Em uma carta redigida entre o fim de março e o início de abril – antes, portanto, de saber que seria solto por uma decisão do Supremo Tribunal Federal – José Dirceu escreveu uma carta de 14 páginas na qual prega uma guinada à esquerda para o PT, defende a aprovação de medidas pró-impunidade, e faz críticas ao Ministério Público Federal, à Polícia Federal e ao juiz Sergio Moro, que o condenou em duas ações.
O texto, cujo conteúdo foi noticiado nesta quarta-feira (3) pelo Estadão, defende a tese de que há um conluio político contra o PT que inclui a condenação de seus membros, inclusive do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Fariam parte desse plano os partidos que votaram pelo impeachment, juízes e promotores que tocam a força-tarefa da Lava Jato, e a mídia em geral.
“Juízes e promotores têm lado, ideologia, são aliados de forças políticas e econômicas que deram o golpe. Foram transformados em celebridades”, escreveu o ex-ministro do primeiro governo Lula e condenado pelo STF no caso do mensalão, o esquema de corrupção que foi o embrião do que hoje investiga a Lava Jato.
Dirceu foi condenado já em duas ações da Lava Jato. Na primeira decisão, de maio de 2016, ele foi condenado a 23 anos e três meses de reclusão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O crime envolvia recursos desviados da Petrobras a partir da diretoria de Serviços.
No segundo caso, Dirceu foi condenado a 11 anos e três meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A decisão foi de março deste ano. Preso desde agosto de 2015, Dirceu ainda está recorrendo dessas decisões e era mantido preso porque poderia atrapalhar as investigações de outros crimes – na terça-feira, o MPF ofereceu denúncia pelo recebimento de R$ 2,4 milhões em propinas antes, durante e depois do processo do mensalão.
Além de querer vender a ideia de que há viés político nas decisões, Dirceu critica as delações que têm embasado as investigações da Lava Jato. Elas seriam “forçadas, ilegais fruto das prisões preventivas, ameaças de pena sem direito a responder em liberdade ou progredir” e comparou o processo às prisões da ditadura.
A tese da perseguição política é casada com a visão de Dirceu sobre o futuro do PT. O articulador do mensalão acredita que o partido precisa dar um “giro à esquerda”, uma radicalização que seria colocada em prática com “as reformas que não fizemos na renda, riqueza, poder, a tributária, a bancária, a urbana e a política”.
Para arrematar sua visão de futuro, Dirceu diz o que todos os investigados pela Lava Jato dizem: é preciso aprovar a lei de abuso (que cria dificuldades para promotores e juízes), anistiar o caixa 2 (que está por trás de grande parte das acusações da operação) e rejeitar as Dez Medidas contra a Corrupção (que, afinal, aumentariam a vigilância dos crimes pelos quais ele é investigado”.
Bolsonaro e aliados criticam indiciamento pela PF; esquerda pede punição por “ataques à democracia”
Quem são os indiciados pela Polícia Federal por tentativa de golpe de Estado
Bolsonaro indiciado, a Operação Contragolpe e o debate da anistia; ouça o podcast
Seis problemas jurídicos da operação “Contragolpe”