O empresário Marcelo Odebrecht voltou a fustigar seus adversários na Odebrecht, agora apresentando o que seriam provas contra um deles.
No pacote de e-mails que anexou ao processo contra Lula sobre o sítio de Atibaia, ele incluiu um que não tem nada a ver com o imóvel cuja propriedade é atribuída ao ex-presidente. A mensagem contém detalhes de aparentes irregularidades e suspeitas de crime que seriam conhecidas por Newton de Souza, ex-presidente do grupo. Souza não faz parte do grupo de 78 delatores da empresa.
No e-mail de novembro de 2008, Marcelo cita negociações sobre impostos que resultaram, segundo ele, no pagamento de propina de R$ 50 milhões ao PT.
Diz ainda que o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci sugeriu o pagamento de propina a Lula por negócios que o ex-presidente teria ajudado o grupo a conquistar na Líbia. Marcelo não usa a palavra propina, mas menciona negócios que a própria empresa incluiu entre seus crimes no acordo de delação.
A Odebrecht diz que a mensagem trata da “defesa de interesses legítimos do setor” e que não é possível inferir nada de ilegal naquela época.
Souza vai assumir no próximo mês a presidência do conselho de administração da Odebrecht em substituição a Emílio Odebrecht, pai de Marcelo. É o principal cargo na organização, já que o conselho dita as diretrizes dos negócios do grupo. Souza é vice-presidente do conselho atualmente e o principal aliado de Emílio. Pai e filho estão rompidos.
Marcelo, que está em prisão domiciliar desde o final de dezembro, diz ter encontrado o e-mail num computador que estava em sua casa e teria 400 mil mensagens. O ex-presidente do grupo acredita que seu pai omitiu irregularidades cometidas por Souza para que assuma o comando da empresa.
Marcelo diz que o acordo de delação, conduzido por seu pai, atribuiu a ele crimes que não cometeu, entre os quais os da Petrobras. Reportagem publicada no fim de semana pela revista “Época” afirma que desde que voltou para casa, em prisão domiciliar, em 19 de dezembro, o empresário passa 12 horas por dia trancado no escritório vasculhando essas 400 mil mensagens em busca de provas contra os adversários.
Caixa dois
O e-mail de 2008 é encaminhado a Emílio e a Alexandrino Alencar, ex-diretor da empresa e também um dos delatores, com cópia para Newton de Souza.
Trata da negociação com Palocci e Guido Mantega para que editassem uma medida provisória que livraria a Braskem, braço petroquímico da Odebrecht, de perdas de R$ 4 bilhões. Em 2008, Palocci era deputado federal e um dos principais interlocutores do PT com a Odebrecht, de acordo com a delação da empresa. Mantega era ministro da Fazenda.
A perda de R$ 4 bilhões ocorreria porque o Supremo havia mudado um entendimento sobre crédito de impostos para empresas exportadores, como a Braskem. Se o governo não ajudasse, a empresa corria riscos de ir à falência com uma dívida desse porte.
O caso foi resolvido, segundo a delação de Marcelo, com a edição de uma medida provisória em 2009 que reduziu os tributos sobre matérias-primas usadas pela Braskem. Como contrapartida, ainda de acordo com Marcelo, o então ministro Mantega pediu R$ 100 milhões para a campanha de Dilma Rousseff, em 2010. Após negociações, foi acertada a entrega de R$ 50 milhões por meio de caixa dois, segundo Marcelo.
Dilma e Mantega dizem que a medida provisória foi editada para salvar empresas exportadoras. Eles negam que a campanha recebeu contribuições ilegais.
Líbia
Em outro trecho da mensagem, Marcelo trata de obras que a empreiteira conquistou na Líbia, governada à época pelo ditador Muammar Gaddafi (1942-2011). Pelo relato de Marcelo, Palocci, chamado no texto de “italiano”, sugeriu que a empresa pagasse propina a Lula, chamado por Marcelo de “amigo de meu pai”.
Marcelo responde que o lucro das obras na Líbia é baixo e “que não tivemos nenhuma orientação neste sentido de inserir nada para dar aqui”. O trecho “nada para dar aqui” seria suborno, de acordo com procuradores ouvidos pela reportagem com o compromisso de não citar seus nomes.
Em sua proposta de delação, Palocci disse que Gaddafi investia em Lula e deu US$ 1 milhão para a campanha de 2002, que o levou à Presidência pela primeira vez.
Outro lado
A Odebrecht afirma em nota que o e-mail que Marcelo Odebrecht incluiu no processo não trata de nenhuma ilegalidade: “A mensagem trata da defesa de um interesse legítimo do setor (e não apenas da empresa) junto a representantes dos poderes Executivo e Legislativo. Não é possível inferir, a partir do e-mail mencionado, qualquer conhecimento, à época, de atividades ilegais”.
A assessoria do ex-presidente Lula disse que “os supostos e-mails de Marcelo Odebrecht em nada alteram a situação de que Lula jamais solicitou ou recebeu qualquer vantagem indevida ao empresário ou a sua empresa e tampouco praticou qualquer ato para beneficiá-lo na condição de Presidente da República”.
Segundo o advogado Cristiano Zanin Martins, a iniciativa de Marcelo Odebrecht é “uma desesperada tentativa de ofuscar” o fato citado em laudo da PF e testemunhas de que a empresa manipulou documentos internos. A defesa do ex-ministro Antonio Palocci não quis se pronunciar.
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