Estátua da Justiça na frente do STF: em momentos de crise, Supremo tem cedido à pressão política.| Foto: Dorivan Marinho/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) virou a luz no fim do túnel para o ex-presidente Lula (PT) após o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) condená-lo no processo do tríplex do Guarujá (SP). Tanto para o petista se livrar da cadeia como para ser candidato na eleição presidencial de outubro – já que a condenação de Porto Alegre torna Lula inelegível e permite que ele seja preso.

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Embora a instância judicial imediatamente acima do TRF-4 seja o Superior Tribunal de Justiça (STJ), líderes do PT e os advogados de Lula vêm dando pistas de que a tendência é de que o ex-presidente aposte suas fichas no Supremo – uma corte que tem um perfil mais suscetível a pressões políticas. No STJ, Lula teria chances reduzidas de reverter a decisão do TRF-4. O ministro Felix Fischer, relator da Lava Jato na Corte, costuma jogar duro com a defesa do petista, negando vários recursos encaminhados ao tribunal no ano passado.

As pistas de que a defesa de Lula acredita que o caminho será o STF

Para que a batalha judicial seja travada no STF, a defesa do ex-presidente terá de questionar a constitucionalidade de algum trecho da decisão do TRF-4 ou da condução do processo. Os advogados de Lula já deram a entender que farão isso. Eles vêm questionando pontos da ação do tríplex que são de competência do STF e não do STJ.

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O advogado Cristiano Zanin Martins, durante o julgamento de Lula no TRF-4, questionou o voto do relator do caso no tribunal, o desembargador João Pedro Gebran Neto. Afirmou que Gebran utilizou em sua decisão elementos que fazem parte do inquérito do Supremo que apura o crime de formação de quadrilha no caso da Petrobras – caso conhecido como o “quadrilhão do PT”.

Finalizado o julgamento, Zanin disse à imprensa que o TRF-4 usurpou a competência do Supremo ao fazer isso. “Existe um inquérito no STF que trata de um suposto crime de organização criminosa. A questão ainda deve ser analisada e decidida pelo Supremo. Boa parte dos votos que foram proferidos hoje [dia do julgamento] tratou dessa questão que está no Supremo. Entendemos que houve usurpação de competência”, disse Zanin. Caso essa tese seja acatada pelo STF, a condenação de Lula poderia ser anulada ou suspensa.

Outro sinal de que o Supremo será o foco da defesa de Lula é a informação de bastidor de que lideranças do PT estariam pressionando o ex-presidente a trazer para sua equipe de defesa um jurista com mais trânsito no STF e experiência do que Cristiano Zanin. Um dos nomes que cotados é o do ex-ministro do Supremo Sepúlveda Pertence.

Gleisi também indica que o Supremo é a aposta a partir de agora

Lideranças do PT também têm se referido ao Supremo como possível pilar da “salvação” de Lula. “Não acredito que a corte suprema vai deixar acontecer uma barbaridade dessas [Lula ser preso]”, disse a presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), entrevista ao jornal Folha de S.Paulo divulgada nesta segunda-feira (29). “Seria uma violência não só contra o Lula, mas contra a democracia e o povo brasileiro, pela representatividade que ele tem no país.”

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A declaração de Gleisi encontra eco no próprio STF. No mesmo dia da condenação de Lula pelo TRF-4, o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello disse que a possível prisão de Lula poderia alimentar a crise política: “Um ato deste poderá incendiar o país”.

Nos bastidores do STF, a aposta é de que a condenação de Lula irá levar o Supremo a rediscutir ainda neste ano sua própria decisão, de 2016, que autorizou a prisão de condenados em segunda instância, como ocorreu com Lula no TRF-4. A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, até então reticente em recolocar o assunto em discussão, agora estaria se sentindo pressionada a levar a questão ao plenário do Supremo novamente.

PT acredita ser possível que STF mude entendimento sobre Ficha Limpa; e que Lula seja candidato

O STF possivelmente também será acionado por Lula para garantir sua candidatura a presidente – seja por meio de uma liminar ou pelo pedido de que sua inegibilidade, decorrente da condenação pela segunda instância, seja revertida.

O PT vem reafirmando que Lula vai registrar sua candidatura. Porém, a tendência no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) seria indeferir o registro com base na Lei da Ficha Limpa. Com isso, Lula teria de recorrer aos tribunais superiores para poder concorrer.

E os petistas acreditam que é possível conseguir uma vitória no STF. “A discussão no Supremo em torno da constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa [que proíbe candidaturas de condenados em segunda instância] passou pela ofensa à presunção de inocência, com ótimos votos vencidos. Hoje a composição do STF é outra”, diz parecer encomendado pelo PT ao advogado Luiz Fernando Pereira, especializado em Direito Eleitoral. No estudo, Pereira analisa nove cenários possíveis para Lula na sua tentativa de candidato.

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A constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, aprovada pelo Congresso em 2010, foi confirmada pelo STF em 2012 por sete votos contra quatro. Dos 11 ministros do Supremo que participaram daquele julgamento, dois já não estão mais na corte: Cézar Peluso e Joaquim Barbosa. E a Ficha Limpa ainda hoje é alvo de controvérsia dentro do STF. No ano passado, por exemplo, o ministro Gilmar Mendes afirmou que a lei parecia ter sido “feita por bêbados”, indicando sua contrariedade com a legislação.

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Em momentos críticos, Supremo tem cedido à pressão política

Composto por ministros indicados pelo presidente e aprovados pelo Senado, o STF também vem demonstrando nos últimos tempos ser suscetível a pressões políticas em situações de crise. Isso anima o PT a investir na corte como tábua de salvação de Lula.

Em dezembro de 2016, o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello determinou o afastamento do então presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de suas funções. Renan havia se tornado réu num processo criminal. Marco Aurélio entendeu que o peemedebista não poderia continuar no cargo porque a Constituição proíbe que um réu ocupe a Presidência da República (o presidente do Senado é o terceiro na linha sucessória).

Renan desobedeceu à liminar de Marco Aurélio e continuou comandando a Casa. O plenário do Supremo, temendo uma crise institucional entre poderes, não impôs nenhuma punição a Renan e ainda o reconduziu à presidência do Senado. Apenas estabeleceu que ele não poderia ocupar a Presidência da República.

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Em outubro de 2017, foi a vez de o plenário do STF se curvar à pressão para livrar o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do afastamento do mandato, que havia sido imposto pela 1.ª Turma do próprio Supremo. Após muita pressão política, numa decisão apertada de 6 a 5, o plenário do STF entendeu que a palavra final sobre o afastamento cabia ao Senado. E os senadores recusaram a decisão da 1.ª Turma dias depois. Aécio voltou ao Senado.