Sem conseguir aprovar pelo menos uma parte da reforma da Previdência no Congresso este ano, o governo federal está ficando encurralado pelos lobbies contrários ao corte de gastos e de benefícios. E terá de ser criativo para compensar as economias que serão frustradas em 2018.
A guerra com os servidores públicos, em particular, está se intensificando. E o governo já ameaça: diz que pode tirar recursos de áreas fundamentais, como saúde e educação, para compensar a economia que seria obtida com o adiamento de reajustes salariais.
A queda de braço entre o governo e funcionalismo está apenas começando. Na segunda-feira (18), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski suspendeu provisoriamente a postergação de reajustes salariais e do aumento da alíquota previdenciária dos servidores, de 11% para 14%, em pedido feito pelo PSOL.
Um dos representantes de Michel Temer na Câmara, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), disse que o governo agiria para reverter a medida “imediatamente”, recorrendo ao plenário do STF. Segundo Perondi, essa foi uma medida “corporativista, egoísta e anti-solidária” de Lewandowski. No entanto, a Corte entrou em recesso sem avaliar o caso.
O Orçamento de 2018, aprovado na semana passada, considerava uma redução de gastos de cerca de R$ 7,4 bilhões a partir da Medida Provisória 805, a MP do Funcionalismo, que adiava em um ano os reajustes de mais de 30 carreiras, previstos para janeiro de 2018.
Como não há espaço no Orçamento para expansão de gastos, o governo ameaça com a retirada de recursos de áreas essenciais. “Esperamos que os ministros do STF não sejam pelo egoísmo, mas sim pelo amor. Ao invés de dizer não aos pobres, digam sim”, disse Perondi.
Lewandowski menteve apenas um ponto da MP, o que altera a concessão de auxílio-moradia a servidores, medida que pode economizar no máximo R$ 1 bilhão ao ano, muito longe da previsão do governo.
MP nem começou a tramitar no Congresso e já dificulta vida do governo
A tramitação da MP caminhava com vagar no Congresso enquanto os governistas agiam para tentar aprovar a reforma da Previdência. Antes de a decisão liminar suspender a medida, a visão dentro do governo era de que a demora em iniciar a tramitação poderia ser até considerada positiva, já que a medida estava em vigor e já adiaria os reajustes de janeiro, mesmo enquanto a MP estivesse parada devido ao recesso parlamentar.
O texto que está no Congresso perde validade em 2 de fevereiro de 2018, mas poderá ser prorrogado. E os 45 dias de recesso do Congresso serão descontados.
Agora, o governo terá de derrubar a liminar e ainda forçar a aprovação da MP, o que é visto como um desafio por representantes do Palácio do Planalto no Congresso. “As corporações vão obstruir”, afirmou deputado ligado ao governo.
Parece improvável que o governo reverta a decisão de Lewandowski antes de 1.º de janeiro. E, uma vez concedido o reajuste, é virtualmente impossível revertê-lo. O próprio ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, admitiu isso após a liminar do STF.
Os servidores reclamam que o governo está utilizando o funcionalismo para fazer um discurso de que vai cortar benefícios dos mais ricos, mas estaria deixando de mexer com outros privilegiados, como os juízes e servidores das carreiras do Poder Judiciário. No Orçamento 2018, estão previstos gastos de R$ 322 bilhões para arcar com os salários e benefícios do funcionalismo público federal, inclusive Judiciário.
Entre os sindicatos, o entendimento é de que os reajustes já haviam sido prometidos e não podem ser alterados, e que há inconstitucionalidades na alteração da alíquota previdenciária.
Judicialização
Na remota hipótese de que o governo reverta a liminar, ainda terá muitas batalhas pela frente. Além da ação interposta pelo PSOL, aceita quase integralmente por Lewandowski, pelo menos outras sete ações questionam a validade da MP. Os autores são entidades que representam servidores do Ministério Público, magistrados e professores de instituições federais.
“Vamos lutar bastante para que isso não se implemente. O presidente da comissão se comprometeu a fazer audiências públicas para pelo menos escutar os servidores e as inconstitucionalidades desse projeto, que é um absurdo. Um projeto em que existe o acordo assinado e a previsão orçamentária”, disse Flávio Werneck, presidente do sindicato dos Policiais Federal do Distrito Federal (Sindopol-DF) e vice-presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB). “O governo tem consciência de que mandou uma MP inconstitucional”, disse Werneck.
Partidos de oposição também prometem obstruir e dificultar a votação da MP no Congresso. A Rede é um dos que promete combatê-la. “O compromisso (de reajuste dos salários) foi firmado anteriormente com as classes e deve ser honrado”, diz o partido, em nota.
Essa também é a visão do presidente da comissão mista na qual a MP será analisada, o deputado Rogério Rosso (PSD-DF), escolhido no dia 6 de dezembro para liderar os trabalhos. As primeiras declarações do deputado, após ser escolhido como presidente da comissão especial, mostram que ele pode dificultar a vida do governo. Rosso afirmou que vai “abrir o debate” sobre o tema, permitindo que os servidores sejam ouvidos, e que não é correto que o governo “demonize” o servidor público.
Ele também afirmou que a postergação dos reajustes deve ser revista, pois muitos servidores já comprometeram seu orçamento doméstico com base na previsão dos reajustes. Ele ainda afirmou que a mudança na alíquota de contribuição previdenciária para os servidores, de 11% para 14%, não deveria ser feita por meio dessa MP “Isso aí eu acho que podia ficar lá com a discussão da reforma da Previdência”, afirmou.
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