O presidente do Congresso Nacional, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), alterou o relatório da Medida Provisória 766 aprovado em comissão especial e derrubou os “jabutis”, as emendas que não tinham pertinência com o texto principal. A decisão acaba com uma disputa de dois grupos de empresas de refrigerantes que estavam fazendo um corpo-a-corpo com parlamentares para alterar a tributação do produto na redação do “Novo Refis”.
A discussão sobre a cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para empresas de refrigerantes se transformou numa “guerra” entre duas associações que disputavam uma tributação mais favorável no setor.
De um lado estava a Afrebras (Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil), que reúne companhias de menor porte. O grupo tinha conseguido incluir no texto da MP uma redução do crédito do imposto sobre o concentrado da bebida produzido na Zona Franca de Manaus. A medida tentava reduzir as vantagens tributárias de empresas instaladas na região.
Do outro lado da disputa, a Abir (Associação Brasileira de Refrigerantes e Bebidas Não Alcoólicas), que é formada por empresas de pequeno a grande porte como a Ambev e a Coca-Cola, era contra a proposta de mudança no IPI, pois representa indústrias que se beneficiam dos incentivos da Zona Franca de Manaus. De acordo com representantes da entidade, os fabricantes deixariam a região se os incentivos fossem reduzidos.
Jabuti não
A MP 766 trata do Programa de Regularização Tributária, o Novo Refis. O texto que tinha sido aprovado em comissão especial propunha a queda da alíquota do crédito do tributo de 20% para 4%. A mudança na norma foi considerada um jabuti. Ela foi sugerida por meio de uma emenda apresentada pelo deputado paranaense Alfredo Kaefer (PSL).
Pela regra atual, as empresas da região amazônica recebem créditos de 20% do IPI sobre os extratos e concentrados produzidos ali. Esses créditos podem ser utilizados para abater impostos de outros produtos fabricados fora da região, como cervejas, por exemplo. Além de reduzir os créditos a 4%, a emenda vedava a utilização para outros produtos, ou seja, diminuia a tributação vantajosa de quem produz na Amazônia. Com a decisão do presidente do Congresso, tudo se mantém como já existia.
Para o presidente da Afrebras, Fernando Rodrigues de Barros, grandes empresas do setor desvirtuam as vantagens tributárias da região porque transferem esses créditos para outros produtos da empresa. Ele defende que como grandes empresas conseguiriam baratear a produção, elas pagariam proporcionalmente menos impostos que as fábricas regionais. Ele também destaca que essa tributação, em sua avaliação desfavorável ao grupo que representa, é responsável pela falência de pequenas indústrias do ramo.
“O poder econômico continua prevalecendo às demandas da sociedade. Não é compreensível que o governo mantenha créditos bilionários de um pequeno grupo de empresas. Uma empresa pequena, enquadrada no Simples Nacional, continua recolhendo IPI normalmente e as grandes produtoras de refrigerantes não recolhem centavo do imposto”, opinou o presidente da Afrebras sobre a decisão de Eunício.
“Risco ao desenvolvimento regional”
Para Alexandre Jobim, presidente da Abir, as alterações que tinham sido feitas na MP representavam um “grave risco à estratégia de desenvolvimento regional”. Ele explicou que atual modelo viabiliza o desenvolvimento econômico da região por se basear em políticas tributárias diferenciadas às empresas que investem no local que sejam pequenas, médias ou grandes. Ele afirmou ainda que 31 empresas produzem concentrado de refrigerantes na região e abastecem mais de 90% do mercado de bebidas não alcoólicas.
“O acolhimento de emendas que reduzem os incentivos nada tem a ver com o tema original dessa MP conhecida como Novo Refis. Pendurar temas alheios em medidas provisórias que, por natureza, devem ser específicas, é conduta considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Além disso, nesse caso, representa gravíssimo ataque ao modelo econômico da Zona Franca de Manaus”, defendeu Jobim.
A Afrebras afirma que essa é uma disputa em grandes e pequenas fábricas, mas a Abir nega que os grupos sejam divididos desta forma, pois têm associados de grande, médio e pequeno porte.
Representantes das duas associações estavam visitando parlamentares, lideranças de partido e de governo para tentar persuadir os parlamentares sobre sua pauta. Não é a primeira vez que essa disputa ocupa os corredores do Congresso. Emendas semelhantes já foram apresentadas e derrubadas em 2015 no projeto de lei que tratava da desoneração da folha de pagamento e nas MPS 685 e 690.
A Gazeta do Povo procurou a Receita Federal para identificar o impacto na arrecadação caso o imposto fosse alterado, mas a instituição respondeu que não comenta esse tipo de cálculo por setor.