Três dias após o rompimento da barragem da Vale, a família do trabalhador rural Paulo Giovani dos Santos escava por conta própria um local na zona rural de Brumadinho (MF) atrás do corpo de uma das vítimas do desastre de sexta-feira (28).
O sítio em que Santos morava, localizado a cerca de 3 km do centro urbano do Córrego do Feijão, um bairro rural de Brumadinho (MG), foi devastado pela lama. Imagens antigas mostram um recanto intocado da natureza, com piscina, uma ampla casa e uma mata tão espessa que não dava para ver o pátio de operações da mina da Vale do outro lado, a cerca de um quilômetro. Santos criava porcos e cultivava uma horta.
Depois do próprio pátio de máquinas da mina, a casa de Santos foi a primeira construção a ser atingida pela lama na sexta-feira (25). Hoje o local se transformou num monte de terra, argila e rejeitos da mina da Vale. A mata foi devastada e no seu lugar surgiu um pequeno vale de lama.
Familiares e socorristas voluntários começaram as buscas
Familiares e amigos de Santos chegaram ao local na própria noite da sexta-feira. Sua cunhada, Sônia Monteiro, disse que começaram a cavar o monte por conta própria, com a ajuda de um grupo de socorristas voluntários. Encontraram roupas e pertences de Santos e, soterrado, um dos porcos da criação. No sábado (26), segundo a família, mais de 50 pessoas apareceram para continuar cavando com enxadas e pás.
No domingo (27), Sônia e seu marido Lindomar foram impedidos de retornar ao sítio num bloqueio de trânsito da Polícia Militar. Pela manhã do domingo, a Vale disparou uma sirene que alertava sobre o risco de rompimento de outra barragem e os moradores de lugares de risco foram orientados a deixar a região -situação que foi contornada ao final do dia.
Nesta segunda-feira (28), Sônia, Lindomar e outros parentes foram ao centro comunitário de Córrego para pedir uma máquina retroescavadeira e continuarem a procura pelo corpo. No final da manhã, o socorro veio de uma mineradora, mas não da Vale, e sim da vizinha MIB, que mandou uma retroescavadeira ao local.
“Meu cunhado está aqui debaixo. O pai dele tem 83 anos, está aqui, desolado. Então não é justo com a sociedade, conosco, com ninguém, não. Acho que é falta de consideração com o ser humano. Nós somos seres humanos, nós somos gente!”, disse Sônia a um grupo de jornalistas que ela levou ao local para mostrar a falta de apoio na escavação. As buscas são acompanhadas pelo pai de Santos.
“A Vale tem inúmeras máquinas e inúmeras empresas que prestam serviço para a Vale e podem vir aqui retirar e dar assistência para a gente. Aqui nós estamos desesperados, precisamos de socorro, socorro”, disse Sônia.
“Disseram que tinha uma máquina disponível para a gente, hoje a gente não consegue ter mais a máquina. É muito barro misturado com argila, com tudo. Então com a mão a gente não consegue. Na enxada, estou com meus braços todos doloridos, feridos, tá tudo dolorido”, disse a cunhada de Santos.
Outro parente que auxilia nas buscas, o estudante de engenharia Ivelton Rodrigues (30) disse que, quando chegou ao sítio na sexta-feira encontrou “um cenário de guerra, uma cena de filme”. “Para ser sincero, eu tinha esperança de chegar e encontrá-lo com vida. Mas na hora que você chega e depara com isso, aí...”, disse Rodrigues.
Ele afirmou que a angústia da família para localizar o corpo é tentativa de “querer virar a página, dar um ponto nessa página e tentar reconstruir”. “Deixar o sentimento bonito. Ele [Santos] era uma pessoa alegre, eu não conhecia ninguém que fala mal dele. Tanto que na sexta-feira havia mais de 50 pessoas voluntárias para ajudar. Nós estávamos cavoucando com as mãos até arrumar a máquina para ajudar”, disse Rodrigues.
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