Em mais um capítulo da rivalidade entre a equipe da Lava Jato no Rio de Janeiro e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, o Ministério Público Federal (MPF) pediu que o magistrado seja declarado impedido de atuar nos casos envolvendo o ex-presidente da Fecomércio no Rio, Orlando Diniz. O executivo foi um dos 20 presos por ordem do juiz federal Marcelo Bretas, que conduz a Lava Jato fluminense, que foram soltos por ordem de Gilmar somente desde maio deste ano – um deles foi solto duas vezes.
Bretas não faz questão de esconder a contrariedade com as decisões de Gilmar. Em um ofício anexado no processo do habeas corpus de Diniz, o juiz da Lava Jato afirma que a corrupção não pode ser vista como um “crime menor”.
“Também foi defendido que casos de corrupção e delitos relacionados não podem ser tratados como crimes menores, pois a gravidade de ilícitos penais não deve ser medida apenas sob o enfoque da violência física imediata”, diz Bretas no documento. Orlando Diniz presidiu a Fecomércio do Rio de Janeiro por cerca de 20 anos, até que foi preso na operação Jabuti, desdobramento da Lava Jato, em fevereiro.
A força-tarefa da Lava Jato no MPF comprou a briga e pediu a suspeição ou o impedimento de Gilmar para julgar casos relacionados ao empresário. Os procuradores alegam que a quebra de sigilo fiscal da Fecomércio revelou um pagamento de R$ 50 mil, feito em 2016, em benefício do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), que Gilmar como um dos sócios-fundadores.
Segundo o MPF, o IDP teve uma série de eventos apoiados por patrocínio da Federação presidida por Diniz. Dos eventos do instituto de 2015 até 2017, pelo menos três foram patrocinados pela Fecomércio-RJ: um no Rio de Janeiro e dois em Lisboa.
Além dos presos no âmbito da Lava Jato do Rio de Janeiro, o ministro do STF também mandou soltar Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, tido como operador do PSDB de São Paulo. Souza foi alvo de duas prisões no âmbito da Lava Jato paulista. Foi preso pela primeira vez em 6 de abril, mas liberado cerca de um mês depois, por ordem de Gilmar. No dia 30 de maio, foi preso novamente na Lava Jato, mas solto horas depois – mais uma vez com a ajuda de Gilmar.
Gilmar solta, Bretas prende
Essa não é a primeira vez que a Lava Jato no Rio tenta manter Gilmar longe do julgamento dos casos. A força-tarefa já havia pedido suspeição de Gilmar nos casos envolvendo o empresário do setor de transporte coletivo do Rio, Jacob Barata Filho. O empresário ganhou a liberdade por ordem de Gilmar, mas acabou preso novamente por ordem de Bretas.
Na ocasião da segunda prisão de Barata, Gilmar ironizou o magistrado da Lava Jato. O ministro disse que “não era o rabo que abana o cachorro, mas o cachorro que abana o rabo”, em alusão a Bretas estar em uma instância jurídica inferior a do STF.
Bretas também enfrentou o ministro ao mandar prender, pela segunda vez, ex-presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do Estado do Rio de Janeiro, Rogério Onofre de Oliveira, preso na Operação Ponto Final. Ele havia sido beneficiado por um habeas corpus concedido por Gilmar.
Os investigados soltos por Gilmar desde maio
Na lista de agraciados por Gilmar estão presos da operação Pão Nosso, que apurava desvios em contratos da Secretaria de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro; da operação Rizoma, que investigava fraudes em fundos de pensão; e da operação Câmbio, Desligo, que desvendou a movimentação de grandes doleiros.
Confira a lista:
Hudson Braga – ex-secretário de Obras do ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, condenado por Bretas a 27 anos de prisão;
Carlos Miranda – principal operador de Sergio Cabral, que firmou acordo de delação premiada. Apesar do HC, continua preso por ter outro mandado de prisão expedido pelo juiz Sergio Moro;
Milton Lyra – lobista apontado como operador do PMDB, preso na operação Rizoma, que investigava desvios no Postalis;
Marcelo Sereno – ex-secretário nacional do PT, preso na Operação Rizoma;
Adeilson Ribeiro Telles – do Postalis (fundo de pensão dos Correios), preso na Operação Rizoma;
Carlos Alberto Valadares Pereira – do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), preso na Operação Rizoma;
Ricardo Siqueira Rodrigues – operador financeiro, preso na Operação Rizoma;
Arthur Pinheiro Machado – operador, preso na Operação Rizoma, foi solto duas vezes por ordem de Gilmar Mendes
Sandro Alex Lahmann – empresário, preso na Operação Pão Nosso;
Marcelo Luiz Santos Martins – delegado, preso na Operação Pão Nosso;
Carlos Mateus Martins – empresário, pai do delegado Marcelo Luiz Santos Martins, preso na Operação Pão Nosso;
Cezar Rubens Monteiro de Carvalho – coronel da PM e ex-secretário estadual de Administração Penitenciária, preso na Operação Pai Nosso;
Marcos Vinicius da Silva Lips – advogado e ex-subsecretário de Tratamento Penitenciário da Seap, preso na Operação Pai Nosso;
Sergio Roberto Pinto da Silva – doleiro, preso na Operação Pai Nosso;
Antônio Albernaz Cordeiro – engenheiro, preso na Operação Câmbio, Desligo;
Rony Hamoui – doleiro, preso na Operação Câmbio, Desligo;
Paulo Sergio Vaz Arruda – doleiro, preso na Operação Câmbio, Desligo;
Athos Albernaz Cordeiro – doleiro, preso na Operação Câmbio, Desligo;
Oswaldo Prado Sanches – doleiro, preso na Operação Câmbio, Desligo;
Orlando Diniz – ex-presidente da Fecomércio do Rio de Janeiro, acusado de desviar R$ 10 milhões dos cofres públicos;
Paulo Vieira de Souza (Paulo Preto) – operador do PSDB, foi preso no âmbito da Lava Jato de São Paulo e solto duas vezes por ordem de Gilmar Mendes