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Bolsonaro com seu ministro da Economia, Paulo Guedes: promessa de não aumentar impostos. | Valter Campanato/Agência Brasil
Bolsonaro com seu ministro da Economia, Paulo Guedes: promessa de não aumentar impostos.| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Uma das promessas de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PSL) era a de que o Brasil passaria por uma redução de impostos. O plano econômico, capitaneado pelo superministro Paulo Guedes, sempre mencionou a simplificação do sistema tributário e a redução da carga total. Por isso, causou espanto o anúncio do próprio presidente de que o governo começaria a gestão elevando a alíquota de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras). A declaração, posteriormente, foi classificada como um “equívoco” de Bolsonaro, mas as batidas de cabeça entre integrantes das equipes econômica e política da gestão ficaram evidentes. Mas, se quisesse, em quais impostos, taxas e contribuições o governo poderia mexer sem depender do Congresso?

A elevação de impostos é uma saída rápida para o governo sanear alguns problemas de caixa. Na atual conjuntura da crise fiscal enfrentada pelo Brasil, qualquer dinheiro a mais é bem-vindo. No caso do aumento do IOF, Bolsonaro mencionou que haveria uma elevação da alíquota para crédito pessoal. Esse aumento poderia servir como compensação para a perda de arrecadação que o governo terá após o presidente sancionar a prorrogação de benefícios fiscais para empresas instaladas no Norte e Nordeste, instaladas nas áreas da Sudam e Sudene.

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O IOF é um dos quatro impostos que podem ser aumentados ou diminuídos por decreto presidencial, sem depender da aprovação dos deputados e senadores. Além dele, também se enquadram na categoria o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), o Imposto de Importação e o Imposto de Exportação. Outra possibilidade para o governo é alterar a Cide Combustíveis – uma contribuição que incide sobre o preço de combustíveis e que assegura um montante mínimo para investimentos em infraestrutura de transportes e projetos relacionados à indústria de petróleo e gás, por exemplo.

Por que pode?

O tributarista Geraldo Mascarenhas L.C. Diniz, sócio do Chenut Oliveira Santiago Advogados e ex-conselheiro do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), explica que que esse tipo de imposto é classificado como extrafiscal, porque não tem um propósito exclusivamente arrecadatório, mas também tem função de regulação de alguns setores. “Esses são os tributos notadamente extrafiscais, que podem ser alterados por decreto. Não precisa de medida provisória, nem nada, para aumentar ou diminuir a alíquota ou mudar a base de cálculo”, explica.

Isso acontece com amparo da Constituição, como lembra o tributarista Igor Mauler, sócio fundador do Mauler Advogados. “Existe a lei e a Constituição autoriza que essa lei estabeleça um piso e um teto [para o imposto]. E, dentro disso, o governo pode manipular a alíquota para mais e para menos”, diz.

O IOF, mencionado por Bolsonaro, é o imposto mais flexível para mudanças na alíquota, na opinião de Ana Claudia Utumi, advogada tributária da Utumi Advogados. Ela explica que a flexibilidade é maior porque, na verdade, existem “quatro” IOFs. Esse tipo de imposto pode incidir em operações de crédito (que incluem o crédito pessoal, mencionado por Bolsonaro), câmbio, juros e títulos e valores imobiliários.

Cada um desses IOFs possui uma alíquota própria. Ana Claudia lembra que hoje a alíquota mais alta é para operações de câmbio: 6,38% sobre operações que você paga quando usa o cartão de crédito para compras no exterior, por exemplo. Mas a alíquota pode ser de até 25% e é o presidente quem estabelece o percentual. No caso do crédito, que foi a indicação de Bolsonaro para alteração, o valor mais elevado de IOF é para o crédito pessoal, que está em 3,38%. Por decreto, ele poderia elevar o tributo para o limite legal de 1,5% ao dia.

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“Esses tributos são muitos flexíveis. Os IOFs têm mais flexibilidade para meses. Impostos de exportação e importação são mudados para fins regulatórios, para regular a entrada e saída de produtos do Brasil, e dificilmente seriam mexidos agora”, observa Ana Claudia. Sobre o IPI, a advogada lembra o período da grave crise econômica global, de 2008, quando o Brasil optou por zerar o imposto dos carros e da linha branca. “A alteração do IPI não é tanto por questões arrecadatórias. Ora é alterado por isso, ora por incentivo ou desincentivo de produção”, analisa.

E o PIS/Cofins?

Quem não lembra quando o então presidente Michel Temer (MDB), em 2017, subiu as alíquotas do PIS/Cofins sobre gasolina, diesel e etanol? Na época, a expectativa do governo era de arrecadar mais de R$ 15 bilhões naquele ano – o aumento nas refinarias chegou a R$ 0,41 no litro da gasolina. A medida foi tomada porque o governo precisava de mais dinheiro e avaliou que essa seria a forma mais rápida para obter essa compensação. O decreto de Temer deu origem a uma disputa judicial: uma liminar chegou a suspender a elevação da alíquota, mas o governo conseguiu derrubá-la e manter o aumento.

No entendimento dos tributaristas Geraldo Mascarenhas L.C. Diniz e Igor Mauler, o PIS/COfins não poderia ser manejado dessa forma e essa discussão está no Supremo Tribunal Federal (STF). Além de incidir sobre combustíveis, o PIS/Cofins também pode ser cobrado sobre receitas financeiras. Nesse caso, também há questionamento de empresas sobre alterações de alíquota.

Mauler explica que a lei que instituiu os tributos diz que o presidente pode manejar as alíquotas como quiser. No entanto, não há nenhuma previsão expressa na Constituição permitindo isso. “Se o presidente quiser fazer, ele tem autorização na lei, embora não tenha na Constituição. E isso vai gerar toda uma guerra judicial, porque a competência para legislar sobre tributos é do Congresso”, explica. Ou seja: o presidente até pode mexer nessas alíquotas, mas não é líquido e certo que ele poderia fazer isso.

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Mudança de impostos ocorre em todos os governos

Mexer nos impostos não é uma exclusividade do governo de Bolsonaro. Vários outros presidentes já usaram o mesmo expediente em diferentes ocasiões. “Todos os governos têm problema de arrecadação. Quando fazem uma desoneração tentam compensar do outro lado, infelizmente aumentando mais até do que a própria desoneração. Não é uma novidade, porque em todos os governos isso acontece”, observa o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), João Elói Olenike.

Ele lembra que Fernando Henrique Cardoso (PSDB) quis elevar a alíquota máxima de Imposto de Renda Pessoa Física de 27,5% para 35% – a proposta foi para o Congresso, mas acabou rejeitada e a alíquota permanece a mesma até hoje.

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contou com o bom momento da economia a seu favor. Mas, na época, estava em vigência a CPMF, o popular “imposto do cheque”. “Lula manteve ou tentou manter a CPMF, sobre movimentação financeira, que dava uma arrecadação razoável ao governo. Ela só foi derrubada mesmo em dezembro de 2007, por votação no Congresso”, diz Olenike.

No segundo governo de Dilma Rousseff (PT), antes de ela sair após o impeachment, já havia deixado dez canetadas mudando taxas: ela elevou IOF de pessoas físicas, Cide combustível, mudou a tributação de IPI para vinhos e reonerou parte da folha de pagamento que seu próprio governo havia desonerado, para ficar em alguns exemplos. Quando assumiu, Michel Temer (MDB) também mudou a alíquota do IOF – mas, nesse caso, quem envia dinheiro para o exterior para contas de mesma titularidade.

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