), o principal formulador na área energética durante a campanha. 

Agora, Guedes terá de convencer o próprio Bolsonaro, os militares e a base parlamentar que a futura gestão está formando, para tentar encaminhar seus projetos, muitos deles dependentes de aprovação no Congresso.

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A tarefa parece não ser fácil. Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, Luciano de Castro afirmou que as aparentes contradições entre Bolsonaro e Guedes são apenas sinalizações do deputado (que tem experiência de sete mandatos) de que as proposições da equipe técnica devem ser lapidadas para que passem pela aprovação no Congresso. 

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Há dúvidas entre analistas e no próprio mercado sobre como será essa dinâmica entre Bolsonaro, os militares e os técnicos, liderados por Guedes. Há quem acredite que os recuos de Bolsonaro são apenas atos de campanha, para não perder votos ao propor medidas mais duras, mas que depois Guedes assumirá as rédeas da condução econômica. 

Por outro lado, há aqueles que temem que a ala militar, com perfil nacionalista/desenvolvimentista, tome a frente no processo e se sobreponha aos técnicos. Para conter essa percepção, Castro garantiu que há “alinhamento” entre técnicos e militares. 

Surge o Posto Ipiranga

Paulo Guedes tem relevo no mercado financeiro por sua trajetória profissional. Um dos fundadores do Banco Pactual, hoje BTG Pactual, o economista tem doutorado na Universidade de Chicago, um dos mais importantes centros de formação na vertente liberal econômica. Nos últimos anos, mantinha colunas no jornal O Globo e na revista Época, nas quais criticava movimentos da política econômica dos governos de turno. Hoje, Guedes trabalha no mercado financeiro, comandando bancos de investimento. 

Até o primeiro semestre de 2017, ele não era relacionado à candidatura de Bolsonaro, sendo mais conhecido por seu passado como um dos criadores do banco Pactual.

Segundo a revista Piauí, foi por meio de uma dessas colunas que Guedes publicava no jornal O Globo que o candidato Bolsonaro se aproximou dele. Segundo a reportagem, Guedes afirmou no primeiro encontro que estava ajudando a criar a campanha do apresentador Luciano Huck. Se desistisse do Global, Bolsonaro pediu que o economista o assessorasse. 

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Foi próximo à eleição, em agosto deste ano, que Bolsonaro afirmou que estava “namorando” Paulo Guedes. Alas do mercado financeiro, que desde 2017 já começavam a flertar com Bolsonaro como um nome potente contra o PT, ficaram mais animadas. Guedes dava o verniz liberal necessário para o embarque do capital na candidatura do pesselista. 

Guedes passou a representar o candidato perante o mercado financeiro, em reuniões com bancos e grupos de investidores. Ficou famoso ao passar a ser lugar-comum nas declarações de Bolsonaro quando questionado sobre economia. “Vou perguntar ao Paulo Guedes”, dizia. Nasceu o “posto Ipiranga” de Bolsonaro para a economia. 

“Durante a campanha, Guedes teve papel importante na elaboração do plano de governo e na interlocução com agentes econômicos, tanto no mercado financeiro quanto economia real”, avalia Schweitzer. 

Quem precisa de Guedes

Nesses meses até a campanha, a empolgação com Bolsonaro crescia. Guedes foi importante para aumentar a empolgação do mercado em torno da candidatura. Porém, não foi essencial e há quem defenda que o mercado financeiro e o capital, que aderiu ao antipetismo com a garantia de que com um governo com uma tonalidade menos vermelha conseguiria maiores ganhos com privatização e abertura de mercados. Com o PSDB enfraquecido e a candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) em ritmo lento, viam no capitão essa vertente. 

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Sob condição de anonimato, um gestor de investimentos no setor de infraestrutura qualificou o que é Guedes para a candidatura: um formulador que enfeita, mas que é menor do que Bolsonaro. 

“Guedes é velho. Se ele não quiser ser o ministro da Fazenda, não precisa. É só Bolsonaro pedir que indicaremos os melhores nomes, até mais jovens. Podemos até ficar com parte da equipe econômica de Michel Temer. Se eles ficaram com Temer, porque não ficarão com Bolsonaro”, afirmou, sob anonimato, o gestor de um fundo bilionário. 

Na reta final da campanha, Guedes virou manchete não como o guru de Bolsonaro, mas por sua atuação no mercado financeiro. O Ministério Público Federal do Distrito Federal abriu na semana da eleição uma investigação contra Guedes. Ele teria, segundo a denúncia, emitido e negociado títulos mobiliários por seu banco sem lastros ou garantias. Tais títulos teriam sido comprados por fundos de pensão das estatais durante o governo Dilma Rousseff. 

A investigação é sobre investimentos feitos por fundos de pensão na empresa BR Educacional, da qual Guedes é um dos sócios. O dinheiro foi aplicado durante os anos de 2009 e 2013 pelos fundos Funcef, Petros, Previ, Postalis, das empresas estatais. A defesa do economista desqualificou as acusações, considerando-as fracas e sem fundamento.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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