Na próxima segunda-feira (18), o chanceler Ernesto Araújo participará do painel “Bolsonaro e Trump: novo começo das relações Brasil e Estados Unidos”, durante a viagem do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e uma comitiva de seis ministros a Washington. Para marcar essa mudança na relação entre os países, diplomatas brasileiros e americanos se apressam em aprontar o pacote de bondades mais robusto possível.
Entre assinaturas de acordos e declarações, a intenção dos americanos é declarar o Brasil “Aliado Importante Extra-OTAN” – “Major Non-NATO Ally” (MNNA, na sigla em inglês). O governo brasileiro ainda avalia essa possibilidade.
A Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) reúne atualmente 29 países em um tratado de cooperação e defesa mútua e é o mecanismo militar mais importante para a segurança ocidental desde sua fundação, em 1949, no início da Guerra Fria.
LEIA TAMBÉM: STF decide que Justiça Eleitoral pode julgar crime comum associado a caixa 2
A OTAN tem uma série de parcerias com países de fora da América do Norte e da Europa, mas o status de MNNA é um reconhecimento previsto pela legislação dos Estados Unidos, que facilita a cooperação dos americanos com nações que obtêm acesso a ele. O status de MNNA é uma designação concedida pelos Estados Unidos a países considerados parceiros estratégicos, mas que não integram o Tratado do Atlântico Norte, e não envolve qualquer obrigação em relação à OTAN ou vínculo com a aliança.
O governo brasileiro considera a designação positiva, uma vez que os americanos não pediram nenhuma medida em troca desse reconhecimento – nos dias finais que antecedem a viagem, o Ministério da Defesa avalia a legislação americana para dar o aval à declaração.
A cooperação em defesa e segurança com os Estados Unidos é um dos três tópicos prioritários do Itamaraty para a relação entre os dois países, ao lado de defesa da promoção da democracia, da liberdade e da soberania e de integração econômica. O Itamaraty sonda há mais de um mês a possibilidade de ganhar o “selo de qualidade” do governo americano para começar conversas sobre a aproximação com a própria OTAN.
LEIA TAMBÉM: Governo estuda dobrar ‘bônus’ e vai manter aposentadoria integral de militares
Na área de segurança e defesa, o ministério quer sondar ainda as possibilidades de o Brasil integrar a coalizão contra o Estado Islâmico, que atua na Síria, e de a Força Aérea Brasileira juntar-se à Força-Tarefa Conjunta Interagentes (JIATF) para combate ao narcotráfico. O governo deseja também a maior troca de informação na área de não proliferação nuclear, incluindo em relação à Coreia do Norte; a coordenação de posições no Oriente Médio; e a cooperação em temas de cibersegurança e de tecnologias não tripuladas.
Quais os efeitos de o Brasil ser reconhecido como MNNA
Se o governo brasileiro concordar, o presidente americano Donald Trump deve anunciar a intenção de declarar o Brasil MNNA. O governo dos EUA precisaria, então, apenas notificar o Congresso americano e, em trinta dias, a medida teria efeito. Assim como outras medidas politicamente mais delicadas, como o apoio da candidatura do Brasil à Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), pode ser que os países cheguem a uma decisão conjunta somente durante a visita, que ocorre nos próximos dias 17 e 19 de março. A OCDE é o clube das economias mais desenvolvidas do mundo e que vem se expandindo para incluir países da Ásia e da América Latina desde os anos 1990.
Se o Brasil for reconhecido como MNNA, poderá receber dos Estados Unidos cooperação nas áreas de pesquisa, desenvolvimento e treinamento. O status permitiria ao país firmar contratos com o Departamento de Defesa americano para manutenção e reparo de equipamentos fora dos Estados Unidos, desenvolver projetos conjuntos contra o terrorismo e participar de projetos conjuntos de cooperação em pesquisa e desenvolvimento.
O status permitirá ainda ao Brasil receber “artigos de defesa em excesso”, ou seja, aqueles que estão sobrando ao governo americano; comprar munições de urânio empobrecido; ter acesso a financiamento preferencial de alguns equipamentos de Defesa; e obter licenças especiais de exportação de satélites espaciais e tecnologias, componentes e sistemas da área. A FAB tem interesse na cooperação aeroespacial, já que o programa espacial brasileiro está orientado a produzir e lançar microssatélites, visto como o mercado mais promissor do ramo para as próximas décadas.
LEIA TAMBÉM: Itamaraty quer que viagem de Bolsonaro ao Chile seja marco da nova política externa
A categoria de MNNA foi criada pela legislação americana em 1989, ao final da Guerra Fria, para facilitar a cooperação com países que não sejam membros da OTAN. Austrália, Egito, Israel, Japão e Coreia do Sul tornaram-se MNNA nesse mesmo ano.
No governo Bill Clinton, foi a vez de Jordânia, Nova Zelândia e Argentina, então governada por Carlos Menem, que buscou um alinhamento profundo com os Estados Unidos. O presidente George W. Bush deu o status a Barein, Filipinas, Taiwan, Tailândia, Kuwait, Marrocos e Paquistão – país que pode perder o status por força de uma lei que tramita no Congresso americano.
Já durante o governo Barack Obama, foram reconhecidos Afeganistão e Tunísia. Em 2014, por decisão do Congresso, Israel subiu um degrau acima do status de MNNA na relação com os Estados Unidos, sendo declarado “importante parceiro estratégico” do país e tendo acesso ainda mais facilitado à cooperação e investimentos em defesa, pesquisa e desenvolvimento.
Juntamente aos Estados Unidos e ao Chile, Israel é apontado pelo chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, como central para a nova política externa brasileira, que deseja romper com o ciclo desenvolvimentista e firmar um posicionamento claro em defesa do ocidente liberal-conservador. A aproximação com esses parceiros é vista como a linha mestra da gestão de Araújo à frente do Itamaraty.
O que é a OTAN e quais são seus parceiros
Prestes a completar 70 anos em abril, a OTAN é uma aliança militar intergovernamental que hoje conta com 29 membros. Surgida em 1949, seus membros fundadores são Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Bélgica, França, Dinamarca, Islândia, Itália, Luxemburgo, Holanda, Noruega e Portugal. Em 1952, ingressaram Turquia e Grécia e, em 1955, a Alemanha Ocidental. Isso levou à formação do Pacto de Varsóvia, capitaneado pela antiga União Soviética e principal bloco militar opositor à OTAN.
LEIA TAMBÉM: Militares dão aval a Bolsonaro para fechar acordo com EUA sobre base de foguetes
Entre os objetivos iniciais da aliança estava a dissuasão de ameaças soviéticas ao ocidente europeu, evitar o ressurgimento do nacionalismo militar na Europa e fomentar a integração do continente, que deu seus primeiros passos em 1949, com a criação do Conselho da Europa e, em 1952, com a fundação da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA), precursora da União Europeia.
Pelo artigo 5º do tratado que rege a aliança, todos os membros têm o dever de defender um membro que seja atacado. Em 1982, a Espanha ingressou no acordo e, a partir de 1999, países do leste europeu e ex-repúblicas soviéticas passaram a ingressar nas fileiras da aliança, o que levou ao aumento das tensões com a Rússia depois da ascensão de Vladimir Putin ao poder, em 2000. Até o presente, o artigo 5º foi invocado uma única vez, após os ataques de 11 de setembro de 2001 aos Estados Unidos.
A OTAN mantém ainda acordos com “parceiros globais”, países com cooperação em segurança e defesa mais estreita com a aliança. Desde 2017, a Colômbia é o único país da América Latina a ter o status de parceiro global. Desde 2013, o Ministério da Defesa da Colômbia participa de um programa da OTAN que auxilia na transparência das instituições de defesa. Militares colombianos fizeram cursos em escolas da aliança e, em 2015, o país participou da operação “Ocean Shield” para combater a pirataria no chifre da África.
Deixe sua opinião